Escuridão

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Tranquei a galeria exatamente 21:59. Hazel saíra mais cedo para algum casamento do qual falara o dia todo, a empolgação a fazia pensar que éramos amigas. Mas eu tinha certeza que amigos nutriam certo carinho um pelo outro.

— Ah! — o arfar veio por trás de mim — Mas já fecharam?

Eu ficaria mais carrancuda se não reconhecesse a voz. Não havia necessidade de explicar que o fim da escravidão ocorrera há muito tempo para alguém tão surrada no emprego quanto eu. Abri um sorriso calculado para Maya e seu rabo de cavalo castanho.

— Serio que te obrigaram a vir para cá a essa hora?

Seu rosto relaxou com minha aparente compreensão.

— O chefe esqueceu de comprar um presente para amanhã — lamentou.

Antes que eu pudesse abrir a porta novamente, disfarçadamente analisei sua escolha de roupa do dia. O vestido vermelho sangue até o joelho grudava em seu corpo como se fosse celofane num peru de natal. A cor destacava muito bem sua pele escura. Eu tinha certeza que ficava mais estonteante sem o sobretudo preto. Por conta do frio, usava uma meia calça grossa preta. E eu me perguntava como aguentava andar de um lado para o outro o dia todo com aquele salto. Só não era surpresa que ser atraente fosse um requisito para o cargo de assistente pessoal de George Bieber. E ela não devia ser muito mais velha do que eu.

Maya entrou em disparada assim que acendi a luz, apertando a agenda preta contra o peito enquanto passava a mão pelos cachos em tufo atrás de sua cabeça; conforme eu observara, fruto de seu espírito agitado.

— Tudo bem, o que você acha que uma mulher de quarenta anos gostaria de expor no meio de sua sala?

A acompanhei pelo salão, fazendo uma pergunta aparentemente despreocupada:

— Hmm... Depende. Qual o nível de intimidade?

Ela me olhou com um sorriso rápido debochado.

— O que você acha? Nunca vi uma mulher que ele conheça que não tenha... certo direito de passar pela sua cama.

Apesar dos três meses em que a conhecia, não sabia dizer se este direito também lhe era concedido. Eu ainda não conquistara sua confiança a tal ponto, apenas ganhava umas confissões desapercebidas aqui e ali. O que eu podia dizer? Sempre fui péssima em fazer amizades. Mas quanto mais eu demorasse, mais tempo os irmãos de Justin ficavam com a família Bieber.

— Não consigo imaginar por que — soltei sem pensar. George era um homem nojento e de idade avançada. Só me lembrei de que não havíamos entrado em detalhes sobre ele para eu ter esse tipo de opinião formada quando ela me olhou. Opa — Quer dizer, da forma que você diz, ele parece ser um cara poderoso. E esse tipo de gente atrai muitas mulheres, estava sendo irônica.

Ela concordou, para o meu alívio.

— Basicamente. E então, algum palpite?

— Ela é mais exótica? Calma? — busquei detalhes, olhando em volta.

— Não faço ideia.

— Uma coringa então. Abstrata sempre cai bem. E como uma homenagem a relação, nas cores da paixão — apontei para o quadro colorido em diversos tons de vermelho se emaranhando.

Ela deitou a cabeça, fazendo seu juízo de valor. Após meio segundo estava sorrindo.

— Adorei! A interpretação sobre a paixão também. Tem alguma possibilidade de você ir embrulhada junto para explicar? — brincou.

Se isso me colocasse dentro da sede da Companhia, nada me faria mais feliz.

Dei uma risada forçada.

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