Proximidade do antigo e suposto novo amor

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Estava anestesiado, não sabia o que pensar e nem o que fazer, tudo o que conseguia era encher minha cabeça com perguntas impossíveis de serem respondidas; em pouco tempo, Was conseguiu a atenção que sempre fiz de tudo para ter. De todas as formas tentei me aproximar, mas era afastado, Giúlia me lançava ao mar com muita facilidade, mas me resgatava são e salvo ao sorrir. Era tão bela, tão serena, tão idêntica a mim. Realmente nos parecíamos bastante, até gastava meu tempo imaginando nossos filhos, quando já tínhamos nos casado, morando em uma cidade distante, bem distante da realidade. Todos no colégio a desejavam, até mesmo suas amigas, que afirmavam sobre investir, caso tivessem chance.
Giúlia era o sonho de qualquer um que a conhecesse, uma verdadeira princesa; majestosa, porém, desumilde. Desprezava todos que tentassem ganhá-la, sem compaixão, simplesmente negava todos os sinais de possíveis interesses direcionados a si. Admirava seu sorriso de longe, sabia que não teria chances e nem ousava insistir, só iria absolver tristezas e decepções, não queria criar repulsa por alguém que tanto amava. Vê-la rindo tão à vontade ao lado de Was, fez surgir um sorriso em meus lábios ressecados, Giúlia exalava uma risada tão gostosa de se ouvir, tão mansa, tão pura. Antes tentava esquecê-la, mas somente ao estar em sua presença, ou se quer lembrar de sua existência, voltava à estaca zero. Como acontecia naquele momento.
O amor que sentia por Giúlia ainda estava ali, guardado em um espaço escondido em meu coração, afastava-o de mim para que vivesse sem lamentar, ao saber que não a teria comigo. Todo aquele sentimento florido e disparado, foi tomado por pura escuridão, eu enfim voltei a pensar. Ela não estava sentada perto da minha casa sem motivos, não estava ali por mim, não desejava me ver, dependendo até de como as coisas iam, nem ao menos lembrava que eu existia. Ela também se apaixonou por ele, pensei eu em reticências, mas logo balancei minha cabeça e franzi as sobrancelhas. Também? Como assim também, Agno? De onde veio esse também? Perguntava-me estranhando o atual pensamento. María ainda estava ao meu lado, tínhamos descido da bicicleta há alguns minutos atrás enquanto observávamos a tal cena.
Cogitei a opção de não mais segurar o objeto e entreguei para María que me olhou confusa, retribuí o olhar da moça que segurava o guidão com as mãos. Não entendia o que estava acontecendo ao meu redor, talvez com María fosse igual. Era amiga de Giúlia, e claramente não sabia de Was até vê-lo pela janela do meu quarto. Imaginava eu que a outra também não devia saber.
Não queria, mas era mais forte que eu; suspirei baixo e caminhei com passos lentos até os jovens que conversavam informalmente. Quanto mais me aproximava, mais sentia vontade de voltar e ficar com María, era tentador, mas meus pés resistiam por mim e continuavam a conduzir meu corpo. No momento em que percebi estar próximo o suficiente para ganhar atenção, comecei, imediatamente a falhar com a respiração. Eles me olhavam como se tentassem entender o porquê de estar parado em sua frente, deviam achar que eu diria algo, então esperavam que assim fizesse.

- Giúlia... o que faz... aqui? - minha voz estava trêmula e demonstrava insegurança.
- Quem é você?
Giúlia me olhou como se eu fosse um vírus pronto para acabar com sua saúde, era sempre o olhar que direcionava a mim. Com a mesma pergunta.
- Agno. Estudamos juntos.
- Hum? Sério?
- Sim... e já faz uns... três anos...
- Isso tudo? Desculpe, mas não me recordo.
- Percebo...
- Mas enfim, respondendo sua pergunta, vim chamar a María, mas Was disse que ela havia saído.
- Sim, fomos juntos à cachoeira.
- Que bom. - Giúlia se levantou ajeitando sua roupa. - Conversem em paz, estou indo.
- Está cedo. - Was a olhava ainda sentado.
- Tenho que adiantar minha vida se quiser vê-lo novamente. - a moça sorriu.
- Tem razão, quanto antes for, mais cedo nos veremos. - Was se levantava retribuindo o sorriso.
- Até mais tarde, loirinho.

Giúlia aproximou seu polegar do queixo de Was e fez um breve carinho no local enquanto o outro voltava a sorrir. Meu coração disparava com tanto desespero que chegava doer, não sabia o que pensar e nem o que dizer, apenas permanecia imóvel diante das pessoas que pareciam importar. Em um momento do qual não pude acompanhar, os dois haviam se distanciado, Giúlia caminhava para longe, enquanto Was entrava em casa. Continuei parado, sozinho e sem expressão. Era tão difícil processar todas aquelas informações, bagunçando minha mente, bagunçando meu estado, bagunçando meu humor.
Olhei vagamente na direção de María que deixava minha bicicleta sobre a grama, e com a cabeça baixa, caminhava de volta para sua casa. Havia me livrado do vazio que sentia antes, mas não demorou para tê-lo em mim novamente, não sabia dizer o que sentia e nem no que pensava, era simplesmente horrível sentir algo e ao mesmo tempo não sentir nada.
Suspirei pesado e caminhei cabisbaixo para dentro da casa, meus pais normalmente saíam no período da tarde, e muita das vezes, só voltavam no amanhecer do dia seguinte, então obviamente ficaria sozinho com Was.
Ao chegar em meu quarto, me deparei com o outro vestindo apenas uma cueca boxer da cor preta; se pudesse, viveria todos os dias da minha vida assistindo aquela cena, repetindo sempre, de novo, de novo e de novo.

- Não vai entrar?
Me assustei com a pergunta alheia, pois se Was estava de frente para a janela, como soube que estava parado na porta?
- Eu... hum...
Levei meu olhar ao chão, pensava que ele sabia também das olhadas indiscretas que eram direcionadas às suas nádegas cobertas.
- Não faça tanta cerimônia, o quarto é seu, lembra?
- Sim... você está certo... - sentei-me sobre a cama de frente para Was que espalhava suas roupas desordenadamente. - Vai sair?
- Sim.
- Onde vai?
- Em algum lugar com Giúlia.
- Vocês... gostam um do outro? - Was me olhou.
- Somos obrigados a gostar um do outro para sairmos juntos?
- Não necessariamente.
- Agno, por que está fazendo essas perguntas?
- Eu... só quero saber...
- Existem coisas que não cabem a ti saber. Essa é uma delas.

Was pegou algumas peças de roupas e entrou raivosamente no banheiro, o ouvi trancar a porta e suspirei baixo deitando-me sobre a cama. Qual seria o motivo de tanta ira dessa vez? Por que não podia simplesmente conversar sem exaltações? Pensava eu, hipocritamente. Sabia que fazia assim, mas quando foi comigo, doeu. Tinha interesse nos dois, enquanto eles se interessavam entre si, eu estava de fora, não me queriam. Enquanto observava o teto, ouvia os sons provocados por Was; por vezes esbarrava em algo deixando-o cair no chão, por outras cantava, eu sorria.
No todo, talvez não seria tão ruim tê-lo perto, era agradável até mesmo de longe, mas a certeza de roubar Giúlia de mim deixava-me triste. Em um desses momentos, ainda deitado, me peguei pensando onde Was poderia ir com minha garota; em uma festa? Um baile? Cinema? Sua casa? Seu quarto? Seu banheiro? Por mim, talvez o banheiro fosse um bom lugar, mas pensar neles juntos ardia o peito.
Me desliguei de meus longínquos pensamentos quando Was bateu a porta. Ainda irado? Por quê? Onde estaria sua maturidade? Talvez realmente tivesse treze anos, um homem de vinte e três não agiria de forma tão infantil. Até mesmo eu, com apenas dezessete, entendia que não havia necessidade.

- Você é mesmo tão idiota a ponto de dizer o que está pensando?
Was me olhava, tão próximo que respirava em seu rosto.
- Eu... bem... - divertia o outro com meu nervosismo exagerado.
- Cale-se, sabemos nós que não conseguirá falar algo que faça sentido, não gaste saliva tentando.
Was ajeitou sua postura, já que antes se curvou para aproximar nossos rostos.
- O que há com você? - sentei-me na cama enquanto trocávamos olhares.
- Pare de me fazer perguntas, não lhe devo satisfações.
- Custa responder? Morrerá por isso?
- Gastarei meu tempo com o que não vale a pena.
- E o que não vale a pena?
- Você.

O homem virou-se na direção contrária e saiu do quarto do mesmo modo que saiu do banheiro, irado. Em minha bermuda um volume crescia, eu me odiava por isso, ficava cada vez mais duro ao lembrar da independência alheia.
A forma agressiva que Was passou a tratar-me fazia algum efeito em mim, efeito esse que não me transparecia nenhum sentido. Bufava e resmungava alto e em bom som, gritava raivosamente que odiava ser homem, odiava me sentir, odiava ficar duro. Apertava furiosamente meu pulso quando ouvi Was responder aos meus gritos, dizia que certamente não odiava ter duas mãos, claramente estava a rir de mim, pois sua voz estava trêmula.
Por que ainda estava na casa? Meu ódio cresceu junto da vergonha, me castigava pensando que talvez ele soubesse ser o motivo da minha ereção, ou até mesmo teria visto quando estava próximo. Mas por que ria? Por isso? Não, não mesmo. Me negava a pensar, aquilo era tortura, não aguentava tanto.
A noite já estava presente e meu quarto se encontrava escuro, tinha preguiça de ir acender as luzes, mas para que acendê-las? Deitado, com a lua iluminando meu corpo, estava de bom tamanho. Iria esperar por Was e não dormiria até vê-lo chegar, mas conforme as horas passavam, menos me conformava. Demorava tanto e tanto, acabei chorando, como uma criança que ficara sem sua mãe. Sem ti não há sono, diria para ele se me perguntasse o motivo da insônia. Mas não estaria mentindo, realmente não havia, para mim, logicamente não. Fui vencido ao amanhecer, não aguentava mais resistir, não chegava e nem dava sinal de vida. Uma ligação? Nem pensar. Não quis, era óbvio.

Blue! - A Dimensão Dos Seus Olhos.Onde histórias criam vida. Descubra agora