O céu estava nublado, coberto de nuvens escuras e pesadas; mesmo com o clima frio, não me importei de tomar outro banho, talvez assim pudesse expulsar todos os pensamentos suicidas da minha cabeça. Vozes, sussurros, sombras? Estava enlouquecendo, minha vista embaçada comprovava que tudo estava dentro de mim, começava em mim, e não terminava em lugar algum. Fui obrigado a vestir roupas de inverno em pleno verão, procurei por um moletom que Lúcio havia esquecido em minha casa e o vesti, mas como o garoto era bem mais alto, fiquei parecendo o Dunga dos sete anões. As mangas pretas engoliam meus braços e meu cabelo estava úmido, voltei a por as meias nos pés e sentei-me sobre a escrivaninha para desenhar.
Após realizar alguns pequenos rabiscos, senti a enorme vontade de tomar chocolate quente; levantei-me deixando o lápis sobre a folha quase que em branco e desci as escadas devagar enquanto ouvia uma certa conversa. Was estava junto aos meus pais perto da porta de entrada, olhei para as malas ao lado do seu corpo supondo mentalmente que a hora de sua partida estava próxima. Permaneci parado no terceiro degrau, fazia silêncio para continuar a não ser percebido. Meu momento excluído não durou muito, Was me viu e abriu um sorriso simpático dizendo ter um presente para mim. Mesmo estranhando a tamanha simpatia alheia, ainda estava em silêncio, o olhando sem mover um traço ou detalhe se quer. O homem então tirou um urso tamanho médio de sua mala e o estendeu na minha direção dizendo ser seu último recurso para me ver bem, segundo ele, em todas as vezes em que sentia uma tristeza profunda, abraçava o urso enquanto chorava e sua dor as poucos se esvaía.
Por um tempo ficamos nas seguintes posições: ele sorrindo sem mostrar os dentes e erguendo o urso na minha direção, enquanto eu o olhava da mesma forma, ainda imóvel. Seu cabelo estava com um penteado impecável, tão comportado, como um filho de madame; suas roupas iguais as que usava quando o conheci. Minha mãe conviveu tempo o bastante ao meu lado para saber que eu não iria pegar o urso, então levou suas delicadas mãos até o brinquedo e disse pôr em meu quarto na próxima vez que fosse até ele. Meu pai viu que Camila parecia não estar gostando do jeito como me comportava e também não devia aprovar minha atitude, então usou sua voz firme e autoritária para ordenar que eu me aproximasse do russo. Caminhei com passos lentos até o homem que voltou a sorrir para mim, logo Was estendeu seus braços para mim na tentativa de se despedir, mas ao se dar conta de ter sido ignorado, descaiu o olhar.
Ainda com os braços erguidos e evidentemente esperançoso, Was voltou a me olhar, podendo então presenciar a cena em que eu me desviava de seu corpo para ir até a cozinha, ainda em total silêncio. Meus pais claramente não tinham onde esconder seus rostos, olhei para trás enquanto botava o leite condensado na panela e pude ver os braços de Was se abaixarem devagar, olhei novamente para a panela enquanto imaginva o quão mal e sem jeito devia ter ficado, mas por que eu deveria me importar?
A panela já estava no fogo quando reparei, não entendia o porquê intercalava tanto de um tipo de pensamento para outro. Em um momento pensando que minhas ações o poderiam magoar, no outro estava totalmente nem um pouco preocupado com o que ele acharia dos meus atos, que se desse mal, era algo bom de pensar, as vezes. Ouvir meus pais implorando o perdão de Was tão desesperadamente estava me incomodando, para piorar o outro fingia não ter o afetado tanto, pessoas fracas de personalidade. Terminei de preparar a bebida, caminhei veloz e direto até meu quarto, não aguentaria ficar mais tempo aturando os três com tanta morosidade. Estava sentado em minha escrivaninha quando ouvi a buzina do carro alertar que havia chegado, corri até a janela e soube que pensei certo, enfim Was estava indo embora.
Sentei-me sobre a janela com as nádegas cobertas pelo pequeno short e o imenso moletom que usava sobre a madeira, os pés pendurados para o lado de fora, qualquer ventania ou empurrão me jogariam do segundo andar onde me encontrava, mas não temia. Observei Was sair da casa com uma chave na mão direita, o mesmo beijou o objeto e o pôs sobre um segundo carro, logo levou seus olhos até mim e ficou a trocar olhares comigo antes de sorrir e caminhar até o carro que o levaria até o aeroporto. Aquele não era, de forma alguma, o adeus que almejava para nós dois, por pura e espontânea escolhia minha.
O observei partir em um carro preto após ver, pela última vez, seu lindo e branquelo sorriso. Seus olhos verdes brilhavam tanto, seu rosto deixava mais do que óbvio o quão mal estava, mas no fundo eu sabia que fazia o possível para não demonstrar, sempre fez.
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Blue! - A Dimensão Dos Seus Olhos.
RomanceAgno é um jovem reservado de 18 anos, que mesmo sendo hétero, encontra o amor em um homem saudável e atlético no auge dos seus 23 anos de idade, que no caso, também é hétero. Os amigos o acompanham na sua auto descoberta e tentam o ajudar, mas o gar...