INDECISÃO

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- E você fez o quê com ela? - Perguntou meu amigo Metehan.

- A prendi no quarto de fuga, você sabe, o quarto de urgência para caso de ataques. - Bebi mais um gole de whisky e olhei para a paisagem de Mardin. O restaurante oferece uma bela visão.

- Você não está bem com isso, nem precisa falar. - Afirmou Matehan me olhando balançando a cabeça em reprovação.

- Passei três dias sem entrar lá. Depois Betül chega me falando que Surya estava delirando. Achei que fosse um plano para sair ou tentar fugir.

- Delirando? - Arqueou uma sombrancelha me fitando confuso.

- Eu bati em Surya, bebi demais e perdi a cabeça. Acabou infeccionado as feridas e a febre fez ela ter delírios. - Joguei as palavras que não queriam sair. Apesar de ser o único com quem falo dela, ainda é difícil.

- É Osman, acho que você só alimentou o ódio que ela sente por você. - Falou o que já vinha pensando alguns dias.

- Sabe Metehan, quando cheguei ao quarto ela estava encolhida delirando, assim que me viu começou se afastar suplicando para que eu não a machucasse. Estava tão frágil como nunca havia visto, seus olhos já não tinham mais aquela luz, estava fraca... Talvez eu tenha exagerado.

- Você queria ver a fragilidade dela, lembra? - Ele falou passando na minha cara.

- Mas agora que vi...eu não sei se foi o certo.

- Destruir Surya por causa de Suna nunca foi uma boa idéia, te avisei. - Ele falou apontando um dedo para mim. Tomou um gole de café e fez gesto de negação.

- Não estava destruindo ela. Só mantendo distante. Talvez ela nunca esqueça do que tentei fazer, eu não deveria.

- Cara, você forçou ela? - Metehan aproximou a cadeira da mesa para que só eu pudesse ouvir.

- Não...eu...eu só tentei. Senti muita raiva pelo que ela fez, mas queria fazer ela pagar por ter sido possuída por outro. Em meio aos delírios ela me confundiu com o desgraçado, eu deixei ela fazer isso, deixei porquê... porquê gostei de ver ela me olhando com aquele brilho...aquele sorriso... Eu queria que ela estivesse me vendo, que tivesse esta atitude ao me ver.

- Eu te conheço Osman, sei que tem este ódio todo aí dentro porque não suporta ver que não tem ela para você. - Metehan afirmou. Olhei para ele incrédulo, não era bem isso.

- Não é isso. Mas não quero ela olhando para aquele desgraçado com aquele sorriso.

- Talvez seja tarde demais Osman. - Joguei a cabeça para trás e voltei a encará-lo.

- Não sei do que está falando. - Enrolei arqueando a sombrancelha, eu suspeitava mas a certeza é sempre bem vinda.

- Você quer ela para você, aceite isso logo, pois suas atitudes estão destruindo esta mulher. Você pode perder ela para sempre. - Senti meu peito doer com a possibilidade de não ter mais Surya me desafiando todos os dias, do seu perfume, seus abraços quando está dormindo. Apesar de me estressar gosto do seu atrevimento, mas logo joguei fora este pensamento.

- É impossível, Surya é minha mulher, eu já tenho ela, querendo ou não. - Coloquei meu calcanhar por cima da outra perna e voltei a encará-lo.

- Sabe que tenho razão. - Desviei meu olhar a imagem da minha cidade.

- Vamos mudar de assunto. - Dei um ponto final aquilo.

Cheguei em casa e procurei saber pela enfermeira o estado de Surya. De acordo com ela, a febre passou e Surya está respondendo muito bem aos antibióticos, no entanto está sem se alimentar como deveria, está sendo quase forçada a isso.

Desci as escadas e vi que estava dormindo assim como fui informado. Sentei na cama e passei os dedos em seus cabelos, muitas vezes me peguei fazendo isso enquanto dormia. Aquele cheiro dos seus cabelos sempre atraíram, assim como o seu corpo que me fazia ficar duro todos os dias.

Ela é tão meiga e doce dormindo, me faz querer descobrir quem é a mulher que se esconde por trás dessa Surya grosseira e rancorosa.

Seus olhos se abriram aos poucos,  assim que percebeu minha presença num salto saiu da cama. Levantei e fiquei olhando aquela expressão amedrontada, coisa muito estranha de se ver, pois se trata de Surya.

- Por favor Osman, não faz nada. Eu...eu prometo que farei tudo direitinho, mas por favor não faz isso. - Suas palavras me destruíram.

Naquele momento ela estava pensando que iria usá-la para meus desejos. Eu queria dizer que não era assim, não era esse tipo de homem.

Ela estava encostada na parede, mantendo a maior distância que conseguiu. Percebi que seu corpo tremia, estava tão pálida, a perda de peso estava nítida.

- Como está? Eu tinha que perguntar algo e a única coisa que me veio a mente foi isso. Ficar alí parado só estava deixando ela mais assustada.

Ela abraçou o próprio corpo e olhou para o chão, estava sem expressão.

- Bem. - Sua voz era quase inaudível, se não fosse o silêncio total do quarto eu não teria escutado. Percebi que estava tremendo e resolvi pegar um lençol dos que levei para lá.

Fui até sua direção e ela se apertava tanto a parede que se pudesse atravessava, sem olhar para mim, virou o rosto para o lado. Coloquei o lençol sobre o seu corpo e observei as lágrimas que desciam por suas bochechas.

Achei que ela fosse me afrontar novamente, me xingar e esculhambar. Mas não, ela estava diferente.

Ver ela tão fraca, tão quebrada estava sendo estranho e ao mesmo tempo ruim. Saí de lá o mais rápido que pude, ao passar pela porta do quarto que Surya tacou fogo entrei e fiquei parado.

Todos tinham razão, eu devo deixar isso tudo no passado. Havia impedido todos de reformar ou pintar depois do incêndio, mas agora vejo que devo mudar isso. Não quero mais Suna na minha vida, ela morreu e por ela eu tenho que fazer isso.

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