Theater

538 68 9
                                    


Eu realmente não sei como, mas não me interessava por teatro. Digo, eu amo peças, concertos, musicais principalmente, mas atuar, para mim, era o fim do mundo. E como eu não conseguia nem subir no palco sem suar frio, às vezes era entediante e até frustrante passar horas vendo as pessoas conhecidas por mim interpretando personagens incríveis tão facilmente.

Nas peças que fazíamos na escola, eu via as pessoas atuando como outras completamente diferentes e isso me soava como algo muito traiçoeiro, e passei a não acreditar em ninguém do clube de teatro. Sim, eu era meio paranóico, mas tudo bem, consegui superar isso. Depois de alguns idiotas do clube em questão terem caçoado de mim pela crise de ansiedade antes do espetáculo na sexta série, resolvi ficar bem longe dessa área específica e de todos os envolvidos, mas sem conseguir odiar de verdade o teatro.

Eu odiava as pessoas que faziam teatro.

A questão é que tivemos que fazer uma outra peça para um espetáculo aberto aos pais e alunos no fim do primeiro semestre daquele ano. E quando começaram os testes para personagens, descobri que Hansol fazia teatro na escola onde estudava antes e ficou muito empolgado.

Fiquei com paranóias, mas naquele momento eu já o conhecia há meses e meio que me sentia como o melhor amigo dele. É estranho, não é? Estranho a maneira como algumas pessoas que você conhece há anos não significa nada, mas uma que você conhece há meses se torna tão importante e melhora seus dias de uma maneira totalmente diferente.

Eu ia todos os dias assistir ele ensaiar, porque obviamente ele passou no teste. E não é que eles eram bons? Não somente Hansol, mas todos no clube. Eu me sentia numa peça pra valer quando haviam cenas com a garota do segundo ano, Lia. Ela faz teatro desde que entrou na escola e faz jus aos anos que passou no palco.

Eu via de perto a correria, a animação e empolgação com a apresentação, nunca vi as pessoas da minha escola tão unidas para algo. Eu via Mark e Hansol sempre sorrindo e falando sobre o teatro e eles sempre me perturbavam para participar. Foram no total 9 dias de resistência, mas depois de tanta insistência e mimos que eu estava ganhando deles para conseguirem o que queriam, eu me entreguei e fugi totalmente da minha decisão de nunca mais participar do teatro e me ofereci para ajudar.

Cuidei do cenário com os responsáveis e eu ficava com o roteiro na mão, ajudando os atores a decorar suas falas. Foi até empolgante. Todos ali ajudando uns aos outros, sem maldade quando um errava, era todos reunidos por um mesmo objetivo e notei como aquilo realmente funcionava quando tinha maturidade e interesse e não eram crianças de doze anos sendo obrigadas pelos pais a participar.

Depois desse tempo com o clube, passei a entender porque os atores amam essa vida. Apesar de viver sempre sobrecarregado e ansioso, é maravilhoso os ensaios, a dedicação, ver como aquilo progride, ver seu trabalho surgindo efeito e atingindo outras pessoas.

Foram dois meses de ensaio e correria para as provas, entrega de trabalhos e a peça, mas valeu a pena cada gota de suor e de lágrima derramada. E foram bastante lágrimas.

Lembro que dois dias antes da peça, eu liguei para Hansol como fazíamos nas tardes que chovia, mas dessa vez para ajudá-lo a ensaiar. Na verdade, só pra dar uma força e animá-lo, pois ele já havia decorado suas falas e as dos outros, mas estava transbordando receio e ansiedade.

Nós madrugamos lendo, relendo e atuando na videochamada. Cada vez que a cena do beijo era citada, eu me sentia tenso por ele. No roteiro, Hansol atuava como irmão mais novo do protagonista, mas gostava da mesma moça que ele, e na hora que ia beijá-la, o mais velho entrava em cena e interrompia.

Pensar que cogitaram deixar que o Hansol e Lia se beijassem foi estranho, meio que eu não conseguia visualizar isso. Ela era muito boa, mas sempre ficava meio desconfortável o clima entre os dois, então resolveram ver o que fariam mais próximo da apresentação.

Ou seja, evitaram falar sobre isso até o último momento.

Mesmo chegando na escola no dia seguinte com olheiras profundas e ter dormido em quatro de seis aulas, valeu o esforço.

Antes da apresentação em si, Hansol estava no camarim com seus "tiques" na perna, inquieto. Nunca me senti tão envolvido em alguma coisa como me senti naquele dia. Eu fui até ele, disse mais uma meia dúzia de palavras de motivação e desejei boa sorte. Nos reunimos atrás do palco, fizemos uma roda e gritamos "Fighting!". Eu não estava atuando, mas me senti tão importante quanto eles porque todos eles me envolveram nisso.

No fim, deu tudo certo, a peça foi ótima e, tirando o fato de que uma das garotas tropeçou no cenário na troca de cena, não houve margem de erros e o auditório lotado aplaudiu de pé. Não houve beijo de verdade, só uma insinuação e eu pude ver as orelhas do Chwe vermelhas quando saiu do palco. A primeira coisa que ele fez ao sair, foi olhar pra mim e sorrir de orelha à orelha, entusiasmado, como quem diz: "Consegui!".

Após os agradecimentos, o auditório foi se esvaziando e fomos elogiados pelos professores, diretor e os pais presentes no dia. Nossa escola nunca faz eventos assim, é uma honra ter feito parte desse.

Ainda antes de ir para casa, no fim do dia, quando todo mundo já tinha tirado os trajes e estavam para ir embora, decidiram ir comer fora e fomos todos os 37 envolvidos para uma lanchonete. Ao menos era tarde da noite e ela estava vazia, mas chegamos logo pegando umas seis mesas e quase todas as cadeiras do lugar e juntando tudo no canto pra todo mundo sentar. Foi muito engraçado, senti pena dos funcionários.

E enquanto a mesa estava barulhenta com todo mundo contando como foi difícil ou engraçado, Hansol abaixou um pouco no banco e ficou bem próximo de mim.

ㅡ Obrigado por ter participado, foi muito importante ter você lá. ㅡ Parei para tentar encará-lo e senti minhas bochechas quentes. ㅡ E você fica fofo com pressa, correndo pra lá e pra cá, organizando e ajudando todo mundo. Foi engraçado trabalhar com você.

Nunca pensei que voltaria a participar de qualquer coisa relacionado aquele clube de teatro, mas olha onde me meti por causa daquele garoto?

All the things I would never doOnde histórias criam vida. Descubra agora