Circe, a feiticeira de voz rouca, acrescentou:
- Eu já encantei alguns heróis e sei que eles não são indestrutíveis. Héracles, apesar de seus laços com Zeus, pode ser vencido, pois não é um imortal. Unidos, poderemos derrota-lo.
- Certamente! – exclamou a Medusa. – Circe e Medeia praticam, como ninguém, as artes da magia, e podem atraí-lo para uma emboscada. Quando o colosso estiver encurralado, cada um de nós dará a sua contribuição, pois que conhecemos todas as sendas do Mal. Minhas irmãs e eu somos a própria perversão. Équidna é o monstro gerador de monstros, não há outro igual a ela. Cérbero foi escolhido para ser o guardião da Terra dos Mortos por causa de sua fúria desmesurada. As harpias são as criadoras da fome e poderão deixa-lo à míngua, e as éguas da Trácia se deliciarão com os grossos e suculentos músculos do heroico Héracles. Quando tivermos acabado com ele, os grifos carregarão os seus restos e os lançarão nas bocas de fogo dos montes furiosos.
O plano era diabolicamente lindo, e todos gargalharam e gargalharam. Nunca a maldade lhes parecera tão boa.
- Morte a Héracles!
O grito uníssono que saiu daquelas gargantas monstruosas ecoou por todos os vales da Tessália, e o cheiro de ódio que se desprendeu daqueles corpos empesteou a clareira como o odor de mil carcaças putrefatas. Satisfeitos com o planejado, os monstros se prepararam para partir.
Agenor e Laio estavam lívidos de medo. Nunca tinham visto tanto rancor. Permaneceram escondidos até que todas as abominações debandassem e, depois, correram de volta para casa, convencidos de que o Inferno tinha subido à Terra.
- Filho – disse Hípias -, os monstros que nós devemos temer são outros! Não se preocupe com as aberrações que aqui estiveram! Vá cuidar de suas obrigações, que são muitas! Somos simples seres humanos, e viver requer muita dedicação.
LONGE DALI, o alvo de tanta indignação rumava no seu passo cadenciado, de som cavo atordoante. Ia ao encontro de outra tarefa para conseguir mais m pedaço de perdão. Sua aljava estava cheia de setas envenenadas com o sangue da Hidra, mas Héracles sabia que não as poderia usar nessa terceira caçada. Sua incumbência era capturar um animal sagrado, uma corça de chifres dourados que pertencia a Artemisa. Não podia matá-la, nem mesmo feri-la: sua tarefa era capturá-la viva.
"Que os monstros descansassem por uns tempos", pensou o filho de Zeus.

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Entre Deuses e Monstros
AléatoireEste livro retoma o velho tema, sempre novo, costurando, com uma narrativa aparentemente casual e despretensiosa, alguns dos mais belos mitos gregos.