Zoológico

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>Nicole<

Ouvi um miando baixo e abri os olhos. Sentado sobre minha barriga Nice, meu gato negro me olhava com amor e admiração, ele esfregou a face contra o meu rosto, então pulou da cama e correu porta fora.

– Nice? – chamei, acostumada com ele sempre voltando ao meu chamado. – Nice?! – chamei novamente.

Miau! – pulei da cama, assustada. Sobre o balcão Leo me observava como seus olhos bicolores de forma curiosa.

Leo?! – joguei as pernas para fora da cama, confusão.

Corri até a porta e fui até a minha cozinha-sala, depois fui ao banheiro e a garagem. Olhei por tudo, mas não havia nenhum gato negro na casa e não devia mesmo ter mesmo, já que Nice estava morto há quase dois anos. Mas ainda sim, aquele olhar...

Suspirei deixando o meu corpo cair no sofá. Quiara roncava em sua almofada completamente alheia a minha agitação. Leo sentou na porta da sala me observando preocupado.

– Tudo bem, meu amor – o confortei com sorriso – Eu só estou louca, mas isso já era o esperado.

Olhei o relógio, 7 horas da manhã.

Mas que merda! – reclamei.

Meu primeiro dia de folga e eu e eu acordava de madrugada. Voltei para cama, mas depois de tanto virar de um lado para o outro resolvi levantar e fazer uma (ugh!) faxina geral. Com um aparelho de som ligado no último volume, (afinal se eu posso ficar acordado a essa hora da manhã, porque meus vizinhos podem dormir até tarde?) cantei, dancei, esfreguei. Terminei já era perto das 9h. Me joguei no sofá esquecendo do mundo por um momento, me perdi em pensamentos e histórias que nunca aconteceriam, mas que eram muito vividas em minha mente. Mais uma vez, Leo se sentou próximo a mim e Quiara deitou aos meus pés.

Peguei meus materiais de desenhos e me coloque a desenhar com calma o rosto de uma garota que eu vira na rua. Ela era linda e possui olhos verdes maravilhosos. Depois passei a desenhar Leo, os olhos bicolores, o nariz rosado, o pelo branco e espesso. Logo sua imagem se mostrava visível no papel. "Aquele que te amou. Aquele que você amou.", rabisquei as frases, uma a cima e a outra a baixo do desenho. Peguei alguns alfinetes e fixei no mural que ficava na sala, os olhos bicolores me encaravam do desenho.

– O que achou? – perguntei para o gato, mas só então reparei que ele não estava mais na sala – Leo? – bufei – Gato idiota!

Sem mais nada para fazer, fiz pipoca e peguei uma cerveja, então coloquei o filme do Rei Leão e cantei em plenos pulmões todas as músicas da trilogia, assim como repeti fala por fala a muito decoradas. Coloquei a bacia de pipoca no chão e no mesmo instante Quiara atacou, fazendo barulho ao mastigar os grãos que não haviam estourados.

Depois de um cochilo no tapete da sala finalmente fui me arrumar para ir ao zoológico. Era 2 horas, isso queria dizer que as 5 horas eu já estarei em casa. Vesti rapidamente um jeans, camiseta do AC/DC e minha jaqueta de moletom preta. Peguei a chave e fui até meu pequeno e velho Palio vermelho fosco. O carro não ligou na primeira vez, mas logo ganhou vida fazendo um barulho que lembrava uma criança engasgada.

Pela janela da sala Leo me observava com atenção, como se quisesse me dizer algo. Quando desci pra fechar o portão o gato não estava mais lá.

Dirigi ao som de Nirvana, cantando com meu em inglês perfeito, xingando ocasionalmente algum idiota que não sabe usar o pisca. O Zoológico ficava na cidade vizinha em uma parte afastada, mais próximo a mata e distante das construções de concreto.

Assim que cheguei estranhei o lugar. Mesmo em dias de semana, como era o caso de hoje, o Zoológico era bem frequentado. Hoje porém, havia alguns poucos carros e um caminhão preto. Pensei em voltar outro dia, então dei uma olhada no painel do carro e nem fodendo eu ia gastar tudo o que eu gastei de gasolina de varde.

Caminhei até a entrada e notei que não havia ninguém na recepção.

– Oie??? – chamei, minha voz se perdendo pelos corredores – Mas que porra é essa?

Esperei um momento, mas ninguém apareceu.

Ah!, que se foda!

Entrei no zoológico, fui até o galpão onde havia deixado meu caderno. Forcei a porta e para minha surpresa ela abriu com um solavanco baixo. Sem pensar duas vezes, entrei.

>Kishan<

Eu estava entediado e faminto. Levantei mais uma vez e caminhei pela jaula. Os leões na jaula minha frente parecia desesperados e tristes, mordendo pedaços de madeira. Suspirei, bebendo bastante água na tentativa de diminuir a fome. Nojento, mas eu estava comendo os pequenos insetos que eu encontrava no chão.

Ouvi um barulho na porta e me virei naquela direção. A luz forte do Sol entrou no galpão ganhando a trêmula luz artificial, cegando-me temporariamente. A porta se fechou e depois de piscar várias vezes conseguir distinguir a forma que caminhava na minha direção.

Era aquela garota de capuz que vira a dois dias. Hoje ela estava inteiramente vestida de preto e poderia facilmente se perder na escuridão, se não fosse pelos cabelos ruivos e a pele pálida. O que ela está fazendo ali?

– Achei você! – exclamou vindo em minha direção.

Como? Inevitavelmente dei um passo para trás, apreensivo.

– Sua vadia idiota! – reclamou abaixando o capuz que escondia seu rosto, então ergueu a mão e se estapeou – Só não esquece a barriga porque depois não tem com quem empurrar a vida.

Como? Eu a encarei ainda mais confuso.

– Estranho – ela olhou ao redor antes de se agachar e pegar o caderno preto que estava próxima a minha jaula.

Então era aquilo que ela estava procurando.

– Oi tigre! – ela sorriu pra mim – Onde está todo mundo?

Se eu soubesse, pensei.

Eu a análise um instante. Talvez ela fosse a minha fuga. Talvez Durga tivesse mandado ela pra me ajudar, mesmo que aquela garota não parecesse lá grandes coisas.

Bem, eu precisava arriscar. Corri para a parte de trás da jaula que era trancada com um pequeno cadeado e a chave ficava do lado da entrada de serviço a poucos metros da minha jaula, então correi novamente para a frente colocando as patas na grade, depois voltei para trás, me jogando contra a porta, na esperança de que ela entendesse. Refiz o trajeto várias vezes, até que parei um momento para olha-la.

– Se tá com bichinho no cu? – ela indagou, sorrindo.

Que? Me espantei. Ela tinha falado mesmo aquilo?

Eu estava errado, ela não ia me ajudar. Suspirei voltando para a parte de trás da jaula, ignorando-a completamente.

– Porque está tão triste? – ouvi a voz próxima de mim.

Parada na frente da porta da minha jaula a garota me observava com seus olhos castanhos emblemáticos.

Coração PuroOnde histórias criam vida. Descubra agora