Capítulo 29

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— Muito bem, senhor. — Grieves sumiu rumo à sua missão, e Christopherficou ali um tempinho, olhando o pessoal maltrapilho que estava no pátio.Ele nunca viajara na carruagem postal na vida, como o criado tinhacomentado. Único herdeiro de um grande negócio de importação eexportação que teve início com seu bisavô, Christopher só conhecera o luxo,desde seus primeiros anos. Por conta da riqueza Uckeramann, ele sempre foitratado com deferência pelos outros e acostumado a obter coisasmateriais quando as quisesse. Só o amor verdadeiro está além de seualcance. Aparentemente, não era um tipo amável. Ele se lembravavagamente de um dia ter tentado abraçar a avó para dar-lhe um beijoquando partia para o colégio interno no fim das férias.


— Pelo amor de Deus, Christopher! — Ela o afastara com suas mãosfrias e ossudas. — Não estamos na casa de ópera.


Então, ele buscou o que precisava nos braços de uma porção de belasmulheres. Era um tipo de afeição vazia. Elas adoravam ser vistas emseus braços, cobertas de presentes.


Gotas gélidas pontilhavam a janela antiga e algumas tochas no pátiojá haviam se apagado, mas nada diminuía a nova determinação que ardiadentro dele. Se alguém levava a vida como em uma ópera, esse alguémera Dulce Saviñon. Ela gostava de drama e travessuras. De provocá-lo, fazê-lo correr atrás dela.


Desta vez, ele lhe pregaria uma peça.


APARENTEMENTE, SÓ HAVIA UM quarto vago na hospedaria. Osenhorio entregou-lhe uma vela acesa em um pequeno porta-velas decobre. — Lá em cima. À direita. É a porta no final do corredor. Voupedir ao rapaz que leve seu baú.


Dulce não tinha grandes esperanças para o quarto, levando-se em contaque era o último disponível. Ela subiu a escada estreita, pingando água dechuva e lama, tão cansada e dolorida por ficar espremida no veículolotado que seus ossos quase não conseguiam sustentá-la de pé. Uma dorlatejante ainda pulsava em sua têmpora, pouco acima dos olhos, e dava aimpressão de que sua cabeça havia batido na estrada tanto quanto oscascos dos cavalos da carruagem. Sua boca estava seca, havia um nó emseu estômago e ela não conseguia se livrar do fedor da carruagem, queficara entranhado em suas narinas. Ele invadira suas vias aéreas e seuspulmões como um mofo invasivo, mas ainda havia mais um dia pelafrente. Era impensável, no entanto tinha de ser enfrentado, pois para elanão havia outro meio de transporte.


Esperando pouco mais que um pequeno armário onde passaria a noite,ela abriu o trinco da porta e descobriu que, em vez disso, para suaagradável surpresa, era um quarto de bom tamanho, forrado de lambri,com uma lareira agradável acesa e cortinas grossas nas janelas quemantinham o vento frio lá fora. Dulce se beliscou, temendo teradormecido no balanço da carruagem e que isso fosse só fruto de suaimaginação.


Não. Era real. Ela sentia o cheiro do carvão na lareira e um aromade dar água na boca, de faisão assado, estragado somente por um bafejode cerveja choca, que brevemente estaria impregnado em tudo que lhepertencia. Um leve ruído de riso reverberou no piso, e quando ela tocoua parede, era sólida, sob as pontas de seus dedos. Tranquila, Dulceobservava o quarto com uma vitalidade renovada, afastando o cansaço.Ao lado da porta havia uma temerosa armadura mantendo guarda,orgulhosamente segurando uma lança medieval. Algo que acrescentava umsenso de grandeza ao local, ela pensou, dando um tapinha amistoso emseu peito oco.


— Fique de olho em mim, sir Lancelot — sussurrou ela. — Nuncase sabe o que posso fazer em seguida.

MADRUGADAS DE DESEJO - Adaptada | VondyOnde histórias criam vida. Descubra agora