Contraditório

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Eu nunca tive paciência para esperar. Sempre me pareceu como perda de tempo. Só temos uma vida. Os segundos são preciosos. Gastá-los vegetando não é uma coisa inteligente a se fazer. Naquela ocasião, contudo, era necessário. Precisávamos esperar meu cérebro processar todas as novas notícias, e, só assim, fazer alguma coisa sobre.

Mas Justin também não era um homem de esperas.

— Diga alguma coisa.

A julgar pelo seu modo de falar e me olhar, notava-se que a ansiedade o coagia a preferir que eu o esfaqueasse a contribuir com a agoniante expectativa. Expectativas são terríveis, eu não podia discordar. Ele mesmo me fez criar muitas. A pior delas foi ano passado, quando imaginei que ele forjara a própria morte para fugir comigo. Passei longas noites em claro no vento congelante que vinha da minha sacada aberta. No fim, ele havia forjado sua morte, mas para ficar longe de mim.

— O que você quer que eu diga?

Dentro de mim, eu podia sentir que a organização se findava. Logo mais, meu cérebro teria elencado a emoção predominante.

— Não cabe a mim decidir isso.

Deboche fresquinho permeou meu rosto lentamente. Aquela era uma novidade. Eu não tinha uma expressão específica desde que o vira no campo.

— Tem certeza? Sempre é sobre você. O que você acha melhor pra mim, quem, quando e onde. Não quer me dizer como devo me sentir também?

— Nunca quis que parecesse dessa forma.

Justin não ia negar aquilo, muito menos admitir, mas ambos sabíamos da verdade. Ele determinou quando começaríamos uma relação superficial — depois amadurecida — e mais tarde o nosso fim. Ou melhor, o meu fim. E mesmo assim, não pode me deixar fazer minhas próprias escolhas sem ele, empurrando Rafael para cima de mim com truques baratos ineficazes. Ele me manipulava desde o dia em que nos conhecemos, tomava decisões por mim e me moldava conforme achava melhor. Mesmo quando o assunto competia exclusivamente a mim. A ponto de ter fingido sua morte por pensar que eu merecia coisa melhor. Como uma pessoa adulta e plenamente capaz de fazer minhas próprias escolhas, ser minada dessa forma me deixava furiosa.

Pior, aquela não fora mais uma escolha banal que ele fizera por mim. Se tratava de algo que me agonizara por meses, me fizera perder minha identidade e por vezes desejar a morte. Ele me machucou da forma mais terrível existente.

E aí estava. Eu podia sentir a adrenalina vibrar desde a ponta dos meus dedos, me fazendo identificar o sentimento predominante escolhido a dedo por meu cérebro: raiva.

— Mas pareceu porque é a verdade. O que se passou pela sua cabeça, Justin? Nunca chegou a cogitar que essa decisão cabia a mim? Você deixou bem claro o seu ponto de vista de que não era a pessoa certa pra mim. Porém, sabia que eu tinha a opção de superar tudo por você. Você disse que mudaria por mim, e livremente, preferi participar da sua vida a ficar sem você. Eu havia acabado de descobrir que não podia te perder, e não sabe o júbilo que senti por ao menos sonhar com a hipótese do caminho que teríamos pela frente. Eu estava disposta a morrer com você naquele dia, e por mim, tudo bem, porque estávamos juntos. Então você simplesmente decidiu que eu tinha que seguir em frente dessa forma? Mesmo vendo tudo isso nos meus olhos e depois de dizer que me amava? — passei as costas das mãos no rosto, limpando-o. Eu não havia terminado — Não queira jogar toda a responsabilidade em cima de mim. No fundo, você estava mais sendo covarde. Se assustou com a possibilidade de amar alguém além de você mesmo e se entregar para essa relação. Fugiu da sua promessa de mudança porque não queria arranjar forças pra isso. E ao invés de ter coragem e me olhar nos olhos pra me contar, teve a capacidade de me fazer pensar que estava morto.

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