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— Os dedos de uma jovem — dizia sua avó sempre que mencionava Dulce Maria Saviñon e seus pecados —, mesmo os de uma americana, não cometeriam tanta desordem se estivessem ocupados com uma agulha.

Pessoalmente, Christopher achava um erro dar a Dulce Saviñon qualquer coisa afiada ou pontiaguda.

Naquela noite, a maioria das convidadas a esnobava e ela parecia querer estar em qualquer outro lugar. Alguns anos antes, ela teria dançado todas as músicas, mostrando um bocado do tornozelo, e pulando pela sala como uma bola de borracha indiana. Agora, no entanto, ela tentava se misturar ao papel de parede. Por quê?

Algumas cadeiras à esquerda, duas matronas de rosto gélido não se esforçavam para esconder o desprezo, enquanto a observavam, abertamente, da cabeça aos pés. Enquanto isso, ela se espremia atrás da palmeira, quase a derrubando. Outra moça se juntou às duas que estavam sentadas e começou a cochichar por trás do leque, mas de um jeito tão óbvio que o único mistério que permanecia era o paradeiro de suas boas maneiras. Um leve rubor rosado subiu pelas bochechas da senhorita Saviñon, embora ela mantivesse um sorriso alegre no rosto e seus olhos tivessem desviado das fofoqueiras, como se não as visse, nem ouvisse. Christopher franziu o rosto.

O jovem Robert Clegg-Forster traçou uma linha reta em direção a ele, atravessando a sala, mas foi freado pela mãe, que subitamente o pegou pela orelha por algum motivo.

Era melhor correr, ou perderia a chance.

Christopher endireitou os ombros e respirou fundo. Era hora de pegar seus diamantes de volta.

E tentar não pensar naquelas pernas malditas.

Contudo, depois de apenas três passos, ele foi interceptado. — Christopher, querido!

Ele mal podia acreditar que Belinda Southwold se atrevera a abordá-lo, porém era ela e, aparentemente, altinha. Ele reconheceu o olhar vidrado e o tom corado.

— Christopher, espero que você não me culpe pelo colar. Juro que o conde atrevidamente o tirou sem que eu notasse. Tentei ver você nesta manhã, mas seu criado imbecil disse que você estava indisposto.

Seu caminho estava obstruído, ele parou e olhou para baixo, para ela. Embora seu primeiro instinto fosse pegar a mulher pelos braços, erguê-la ao lado e ignorá-la, vinte anos de flerte com belas mulheres, encantá-las e cobri-las de charme já estava enraizado como um mágico que tira pombos da cartola. Naquela noite, ele passou novamente pelas ações. Um sorriso lento, uma inclinada na cabeça, uma queda parcial das pálpebras, enquanto lhe dava uma olhada cuidadosa, apreciadora. — Belinda, querida, podemos discutir isso depois? Estou com um pouco de pressa.

— Mas Christopher, querido... — ela pousou a mão em sua manga... , o que pode ser mais importante que eu?

Só havia uma saída. — Receio que vou passar mal. Tomei ponche demais.

Ela recuou na hora. — Ah! — Sucesso! Agora ela não estava mais tentando atocaiá-lo, mas o deixou seguir caminho, com um cutucão do leque em suas costas.

Dulce tinha dez anos quando desenhou um bigode elaborado no rosto adormecido de Christopher Uckermann. Dezessete anos depois, ela sabia que ele ainda se lembrava do incidente, em especial da humilhação de perambular um dia inteiro sem que ninguém mencionasse sua estranha aparência. Um crime desses, para um homem com tamanha vaidade, era imperdoável. Até pior que isso, ela era uma Saviñon. Desde que seu tio mal-afamado uma vez fugiu com a mãe de Christopher, para um caso adúltero que gerou o escândalo do século, os Uckermann não falavam com os Saviñon nem reconheciam sua existência, se fosse possível. E vice-versa. Dessa forma, há dezessete anos, a jovem Dulce, com sua gaiata caneta-tinteiro, tinha aborrecido sua família adotiva tanto quanto a dele.

Por muitas vezes, foi-lhe impelido que ficasse longe de Christopher Uclermann e desconfiava que ele recebera o mesmo alerta em relação a ela. Todos os bons conselhos e possíveis boas intenções agora eram sumariamente descartados. De novo. Eles simplesmente pareciam não conseguir ficar longe um do outro. Ela o observou aproximar-se com o canto dos olhos.

Em pé, ao lado da palmeira no vaso, ela acabara de ter mais uma vez aquela sensação de estar sendo seguida e espionada. Ela concluiu que só podia ser o efeito dos olhos azuis de Uckermann em seus ombros e rapidamente afastou a sensação.

Ele veio abrindo caminho por entre a aglomeração, trombando nela com o ombro, soltou um suspiro cansado e resmungou, sem direção específica. — Você está dançando?

O vinho respingado manchou suas luvas e entranhou até a pele. Ela olhou para cima e imediatamente sentiu um arrepio familiar de irritação. Era realmente odioso que um homem tivesse tanto a seu favor e fosse tudo um desperdício.

Dulce Saviñon, ou Dulce foa — Em sua cabeça, ela ouvia novamente as palavras de deboche como se ele as tivesse acabado de dizer, em voz alta. Até o riso ecoava em sua cabeça, como acontecera, todos aqueles anos atrás.

— Parece que estou dançando? — Ela estrilou.

— Você pretende?

— Não fiz planos de dançar ou não.

Ele sorriu levemente. — Talvez você possa decidir agora.

— Por que você quer saber dos meus planos? — Ela bateu os cílios, fingindo ignorância. — Que interesse pode ter para você?

Ele deixou escapar um suspiro pesado. — Você sabe muito bem, Saviñon, que estou lhe convidando para dançar.

— Com quem?

— Comigo.

— Bem, você poderia ter dito. É bem simples. Mas você sempre tem de complicar as coisas. Em seu jeito inglês entediante e arrogante, suponho que você tenha presumido que eu estivesse esperando, absolutamente desesperada, que você me perguntasse. — Embora ela tivesse nascido na Inglaterra, Dulce considerava isso um acidente. Ela gostava de pensar em si mesma como americana, como sua mãe.

— Não pretendo ficar aqui discutindo com você por mais cinco minutos, Saviñon.

Sem esperar que ela respondesse, Christopher rapidamente tirou o copo vazio de sua mão, deu a um garçom que passava e fez uma rápida reverência, com seu porte altíssimo, para que ela seguisse, juntando-se à fila de casais já reunidos no salão, onde a ausência de móveis facilitava a dança.

— Não posso — ela disse, sentindo calor, ansiosamente observando a segurança de seu copo vazio se afastar.

— Qual é o seu problema? O que você fez agora?

— Não sou eu. É o vestido. — A empregada da irmã tinha se esforçado com o traje, mas alguns instantes atrás uma costura inteira tinha arrebentado, embaixo da manga e na lateral do decote. Isso exigia que Dulce ficasse com o braço firmemente junto ao corpo ou deixaria sua combinação à mostra para o salão inteiro. Além disso, meia hora antes, sem querer, ela tinha sentado em um prato de docinhos que deixaram uma mancha em um lugar bem desagradável. Ela estava fazendo o máximo para esconder, sem se movimentar muito. Suas irmãs tinham desaparecido, abandonando-a assim que chegaram à festa, porém ela estava torcendo para que uma delas a encontrasse para explicar seu apuro e ir embora.

Em vez disso, Christopher apareceu subitamente, depois de todos esses anos, querendo dançar com ela.

Agora, seu olhar intrigado percorria a frente de seu vestido.

Com um gemido baixinho, ela ergueu o braço para mostrar o rasgo. Ele ergueu as sobrancelhas.

— E... — ela virou, mostrando a mancha dos doces que tinha ficado no lindo vestido de musselina branca da irmã.

Christopher analisou seu estado debilitado com muita seriedade.

— Então, está vendo — ela disse —, não posso dançar com você. — Por algum motivo, ela estava perto de cair em prantos. Esse não era seu estilo e ela não tinha desculpas para isso.

MADRUGADAS DE DESEJO - Adaptada | VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora