Desajustada

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— Sua mãe vai ter um infarto — Hanna lamentou, avaliando comigo nossa obra em seu espelho grande na parede do quarto rosa bebê.

— Gostei — conclui satisfeita. O vestido simples sem mangas deslizava por minha pele em tule preto transparente até os pés. Embaixo dele eu usava apenas um Hot Pants e sutiã da mesma cor. Para os meus pés escolhi uma sandália de salto preta. Hanna reivindicou a responsabilidade de me maquiar nas cores que combinavam com o vestido e um batom vinho matte. Finalizamos com uma gargantilha de veludo preto e um brinco pequeno de prata com pedra preta. Deixei meu cabelo livre, leve e solto, portando sua natureza rebelde volumosa e ondulada.

— Gostou de como está vestida ou da possibilidade da sua mãe morrer do coração? Sabe bem como ela leva a sério essas coisas de pudor. Para essas festas principalmente.

Se eu não visse de perto a relação tensa que Eleanor e Hanna tinham, diria que minha amiga passara a tarde toda defendendo minha mãe, insistentemente tentando me dissuadir da minha causa. Hanna achava engraçado quando eu desafiava meus pais, até mesmo empolgante, e na maior rebelião dava para trás?

— Não podemos negar que você vai mesmo chegar com barulho. Uma entrada dramática. Ótima para furos de imprensa.

— Não estou ligando para o que eles pensam — desdenhei — Agora você está uma verdadeira princesa.

Hanna rodopiou em seu vestido de seda rosinha de gala com um decote simples em V caindo gentilmente em seu corpo, e terminou com um beijo no ombro. Estávamos praticamente dois opostos. Sua maquiagem leve era tão natural que podia passar despercebida. Da mesma forma, ela continuava elegante. Sua graciosidade inerente já garantia que chamasse atenção. Talvez ela tivesse percebido isso agora para gradualmente abandonar a maquiagem.

— Obrigada, querida.

— Podemos ir agora? — verifiquei as horas no celular, a festa já começara há vinte minutos, gastamos mais tempo do que o esperado nessa produção toda. A última notícia que recebi de Justin e Ryan era sobre estarem prontos e a caminho, recomendando que nos encontrássemos lá. Nosso suspeito aparentemente ainda não pousara. A pulga atrás da minha orelha estava inquieta.

— Claro! — e antes que eu pudesse dar um passo em direção a porta, continuou a falar — Podemos ter dois minutos de sinceridade antes de encontrarmos as meninas?

Como uma pessoa envolta por segredos, assumir uma postura defensiva não parecia desprovido de lógica. Por fora, porém, abri um sorrisinho terno e juntei as mãos.

— Como quiser. Há algo que queira me contar?

Previamente, eu sabia que o assunto se referia a mim, seus olhos se atentavam cuidadosamente a minha linguagem corporal. Não de forma agressiva, mais curiosa e compreensiva.

— Pode me contar o que aconteceu com você?

— O que quer dizer?

— Não sei como explicar. Você parece tão... melhor. Mesmo com todos esses problemas, parece que voltou a ter aquele brilho no olhar. Reparei durante o dia todo. É claro que está inquieta o tempo todo, e com motivos, mas não mais... se afogando em dor. E isso é ótimo — acrescentou rápido para que eu não fizesse interpretações indesejadas — Só quero saber o que mudou, como fez isso.

Eu realmente pensei que Hanna, Hanna Marin, não notaria alguma coisa diferente?

Abri a boca muitas vezes para responder. Em nenhuma delas tive uma resposta na ponta da língua. Eu não podia mentir para aqueles olhos compassivos e grandes, me sentiria, no mínimo, um monstro.

— Tem a ver com Rafael? — me incentivou, mais ansiosa.

Rafael certamente podia ser um ponto de conforto. Porém, absolutamente não era o responsável por eu não mais me sentir amarrada em um espeto rodando numa churrasqueira.

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