Capítulo 34 - Funeral

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Suspirei enquanto massageava lentamente minhas têmporas. Mais um sonho. Não me lembro exatamente do que se tratava, e nem precisava lembrar, eu já tinha uma ideia do que poderia ter sido.

Olhei em volta, grogue, recuperando lentamente meus sentidos e sendo invadida pelas lembranças desagradáveis das coisas que tenho que fazer hoje. Coisas demais, isso significa que não posso mais cochilar.

Droga. Justo hoje que eu estava com cólica alguém que sequer conheço morre e tenho que ir para o funeral.

Você me pergunta por quê? Eu te digo por quê. Por que tenho que fingir que dou a mínima que a rainha da Kasiléia morreu. Com todo respeito, eu não conhecia ela, por que tenho que me importar? Eu tenho problemas muito mais sérios que isso para me preocupar.

Alguém bate na minha porta mas não respondo. Talvez se eu ficar quieta me esqueçam. Afinal, parece que estou sendo, sou a última pessoa a perguntarem a opinião mesmo.

Mas nunca deixam de me colocar no meio de coisas que vão me aborrecer. Ah, isso fazem questão. Especialmente aquele mala do Fabian.

Minha tática infelizmente não dá certo. Kayla entra sem a menor cerimônia no meu quarto. Porém a parte estranha e que, pelo semblante dela não parece estar muito composta. Muito pelo contrário.

— Vamos Julie. Temos que ir. — Ela ordena em meia voz com uma expressão impassível.

Levanto sem protestar, melhor acabar logo com isso.

— Por que eu tenho que ir nesse funeral? Eu nem conhecia Claire. — Me queixo para ela enquanto estamos indo para o teleportador do castelo.

Eu não gosto de teleportadores. Reconheço sua utilidade, mas se você ficar muito tempo num lugar do outro lado do mundo que você acabou de se teleportar, o fuso cobra um preço tirano de você. E também não consigo me acostumar com a sensação de sucção que você sente no estômago. É como usar um elevador, só que mil vezes pior. E eu sempre odiei elevadores, me dá a sensação de estar caindo, e eu tenho medo de altura.

Ela não responde. Apenas mantêm o olhar fixo na frente, encarando algo que não parecia estar neste mundo. Ela sequer parecia estar pensando e assemelhava estar fora do ar. Isso é bem estranho. Kayla é normalmente explosiva e agitada, nunca a vi assim.

Ela mantém essa expressão séria e vazia até ficar sozinha comigo e corpo da ex-rainha da Kasiléia num caixão fechado, numa capela do outro lado do mundo.

Kayla se aproximou do caixão, com a mesma impressão impassível, e tocou em sua borda, e olhou por alguns segundos para o caixão.

E então, lentamente, sua fachada séria e vazia começou a convulsionar e se desfazer em angústia, e desabou de joelhos se afogando num jorro bruto de lágrimas.

Claire... Por Livlian Claire... Não... Não... NÃOOOO... — Ela gritou para o vazio e enterrando o rosto nas mãos enquanto seu choro preenchia a capela vazia.

Me senti uma intrusa e totalmente deslocada ali. Dei as costas e trotei para fora da capela onde o corpo estava sendo velado. Eu sei que é uma coisa horrível de dizer, mas eu não conhecia essa rainha, então não consigo me importar. O melhor que eu posso fazer é dar espaço para quem se importava prestar o luto adequado.

Dou de cara com Ninis no pátio da capela. Ao contrário de Kayla, que escondeu suas emoções esse tempo todo e só desabou no último momento, Ninis chorou logo no momento que recebemos a notícia. Ela está com a cara completamente amassada.

— Ninis, qual era a relação de Kayla com Claire? — Tentei soar delicada.

No momento que as palavras saíram da minha boca me arrependo um pouco, por dois motivos. Um: Eu não sou delicada, desisti de tentar parecer isso. Só consigo fazer isso para uma pessoa e ninguém mais no mundo e ainda olhe lá. Dois: Eu tenho o direito de saber por acaso? Eu sou uma intrusa aqui. Sempre fui e sempre serei. Antes, nos primeiros dias, quando Petra ainda andava conosco, eu me sentia bem. Até me deixei enganar, que talvez o que eu sempre quis finalmente estivesse ao meu alcance.

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