Setembro de 2017

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02 de setembro de 2017

(Quinn)

"Estou nervoso" – Santiago esfregava as mãos.

"Por quê? Você o conhece. Não há mistério algum."

"Mas eu não tenho habilidade para negociar esse tipo de coisa. Além disso, ele é amigo da sua mulher. Não amigo seu ou meu" – ele contorceu o nariz.

"Acontece que esse cara sabe o caminho das pedras melhor do que eu e você. E se ele concordar em entrar no projeto, teremos alguém com nome para nos dar suporte. Quem vai dar crédito e dinheiro a dois desconhecidos?"

"Você não é tão desconhecida assim."

"Para os produtores que nos interessam, eu sou. Vamos encarar a realidade, Tiago. Eu sou uma assalariada e você está fazendo bico como arte-finalista de revista em quadrinhos underground. A gente não tem dinheiro e se você quer levar o seu projeto..."

"Nosso projeto" – ele me corrigiu.

"Nosso projeto adiante, a gente vai ter que agregar alguém conhecido. O ideal seria o George Clooney, só que ele não é para o nosso bico!"

Santiago olhou derrotado para mim. O ideal dele era que a gente pudesse fazer um filme com amigos nos moldes dos nossos curtas da faculdade. Só que produzir um filme, mesmo que ele tenha apenas a ambição artística, requer dinheiro. Oras, era só pegar o seriado The Project da Bad Things coma BBC. O piloto custou algo próximo de um milhão de dólares. Alto valor para uma sitcom. Episódios regulares, do miolo de temporada, não saiam por menos de 400 mil dólares. Um filme com distribuição direta em DVD custa de quatro a cinco milhões. Um filme indie como "Juno" custou 7,5 milhões de dólares. Ele pagou o salário base do sindicato para todos os envolvidos, o que é pouco, mas foi um fenômeno que faturou 147 milhões. Parte desse dinheiro foi para o bolso de alguns dos atores que participaram com o adicional de porcentagem na bilheteria. É um risco que eles correm para se envolver em projetos indies. O roteiro foi de Diablo Cody, que era uma completa desconhecida. Só que o diretor em questão foi Jason Reitman, que já tinha experiência na indústria, dirigido três filmes e participado do grupo de direção do genial "Obrigado Por Fumar". Além disso, Reitman era amigo pessoal de boa parte do elenco e é filho de um diretor famoso. Ele trabalhou com Daniel Dubieck, que foi co-produtor executivo em Obrigado Por Fumar, assim como em Juno, que tinha vasta experiência com o mercado em curtas-metragens e curtas-documentários. É onde mora a diferença: ter amigos certos.

Nossa dificuldade principal é que tínhamos ainda um currículo muito ruim para conseguir realizar um projeto que tinha de ter orçamento mínimo de 15 milhões. Era impossível sem um padrinho e tinha de ser um bem louco para colocar duas funções importantes nas mãos de dois jovens como eu e Santiago. Como Liam, Gary e Barbra, da Bad Things, recusaram o projeto, teríamos de encontrar alternativas. Pensei em Roger Benz, meu antigo patrão e hoje amigo. Cheguei a telefonar, mas soube que a R&J está passando por algumas dificuldades financeiras após duas produções fracassadas para o cinema. James Golvi inclusive está estremecido com Roger porque ele é um cara do teatro essencialmente e nunca gostou muito das investidas em outras mídias. Os meus outros contatos próximos também não têm banca para um projeto dessa natureza. Santiago conhece menos gente que eu no meio. Por isso precisava pensar em alternativa. Além disso, cinema é um trabalho coletivo.

"Pronto?" – Santiago acenou para mim e apertamos a campainha para entrar na recepção do edifício na 910 Onion Street, Park Slope, Brooklin. Estávamos num pequeno edifício de sete andares, com um apartamento por andar desses que custam os olhos da cara e mais um pouco. Atores ganham bem – "residência o senhor Segal, por favor."

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