Onda Radioativa

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Tínhamos a seguinte cena: Justin rolava no chão tentando tirar uma faca, que outrora estava na pia, do seu ombro; Rafael me segurava no alto pela cintura enquanto eu me debatia e proferia as mais diversas ofensas existentes com os olhos esbugalhados cheios de veias saltadas; Caitlin e Ryan discutiam entre si para determinar qual lado escolher. Tudo isso na minha mente durante um formidável jantar de macarronada preparado por um defunto sem coração.

Tilintavam-se os talheres nos pratos, preenchendo o silêncio escolhido pelas cinco almas perturbadas sentadas numa mesa retangular pequena que fazia com que meu braço se encostasse ao de Rafael. Todos nós estávamos furiosos com o sujeito mais sereno do ambiente, sentado na ponta da mesa, ignorava toda a carga negativa jogada sobre ele.

Preferi encobrir com raiva a dor da rejeição confirmada minutos antes. Parecia lógico que se Justin escolhera, por livre e espontânea vontade, morrer pra mim, não tivesse mais o interesse que pensei ter uma vez. Estava tudo bem na minha cara. "Eu te amei tanto que..." ele mesmo o dissera na sua tentativa de justificar seu desaparecimento. Só um analfabeto não saberia que aquilo era passado. Um passado que parecia ser de uma vida atrás. Mas quanto ao "não ficar por muito tempo", eu não admitiria.

E ainda assim, eu sentia aquela faísquinha no peito por saber que ele existia. Minha melhor chance de continuar com as "ideias no lugar" — se é que ainda restava alguma — era procurar um psiquiatra imediatamente.

— O que estão planejando fazer amanhã? — Caitlin cortou o silêncio perturbador sem aviso prévio, mal olhando para Justin.

Ryan e Justin se entreolharam, deixando escapar uma olhadela para Rafael como um lembrete do impedimento que ele representava para uma conversa franca. Sinceramente, Rafael tinha minha admiração e respeito, mas aquele era o lugar errado e a hora errada para ele. Caitlin também deveria ter o bom senso de reservar a pergunta para outro momento.

Justin limpou a boca com um guardanapo antes de falar:

— Terminar o que fazíamos hoje. Ryan estava com George — o que significava "seguindo George", eu espera. Uma vez que se George soubesse da sua existência, penduraria sua cabeça num espeto depois de lhe jogar a responsabilidade pela explosão — Eu e Annelise na sala dos arquivos. Esta última parte foi infrutífera, então acreditamos que teremos que dar uma passadinha na sala de George também.

Minha respiração se acelerou. Ele estava na Companhia hoje? E planejava invadir a sala de George amanhã? Tudo isso sem esperar que uma só pessoa o reconhecesse?

— Vou incluir uma conversa com Maya na agenda agora.

Engoli em seco. Para ambos os lados, aquela não era uma boa coisa. Procurei minha língua para me manifestar.

— Ótimo. De que cor vão querer o caixão de vocês desta vez? — Caitlin debochou.

Deu-se uma pausa. Ryan falou:

— Faith, seu irmão comprou passagens para vir à Minneapolis nesta madrugada. Ele me ligou.

— E como ele tinha seu número? — minha voz subiu uma oitava de surpresa.

— Posso ter passado para Wren quando ele estava aqui...

Era o que me faltava!

Dei um suspiro irritado, trocando um breve olhar com Justin, e saí da mesa, atrás do meu celular. Aquele era um péssimo momento para meu irmão aparecer. Praguejei contra mim mesma por decidir contar sobre o contrato.

Peguei o aparelho da cama, onde Caitlin havia colocado, e tirei do modo avião. As notificações berraram uma atrás da outra, alternando-se entre ligações e mensagens de Hanna e Caleb.

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