Família Materna

267 17 13
                                    

Era quase verão no Canadá, o clima agradável despertara nas árvores a vontade de florescer, toda a natureza entrava em jubilo com a chegada do calor reconfortante que trazia vida. Parecia cômico que até mesmo o cemitério exibisse cores vívidas em contraste com os túmulos cinzentos.

Justin cuidou de toda a burocracia do enterro, sem ao menos que eu pedisse, logo depois de me encontrar abraçada ao corpo frio de Maya no terraço, quase tão banhada de seu sangue quanto ela. Ouvi vagamente quando afirmou ter eliminado os outros comparsas de Annelise, e nos tirou de cena quando o poder público chegou. Pensei que teríamos que responder novamente perguntas para as autoridades, mas um homem bem vestido que brotou minutos depois cuidou dessa parte, em algum canto da minha mente eu soube que era algum funcionário dos Cavanagh. Resisti em me afastar de Maya, mas Justin me abraçou pela cintura e me arrastou habilmente. Abalada como estava não lutei contra ele. Acompanhamos de longe o processo de retirada do corpo e depois seguimos a ambulância até o hospital em absoluto silêncio.

Caitlin e Ryan desceram direto no cemitério de mala e tudo logo pela manhã, e eu tentei sorrir pela consideração dispensada. Sabia que Caitlin não gostava muito de Maya, e ainda assim ali estava, expressando uma comoção condoída em sua fisionomia. Não demorou muito, eu disse algumas palavras para honrá-la, confessei que sentiria falta de toda sua energia cativante e lamentei que nos fora roubada a oportunidade de sermos grandes amigas. Você não foi uma fracassada, Maya, venceu na vida. Fiz uma prece fervorosa por sua alma e quando toda aquela carga emocional negativa forçou meus ombros para baixo, o braço firme de Justin me firmava contra seu corpo sólido. Escondi a cabeça em seu peito, me isolando de todo o mundo, escolhendo não ver mais nenhuma ofensa que a vida quisesse me fazer agora. Parecia injusto tanta desgraça acontecer com uma pessoa só.

Ajeitei minha saia mais uma vez em minhas coxas, perguntando-me se não estava curta demais. Justin estava colocando seu cinto para que pudesse ligar o carro, mas isso não foi um empecilho para que visse meu tique nervoso.

— Voltamos a nos preocupar com coisas banais?

Passamos o dia anterior todo em luto. No intuito inútil de evitar lembranças, nos hospedamos em outro hotel, mas eu não quis sair do quarto. Recusei todas as ligações da minha família até que parassem de ligar — o que foi possível graças a Ryan que disfarçadamente atendeu Caleb em seu próprio celular.

— Ela está bem, mas não muito a fim de conversar agora. Eu sei, cara. Não posso fazer isso. Mantenha a calma — ouvi seus sussurros tranquilizantes através da porta.

Ryan e Caitlin esperaram que Justin desse sinal de vida — o que aconteceu depois que deixamos o hotel — para entrarem no jatinho com todas as malas que levamos de Minneapolis para Boston. Ryan dissera que foram embora na surdina para evitar perguntas. Mas é claro que Caleb sabia que estávamos juntos. Caitlin me atualizou sobre a situação de Wren, ele chegara em casa por volta das oito e não saíra de lá.

E tinha mais essa, meu coração se partia por sua situação, pelo menos ele não seria acusado criminalmente — ou apenas tinha liberdade provisória? De qualquer forma, já era um choque e tanto descobrir que seus próprios pais desejavam a morte de seus amigos para perdê-los logo em seguida. Agora ele estava sozinho naquela casa grande cheia de lembranças. Lembrava-me muito bem do seu apoio enquanto eu passava por um luto de alguém que conhecia a menos de um ano, aguentara toda minha mudança de humor com paciência, e agora ele quem atravessava a transição difícil de luto, e pior, das pessoas que foram seu amparo por toda a vida. Contudo, ali estava eu, longe demais para poder retribuir sua gentileza — me preocupava ainda que duvidasse da minha capacidade de fazê-la devido ao meu abalo emocional despreparado para ouvir o nome dos Peters sem ter um arrepio de ressentimento.

One LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora