Amigos

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Maya não era tão burra assim, não estava em casa. Fiquei, no máximo, aliviada por ela. Não desejava para ninguém encontrar esse demônio louro. E eu ainda não havia aceitado a livre decisão de Annelise nos ajudar. Ela devia estar recebendo alguma coisa em troca disso. Alguma coisa muito valiosa. Eu tinha arrepios só de pensar no que Justin podia estar lhe oferecendo

— George me mandou ficar de olho nela. Essa mulher está ferrada. Tenho certeza que não vai aparecer na Companhia hoje — Annelise nos contou ao entrar no banco passageiro de trás. Segundo sua teoria, deixar seu carro na rua de Maya a apavoraria, e Annelise adorava uma caçada.

Evitei o impulso de apontar o dedo e acusá-la de olhar ameaçadoramente para mim ao dizer essa última parte. Além de ser infantil, eu não queria chocar suas palavras contra a minha, temendo não saber de qual lado Justin ficaria.

— Já está tudo planejado. Marquei uma reunião com ele às nove da manhã. Entro e saio como um pegasus cor de rosa — ela se apoiava nos bancos da frente, sua voz irritante soprando diretamente nos meus ouvidos.

Justin respirou fundo.

— Eu te falei para não fazer isso.

— Suas ideias não são mais funcionais, e as dela nem se fala. Deixa eu adivinhar, ela mesma quer entrar na sala e conseguir sozinha extrair o contrato?

— Ela está bem aqui — rebati, inflamando minha ira por ser descartada da conversa.

— Você quer que eu confie totalmente na sua honestidade para pegar o nome do contratante?

— Vamos ser realistas. George confia em mim de olhos fechados, você sabe disso, por isso fui transferida — pela visão periférica, percebi a mão dela serpentear pelo ombro dele, a caminho da nuca. Suas palavras me davam indícios de uma história que eu não conhecia, mas deveria.

Me remexi no banco.

— E isso não deveria ser o exato motivo para eu não confiar em você?

As unhas grandes e pretas dela alcançaram seu objetivo, roçando lentamente a pele dele. Meu coração perdeu o compasso. Procurei conforto em uma suposta expressão de repulsa em Justin, mas ele permanecia compenetrado no trânsito, impassível.

Ela riu. Uma maldita risada juvenil adorável, nada parecida como o som de uma foca engasgando que geralmente minha garganta produzia.

— Eu também não confiaria em mim. Então te trouxe uma escuta e uma câmera.

Os movimentos passaram a ser circulares. Eu ia vomitar.

— Até onde sei, isso tudo pode ser planejado com George.

Sua falta de confiança nela deveria me animar, mas percebi com desgosto que ele nunca confiou em mim também.

Annelise expirou, tirando as mãos dele. Voltei a respirar.

— Sou sua melhor chance, J. Vai ter que dar esse tiro no escuro. Você sempre gostou de coisas arriscadas, vamos lá.

Não consegui evitar uma olhadinha de completo desprezo pra ela. Seu sorrisinho presunçoso pareceu crescer por isso.

— Espero que não tenha se esquecido também o que acontece com as pessoas que me traem — seus olhos dispararam para o retrovisor, para fitá-la. A ameaça tão concreta quase se tornou palpável no ar.

Annelise, ao invés de tremer de medo — a reação mais apropriada para uma situação daquelas —, abriu um sorriso gigante diante do desafio. Ela adorava ser subestimada. Se não estava pensando em traí-lo antes, o faria agora só pelo gosto do jogo.

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