♤ - Cecília

114 20 143
                                    


   Cheguei no ginásio sete minutos mais tarde. Cecília estava sentada na arquibancada, parecia menor e mais frágil. Vestia uma calça larga e um moletom marrom - ela odiava moletons. Seus cabelos - agora finos - estavam soltos, e os olhos tristes, com olheiras fundas.

   Me sentei ao seu lado, silenciosamente.

- O que aconteceu? - Perguntei, sem encara-la.

   Um tempo se passou.

- Estou grávida - disse ela, finalmente olhando para mim.

   Me virei rapidamente para o seu rosto fino.

- Você o que? - Perguntei, tomada pelo susto.

   Ela lutava para não chorar.

- Eu estou grávida - suas mãos tremiam. - E eu não sei o que fazer.

   Eu estava perplexa. Um filme passava pela minha cabeça ao escutar que a minha melhor amiga - aquela que dizia que nunca queria ter filhos, que nunca se importou com a opinião de ninguém - estava grávida.

   Por um ato de impulso, puxei-a para mim e a envolvi nos meus braços. Cecília me abraçava fortemente enquanto chorava no meu peito.

- Eu errei tanto - disse ela. - Errei tanto com você.

   Passei a mão pela sua cabeça e tentei conter as lágrimas que ameaçavam vir.

- Não é hora para isso - respondi. - Vai ficar tudo bem.

   Ela continuava soluçando e falando palavras desconexas.

- Eu te amo, Liz - sussurrou. - Te amo tanto, me perdoa por tudo.

   Suspirei.

- Também te amo, minha Cecí - disse eu, tentando não sentir todo aquele sentimento que tomava conta de mim e que me sufocava e ameaça sair pelos olhos à qualquer momento.

   Era a falta que eu sentia da minha melhor amiga.


   Já na minha casa, Cecília se acalmara e tentava me contar o que estava acontecendo.

- Então o Nicholas ainda não sabe? - Perguntei.

   Ela negou.

- E por que você ainda não contou a ele? - Indaguei. - Ele é o pai, Cecília.

   Ela me encarou com angustia.

- Será que você ainda não entendeu, Liz? - Disse. - Se eu contar para ele que eu estou grávida, ele vai querer me matar.

   Senti meus pelos se arrepiaram. Claro que eu sabia, só não queria admitir o que estava acontecendo ali. Não queria admitir para mim mesma que minha melhor amiga estava passando por uma situação que eu já havia passado à dois anos antes.

   Um relacionamento abusivo.

   Me sentei ao seu lado e olhei para os meus pés.

- Estou me sentindo tão culpada. - Disse eu. - Eu vi que você não estava bem, mas mesmo assim com todos os sinais... eu não fiz nada.

   Ela pôs a mão gélida sobre a minha. A culpa que eu sentia pesava tanto que doía os meus ossos. Por mais que nós estivéssemos sem nos falar, eu deveria ter notado, ter feito alguma coisa.

- Não foi culpa sua - respondeu ela. - Eu fui uma estupida por não ter te ouvido e te afastado de mim. - Deu uma pausa. - Me perdoa, Liz. Estou tão arrependida.

   Cecília estava com os olhos cheios d'água.

- Eu também errei - senti minha boca secar. - Vai ficar tudo bem. - Dei uma pausa. - Quer dormir hoje aqui?

Morgan's - No Olho De LizOnde histórias criam vida. Descubra agora