Cama de pregos

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É como estar deitado sobre uma cama de pregos. Como aquela famosa música do Bon Jovi. Não consigo relaxar ou encontrar uma posição confortável, tampouco dormir. Por mais que eu feche os olhos e tente esvaziar minha mente, os pensamentos acabam sempre voltando para Amelia e a conversa em seu apartamento, há algumas horas. Irremediavelmente, suas palavras martelam na minha cabeça e me assombram. Amizade. Ela disse que agora só quer a minha amizade.

Sei que é o justo e o óbvio nessa situação, afinal, o que eu esperava que Amelia dissesse de tão diferente? Esperava que ela continuasse insistindo em mim? Num possível nós, quando eu mesmo fiz questão de deixar claro, incontáveis vezes, que não acredito num futuro assim? Numa relação assim?

Futuro. Relação. Por que ela desdenhou quando eu mencionei esses termos? Por que fez eu me sentir um careta idiota?

Amassos. Ela esclareceu taxativa, direta, com um brilho malicioso e prático no olhar. Amelia disse que só queria me dar uns amassos. E que agora não quer mais.

Será mesmo?

Que diferença isso faz agora? Ela afirmou com todas as letras que perdeu o interesse, e eu devia estar conformado e nem um pouco surpreso com sua reação.

Ao invés disso, no entanto, sinto-me estranho e incompleto de um jeito esquisito. Sinto que perdi algo. Algo que deixei escapar por entre os dedos. Algo que eu não tinha certeza se queria de fato. Mas que agora eu sei. Eu queria. Ainda quero.

— O que... No que você está pensando, Bruce? — Reviro-me na cama e pressiono as pálpebras com as pontas dos dedos. — Não, você não pode.

Lembro a mim mesmo que não sou como os outros caras. Isso porque eu tenho o Outro Cara sob minha pele. A fera verde e destruidora dentro de mim me impede de ter uma vida normal e até mesmo de dar uns amassos sem compromisso, como Amelia soltou no ar.

Mesmo querendo... Digo, mesmo que eu quisesse, não seria prudente, seria impossível me envolver com ela. Assim como foi inviável continuar a minha história com Betty depois do Hulk.

Por mais que eu tenha aprendido a controlá-lo na maior parte do tempo, não sei como esse meu lado reagiria numa situação mais... carnal. Betty foi minha última tentativa e não deu certo. Desde então, eu nunca mais arrisquei. Com o tempo, acabei me conformando. Ou, como Tony costuma me provocar, acho que virei um monge.

Expiro com força. Mais uma vez tentando afastar essas questões da minha cabeça — tentando afastar Amelia da minha cabeça. Tentando acalmar meu coração — cada vez mais acelerado por pensar nela.

Ciente de que não vou conseguir me desligar, muito menos dormir por ora, checo as horas num relógio digital ao lado da cabeceira. Levanto da cama, na sequência. Deixo o quarto para trás. São duas da madrugada e estou caminhando sem rumo certo pela Torre dos Vingadores.

***

Vou até a cozinha, com a intenção de beber um copo d'água. Quem sabe o líquido ajude a limpar meus pensamentos e aplaque um pouco o calor febril que sinto pelo corpo?

Bem, de nada adiantou. Ainda em alerta e inquieto, coloco o copo vazio sobre a pia e fico olhando para a parede branca azulejada à minha frente.

Desanimado com a ideia de voltar para a cama, decido fazer uma visita ao meu antigo laboratório. Com nostalgia, constato que tudo está exatamente como eu deixei, há um ano. Tony não tirou um mísero aparelho do lugar. Ainda teve a delicadeza de manter o local perfeitamente limpo e organizado, como se acreditasse que, a qualquer momento, eu fosse voltar.

A Bela, o Outro Cara & EuOnde histórias criam vida. Descubra agora