Você tem um minuto para falar sobre saúde mental? Nós temos frango!

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"Arranje uma namorada", eles disseram. Mas vocês nunca viram a Ruby dançando What the Hell.

Eu poderia ser um bom namorado e dizer que ela parecia um anjo dançando graciosamente. Não foi bem assim. E não teve problema, porque What the Hell virou um ícone para todo mundo que, de alguma forma, é adolescente e tem problemas familiares que deveriam ter sido tratados na terapia. Muita bagagem emocional numa única música, o que também significa que o ginásio inteiro começou a berrar e se contorcer no ritmo dela. Incluindo eu.

Eventualmente pararam de tocar e colocaram ABBA. Eu adorava ABBA, eu fui criado assistindo Mamma Mia! com a Diana, mas as músicas já não me traziam boas lembranças. Assim que começaram a tocar Dancing Queen, eu lembrei da noite no motel, antes do tubo de ensaio e...

- O que eu vou falar, vai ser mega broxante e totalmente não a minha cara. - Ruby ficou na ponta dos pés para tentar alcançar o meu ouvido - Você queria saber. No telhado, quando eu te beijei. Um beijo, só isso. E eu fiquei viciada em você. Eu não conseguiria pensar em ficar com qualquer outra pessoa, que não você. Seu primo, ou qualquer outra pessoa, não poderia fazer isso comigo.

Eu não sabia o que dizer. Quer dizer, aquilo era uma declaração, eu não podia responder com um comentário sarcástico. A bem da verdade era que eu não sabia como responder, porque eu sentia exatamente o mesmo. Eu sei. Um, dois, três. Ownn. Mas eu estava demorando muito para responder e eu percebi que ela estava um pouco corada. Ai, aquela garota. Encarei Ruby, ainda sem saber o que responder e ela tomou a iniciativa: me puxou pela camiseta e me beijou. Uma vez, duas vezes, até eu perceber que eu nunca teria o suficiente. Eu não tinha a menor noção do que estava acontecendo ao meu redor, e sinceramente, não queria saber. Eu só queria aquilo, eu só precisava daquilo.

Tudo andava tão... Volátil. Tudo mudava o tempo todo. Comecei a escutar o meu batimento cardíaco, mais acelerado do que o normal. Comecei a pensar em como era engraçado imaginar o que seria de nós quando a guerra acabasse. Não dava para simplesmente apagar o que cada um de nós tinha passado. Isso se nós todos não morrêssemos ou se não transformassem o mundo em uma distopia digna de A Rainha Vermelha. Além disso, a comunidade speciallis tinha uma fé cega em mim, de que eu ia salvar todos. E se eu não conseguisse...? E se tudo desse errado? E se...? Aquele tipo de pensamento era uma espiral, uma vez que você entrava, não conseguia sair. Me afastei de Ruby, delicadamente e falei que precisava tomar um ar.

- Tudo bem? Você está com aquela cara - ela perguntou

- Que cara?

- A cara de "é tudo a minha culpa". Eu te conheço, Jace. Quer conversar?

Eu realmente estava passando mal, mas eu odiava preocupar as pessoas. Dei meu melhor sorriso e falei que sim, só precisava ficar um pouco sozinho. Ela me deu um beijo na bochecha e me deu espaço. Droga, por que eu estava soando tanto? Minhas mãos começaram a tremer e eu não conseguia respirar direito. O que diabos era aquilo? Eu estava bem há dois minutos. Meu peito doía tanto, era como se eu sugasse o ar, mas não conseguisse inalar.

Eu estava perdendo o controle. Era isso. Eu ia morrer. Eu não podia morrer. Eu só precisava de ar... Por que...?

De algum jeito eu consegui ir para o corredor. Eu estava cansado demais e me sentei no chão. Senti o meu rosto molhado, quando eu tinha começado a chorar? Por que eu tinha pedido por espaço? Eu sentia que ia morrer, ou pior, eu ia morrer sozinho.

Alguém me cutucou. Eu não quis levantar o rosto. A pessoa se agachou e começou a falar comigo. Era Alex.

- Jace. - olhei para cima - É a primeira vez que isso acontece?

Tentei responder que eu nem sabia o que estava acontecendo, mas era como se a minha voz não saísse. Eu ainda não conseguia respirar.

- Jace, olha para mim. - a voz dele era firme e calma, em algum momento ele sentou na minha frente - O que você está sentindo é assustador, eu sei, mas não é perigoso, ok? Você está tendo um ataque de pânico. Essa é a pior parte, mas já vai melhorar. Você pode repetir isso?

Sacudi a cabeça.

- Tudo bem, então. Vamos fazer outra coisa. Você pode respirar comigo? Quando eu contar, você respira. Um... - tentei respirar, e ele continuou. "Dois", tentei de novo. Quando ele chegou no dez, eu já tinha começado a respirar normalmente e olhei para ele. Era estranho ver ele tão sério assim, as sobrancelhas juntas e ele preocupado. Alex não costumava ser o responsável, eu provavelmente estava um desastre  - Você pode me fazer um favor? Eu preciso que você encontre umas coisas para mim, pode ser? Eu preciso que você encontre cinco coisas que você consegue ver. Não precisa me dizer, você pode apontar. Eu só quero que você encontre elas.

Franzi o cenho. Que coisa mais estúpida. Pelo menos eu conseguia pensar direito agora, já era algum avanço. Fácil, cinco coisas que eu conseguia ver. Eu via ele, via o ginásio, tinha um copo vermelho do meu lado, um saco de salgadinho. Só faltava uma coisa, olhei para as minhas mãos.

Ele continuou me dando instruções. Alex pediu para eu encontrar quatro coisas que eu conseguia tocar, três barulhos que eu conseguia ouvir e duas coisas que eu conseguia sentir o cheiro. Ele ainda parecia tenso e agora eu conseguia respirar direito.

- Isso. Você consegue levantar? A gente vai dar uma volta agora.

Ele me levou para o campus. A noite estava fresca e o ar puro me ajudou um pouco, mas eu ainda estava cansado, então sentei na grama.

- Então... Um ataque de pânico? Essa é nova. - brinquei. Alex ainda não tinha falado nada - Valeu, inclusive. Como você sabia o que fazer?

- Eu tenho ansiedade. Isso acontecia bastante, quando eu era mais novo. Você vai ficar melhor depois de dormir. Foi a primeira vez que isso aconteceu? - fiz que sim com a cabeça e ele suspirou - Você tem que ver isso, ouviu? Eu sei que não é o melhor timing, mas se aconteceu uma vez, pode acontecer outra.

- Eu sei. Eu só não queria preocupar ninguém. Olha no que deu...

- Não, sem culpa. Isso é normal. Nós todos temos passado por muita coisa, cara. Você, principalmente. Ninguém vai sair dessa 100%.

- Você pode não contar para os outros? Tipo...

- Eu já mandei mensagem para o pessoal, avisando que a gente estava aqui fora, mas não falei nada. Se você buscar ajuda, eu não conto para ninguém. Feito?

Fiz que sim. Eu me sentia tão exausto, queria dormir. Eu realmente não tinha planejado aquilo, era tão inconveniente. Nunca quis tanto mudar de assunto.

- Eu esqueci de te falar. A sua casa em Ainsworth, que decoração, hein?

- Horrível, né? O pior é que os gatos parecem te seguir com os olhos!

- Eu sei! O mau gosto parece estar na família, Firethorne. - brinquei e dei um cotovelada nele

- Eu sou seu amigo, não sou? Já era um sinal claro disso. - ele retribuiu a cotovelada e nós rimos. A essa altura nós já estávamos largados na grama, quase dormindo

- As estrelas estão bonitas. - comentei. - Sabe o que mais está bonito?

- Isso é gay.

- Você é gay. Literalmente.

- Sou mesmo. E você - ele apontou para mim, acusatório - é indelicado. Enfim, lá na festa, enquanto você estava envolto no seu drama heterossexual com a Ruby, eu fui na cantina pegar uma comida decente. - ele abriu uma sacola de papel e mostrou alguns nuggets. Eu nem tinha reparado que ele estava com a sacola - Quer um pouco?

- Claro.

Cenas assim, senhoras e senhores, mostram porque os meus amigos são os melhores.


Jace Norman, o Nihil PropriumOnde histórias criam vida. Descubra agora