Agosto de 2019

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04 de agosto de 2019

(Quinn)

Não acredito que estou na Alemanha. Não acredito que deixei Rachel me convencer a vir aqui. O problema não é o país. Gostei de vir para Munique. Parece uma Paris mais nova, asséptica, organizada, com construções algumas centenas de anos mais recentes e calçadas decentes para o pedestre. As ruas cheiram bem e a organização é impecável. Rachel estava encantada com o lugar. Era a primeira vez que visitava a Alemanha, país que sempre ficou de fora dos roteiros turísticos que ela costumava fazer pela Europa. Acho que a parte Berry da família se ressentia com o passado alemão. Acho que o meu pai se orgulharia se dissesse que estava na Alemanha, o país mais rico da Europa, o que comanda o continente e, melhor ainda, o que foi o berço nazista que ele secretamente admirava. De qualquer forma, Rachel estava feliz em me levar até lá e não era por causa dos lindos jardins. Em vez de monumentos, ela me levou para o complexo próximo ao enorme campus da Universidade de Munique.

"Alguma dúvida no processo?" – disse o clínico que nos atendeu com um fortíssimo sotaque.

"Tomar hormônio, ovular, retirar os óvulos que amadureceram e o resto vocês fazem no laboratório..."

"Entendo que esse é um processo muito delicado, mas se quiserem, posso indicar uma clínica de fertilização comercial muito séria aqui mesmo de Munique que tem um banco de esperma muito confiável e bem catalogado."

"Acho que não, doutor" – Rachel tentava ser simpática – "Com todo respeito às clínicas alemãs, mas se quiséssemos uma solução comum, não teríamos saído dos Estados Unidos. Eu mesma fui gerada num laboratório de uma clínica de fertilização em Cleveland. Portanto, sou prova da eficiência dos métodos. Mas o que buscamos aqui, doutor, é a oportunidade de gerar um filho biologicamente meu e da minha esposa."

Rachel podia dizer abertamente porque o médico estava juramentado e não poderia revelar ao mundo o que era dito dentro daquelas quatro paredes.

"Correto. E entendo perfeitamente, senhorita Fabray. É entre essas e outras que o governo alemão foi pioneiro em permitir o procedimento."

"Com todo respeito doutor, mas quais são nossas garantias de que é o nosso material genético que será usado sem qualquer outra interferência? Digo, de outro tipo de material genético?" – perguntei.

"Todas as garantias possíveis e cabíveis. Temos um código ético muito rigoroso neste laboratório. Além das senhoras tem o interesse em gerar um filho biologicamente seus, nós aqui somos os maiores interessados no sucesso do projeto. Se desejar, podemos estudar uma forma de poder ficar dentro do laboratório para acompanhar o procedimento, embora isso não esteja em nossas normas de conduta."

"Não acho que seja necessário" – desconversei.

"Acho que está tudo esclarecido" – Rachel sorriu.

"Correto, senhora Fabray."

"Eu ligarei para o senhor nas próximas horas para comunicar o que decidimos."

"Estaremos aguardando."

Nos despedimos do clínico e foi uma boa coisa sair daquele complexo de laboratório. Rachel e eu trocamos olhares. Como era de se esperar, ela estava esperançosa e eu temerosa. Para nós seria um processo comum para a fertilização in vitro. A diferença seria toda feita no processo de extrair o material genético do meu óvulo para injetar num óvulo de Rachel e então esperar que a célula comece a se dividir. E toda vez que penso nisso não consigo deixar de lembrar daquele prelúdio horroroso de Alien, o Prometheus, que trazia essa idéia de produzir novas espécies bebendo um suco preto. E a combinação errada de quem bebesse o suco preto poderia gerar um alien. Até hoje ninguém entendeu a lógica do suco preto e penso que Ridley Scott deva ter pesadelos com aquele filme.

"O que achou?" – Rachel me perguntou esperançosa.

"Trezentos mil dólares para arriscarmos um filho biológico..." – divaguei.

"Vale todo o esforço. E pagarei cada centavo se isso significa que eu terei um filho seu."

"Filha. Você ouviu o doutor."

"Vai ficar até mais simples pensarmos na decoração do quarto e na escolha do nome. Sempre gostei de Sophia."

"Eu detesto Sophia."

"Não seja emburrada, Quinn."

"Não sou! Eu não gosto do nome, ok? E também não acho certo você sonhar em decoração de quarto e nomes sendo que nada foi feito ainda."

"Você está nervosa."

"Pode apostar que sim, Rach. Isso aqui é algo grande. E se não der certo?"

"Você fala por causa do dinheiro?"

"Não é por causa do dinheiro. Me preocupo mais com o fator extra-dinheiro. E se não der certo?"

"Se não der certo, poderemos tentar outra vez."

"Não é tão simples, Rach."

Suspirei. No que eu estava me metendo ao aproveitar os dois dias de folga das filmagens para vir aqui na Alemanha? Como é que me deixe convencer por Rachel? E se tudo ocorresse bem, de 15 a 20 dias eu teria de tirar uma licença das filmagens para voltar aqui e deixar a minha mulher grávida. Que deus nos ajude. Não estava preparada para tal. Não estava mesmo, mas eu faria. Não sei que loucura tomou conta de mim para aceitar um plano tão maluco. Rachel deve ter um feitiço que age contra mim. É isso! Rachel é uma feiticeira.

"Então?" – ela tocou o meu rosto assim que entramos no quarto de hotel e me deu um beijo – "Que resposta devo dar ao médico?"

"Isso é uma loucura!"

"Mas você concordou vir aqui e escutar."

"Sim, escutar, Rachel. Mas há mil ponderações em minha mente neste momento. Isso está ficando cada vez mais real, mas antes de se tornar real de vez, não acha que isso merecia uma reflexão mais profunda?"

"Mais do que aquelas que tivemos? Quinn, eu estou fazendo um esforço grande aqui. Eu terminei o meu acordo com o Luis, recusei trabalhos nesses últimos meses porque desejo ter agenda livre para esse único objetivo."

"É, só que agora isso nunca esteve tão real."

"Você não quer. É isso?" – ela cruzou os braços e fechou o cenho.

"Preciso de um tempo. Rachel, eu estou filmando, estou sem muita cabeça para fazer grandes decisões e eu preciso de um tempo. Vão filmar mais 20 dias. Então me dê mais esses 20 dias. Por favor?"

"Até o final das filmagens, Quinn Fabray" – ela estendeu o dedo.

"É tudo que peço."

"Não brinque comigo, Quinn. Não sobre esse assunto."

"Prometo que não estou de brincadeira" – descruzei os braços dela para segurar as mãos – "Nunca brincaria com isso ou com os seus sentimentos. Mas a idéia de maternidade ainda me assusta e eu preciso

...

17 de agosto de 2019

(Santana)

Esse era o vestido de madrinha mais horroroso que vi em anos. Olhei para Mercedes incomodada em roxo. Não era tom lilás. Era roxo mesmo, brilhoso. E lá estava Mercedes em seu porte baixinha e gordinha praticamente fantasiada de lady gnomo. Era isso! Se Rachel era um hobbit, Mercedes era lady gnomo. Abri um largo sorriso e acenei para a minha amiga que me retribuiu com a cara fechada. Por pouco ela não levanta o dedo médio.

"E aí, Julio? Preparado para ser tio?" – brinquei com o meu primo.

"Não estou nem preparado para ver a minha irmã no altar" – ele ajeitou a gravata. Parecia desconfortável – "Nem no meu casamento eu fiquei tão nervoso."

"Por que diz isso?"

"Sei lá... não acho que Daniela deveria se casar só por causa da gravidez."

"Ué? Mas ela não já estava noiva quando aconteceu?"

"É, mesmo assim..."

"Olha o ciúme de irmão mais velho falando alto" – provoquei.

"Sei lá. É que você não viu ainda o meu pai."

Imagino que tio Pedro deveria estar num estado de nervos só. Casar logo Daniela, que sempre foi a queridinha dengosinha dele. Ainda mais por ser a filha que assumiu os negócios da cervejaria caseira e ajuda na pequena vinícola. Julio sempre foi o filho desgarrado que gostava de motos e motores. Não é à toa que ele montou uma sociedade de oficina que monta motos personalizadas no Canadá.

Olhei para os convidados que começavam a se arrumar na igreja. Meus pais e Johnny se posicionaram no lado direito da igreja junto com a família da tia Rosa. Amigos, pessoas da igreja que reconhecia também se posicionava à direita. O lado esquerdo, do noivo, havia pessoas que não conhecia. Pudera, eu também mal conhecia o noivo de Daniela.

"Está vendo tudo isso aqui?" – segurei Johnny e disse ao pé do ouvido – "É tudo que não gostaria no nosso casamento."

"Somos dois."

Era muita pompa. Muita frescura. Muita cerimônia.

"Olá pessoal" – Rachel chegou com o celular em mãos e arrumou um espaço para se sentar entre minha mãe e eu – "Desculpe, me enrolei. Puxa, ainda nem começou."

Rachel tinha passado na casa de Judy Fabray para fazer não sei o quê. Acho que foi a pedido de Quinn ou ela estava tentando dar uma de boa nora. Não que minha irmã fizesse questão disso. De qualquer forma, enquanto nós chegamos de Columbus direto para a igreja, Rachel pegou o carro e passou rapidamente na casa dos Fabray.

"Judy me prendeu mais tempo que previ" – ainda estava ofegante – "Nossa, o que essas damas estão vestindo?"

Quis soltar uma gargalhada. Uma bem para fora. Gnomo, certo? Mercedes se dirigiu para o microfone e começou a fazer uma interpretação bonita de Ave Maria. Não sabia que ela era capaz de cantar como uma soprano.

"Por que ela foi convidada para cantar e eu não?" – Rachel comentou com a aspereza do ciúme.

"Mercedes é madrinha e cunhada" – ponderei.

"Eu sou a prima dela, sou sangue. Merecia cantar."

"Uma prima que ela só passou a tratar bem depois que crescemos e você ficou famosa, diga-se de passagem."

A porta do salão se abriu e fizemos o ritual de se levantar para receber a noiva. Daniela estava linda e não escondia que estava grávida. Tio Pedro estava elegante no terno preto bem cortado. Podia ver o estado de nervos dele. Estava duro, não conseguia olhar para os lados. Pude ver que ele secou uma lágrima quando entregou a minha prima para o noivo.

Era engraçado esse ritual de entregar a noiva e não é algo cristão. No judaísmo acontecia esse simbolismo do pai entregar a noiva ao noivo. Quer dizer, os cristão copiaram isso de nós. Mas o que quero dizer é que isso passou a ser um simbolismo curioso se penar que hoje em dia era uma raridade casar virgem. A noiva já se entregou para o noivo faz tempo e, se brincar, para muitos outros noivos que nunca foram. Eu mesma praticamente morava com o meu noivo. Daniela mesmo não só se entregou como já foi para o altar com filho na barriga. Minha prima foi ainda mais radical entre nós três e eu precisava respeitar. Quer dizer, a minha prima Anna ainda era muito novinha para ser dito qualquer coisa. Ela tinha 13 anos e tudo que eu fazia nessa mesma idade era beijar Brittany e alguns meninos da escola. Tudo bem que havia muitas meninas que engravidavam aos 13. Mas não Anna. Certo? Balancei a cabeça para espantar o pensamento.

O padre fez um sermão rápido para a nossa alegria e logo veio a leitura dos votos. Nenhum dos dois escreveu os próprios, o que perdeu o charme, de certa maneira. por outro lado, só contribuiu para que o ritual andasse mais depressa. Logo os noivos desceram do altar e nós pudemos seguir para a festa. O salão ficava ao lado da igreja, mas era um local independente. Era o que eu chamava de visão empreendedora. Caminhamos até a porta ao lado, que estava toda enfeitada com flores, e fomos em direção à mesa em que estavam nossos nomes. Achava isso uma tremenda bobagem, como se estivéssemos na escola e os lugares fossem marcados. Entendo que reservar uma mesa para a família dos noivos era de bom tom, mas no meu casamento, os convidados sentariam onde quisessem, assim eu não teria a dor de cabeça para fazer distribuições que nunca satisfaziam.

"Não acredito" – Rachel levou a mão no rosto.

"O quê?"

"Olha a banda."

Voltei minha atenção para o palco e me surpreendeu o fato de ninguém menos que Tina, Finn e uma garota chamada Marley, que foi apresentada a mim na despedida do senhor Schuester, estavam ali se preparando para cantar.

"Esse cara está em todas nessa cidade?" – Johnny reclamou. Até hoje ele não engoliu a última visita da Orca à Nova York para fazer a patética tentativa de ganhar a minha irmã.

"Aquele não é o garoto Hudson?" – papi olhou para o palco também – "Ele não tinha virado mecânico ou coisa assim?"

"Antes tivesse virado" – minha mãe desdenhou – "Os vocais dele são fracos e ele é descoordenado."

"Ele era um bom parceiro em nossos duetos e nossas vozes tinham boa harmonia" – Rachel o defendeu – "Aliás, em vez de a gente ficar à distancia especulando, seria educado cumprimentá-lo."

"Eu cumprimentaria Tina, nunca ele" – repliquei.

"Seria educado mesmo assim" – Rachel foi em direção ao palco e eu a segui. Johnny ficou para trás com meus pais e Beth, o que era prudente.

"Ei Finnept" – disse alto, chamando atenção do pessoal no palco – "Tina" – acenei para a minha colega de coral – "Quer dizer que agora vocês estão no negócio de banda de casamento? De quem foi essa brilhante idéia?" – disse com o sarcasmo que tinha certeza que ele não entenderia.

"Olá vocês" – Tina disse séria. Ela entendeu meu sarcasmo.

"Rachel, que surpresa! Nunca imaginei encontrar você aqui" – me ignorou por completo o bastardo.

"Surpresa? Você não sabe nem de quem é esse casamento?" – tentei confronta, mas Rachel me deu um leve empurrão para o lado e tomou a frente.

"É o casamento da nossa prima" – Rachel foi uma estraga prazeres em explicar. Eu planejava jogar na cara dele um pouco mais da imbecilidade que ele representa ao mundo – "Mas a banda é um novo negócio?"

"Mais ou menos" – Finn abriu a boca – "Cantar em casamentos é só uma forma de arrecadar fundos para reformar o teatro que nos foi cedido para o coral comunitário. Marley achou que poderíamos ganhar um bom dinheiro e ainda nos divertir."

"Claro que uma idéia dessas não poderia vir da sua cabeça" – desafiei mais uma vez e Rachel ficou ainda mais a minha frente.

"Olá pessoal" – Mercedes chegou com um drink a base de tequila em mãos – "Finn Hudson e Tina Chang, vocês estão bem!"

Era impressão minha ou ela iria pegar pesado no álcool?

"Olá Mercedes. Bom te ver também" – respondeu Tina – "Mas e Quinn? Não veio?"

"Quinn está em Londres..." – Rachel ia começar a explicar quando o pessoal do cerimonial deu um alerta para a banda se posicionar.

Começou a tocar "Thinking About You", da Norah Jones, o que não era uma surpresa uma vez que Daniela era fã incondicional da cantora. O casal foi anunciado e eles entraram na pista de dança enquanto a garota Marley assumiu os vocais. Lembro vagamente de ouvi-la na despedida do professor Schue. Não era espetacular, mas estava longe de ser uma Finn Hudson. Ou seja, era satisfatório. Daniela começou a dançar com tio Pedro e o noivo com a mãe dele. Até aí tudo bem, se Mercedes não estivesse enchendo a cara, Finn não ficasse encarando a minha irmã de um jeito que estava deixando todo mundo da família com o cenho fechado. Pelo menos ele não criou mais problemas enquanto esteve em cima do palco matando cada clássico que teve oportunidade.

Com o tempo, Johnny parou de se importar com Finn. A presença dele era pequena demais para estragar a nossa diversão. Eu prestava mais atenção na bebedeira de Mercedes. Apenas uma vez na vida eu a vi daquele jeito, há anos numa festinha promovida por mim e por Rachel. Ela era apenas uma moça solitária assediada ainda casualmente pelo meu primo, mas que na época a relação deles não poderia acontecer por Mercedes ter 17 anos e meu primo 24. Bizarro pensar que esses dois se conheceram no dia que papai morreu.

"Oi Cedes" – eu a abordei quando ela queria ir ao palco para cantar, mas só se fosse para enrolar metade das letras das músicas e dar um show negativo – "Preciso de uma ajuda com uma coisa ali. Será que você poderia me dar uma mão?"

"Não, eu vou cantar. Se ela está lá se exibindo, por que não eu?" – naquele instante, Rachel fazia um dueto com Finn. Revirei os olhos. Que mau gosto. Mas voltei a minha atenção para minha amiga e reparei na certa ausência de Julio para o estado da esposa dele.

"Acho que seria muito importante você me ajudar primeiro e cantar depois. O palco não vai a nenhum lugar certo?"

Ela me olhou desconfiada e me seguiu para fora do salão.

"Então, Cedes, como estão as coisas no Canadá?"

"Elas precisam estar, Satan?"

"Geralmente as coisas estão de alguma forma, certo? As coisas e nós também estamos de algum jeito."

"Filosofia barata..." – ela gargalhou – "É isso que você diz nas rodas empresariais."

"Ah não. O assunto favorito nas rodas empresariais é comparar a qualidade da cocaína dos fornecedores e quem promove a melhor orgia" – nem tanto, mas conversas em meios empresariais eram menos sérias do que dizia o senso comum. Filosofia barata era para os acadêmicos ou bêbados pretensiosos – "Sério, Cedes. Você não parece muito confortável desde que chegou."

"É esse vestido de profundo mau gosto."

"Concordo com o vestido ser horrível. Mas é só isso mesmo. Julio parecia estar bem nervoso também."

"O seu primo?" – ela falou com desdém – "Ele tem todos os motivos para estar nervoso."

"Mesmo? Por quê?" – falei sem querer fazer jogos. Marcedes estava bêbada e bêbados falavam.

"Ele e eu estamos vivendo de aparências aqui, Satan. O puto do seu primo tem outra e nós estamos nos separando. Mas não contamos a ninguém para não estragar o casamento da Daniela."

"Julio tem outra?" – era difícil de acreditar.

"Uma branquela canadense que anda de moto. Eu vi uma mensagem daquela cadela no celular dele. Escroto."

"Quando você descobriu isso?"

"Semana passada. O escroto do seu primo nem tentou inventar desculpas quando eu o confrontei. Escroto" – ela começou a chorar e eu a abracei.

"Eu sinto muito, Cedes. Sinto mesmo."

"Homens são uns escrotos. Não confie neles."

"Eu sei que são" – vi Johnny me procurando enquanto Mercedes chorava no meu ombro e fiz sinal para ele sair de perto. Ele demorou alguns segundos para entender, mas logo sumiu de vista.

Talvez homens não fossem confiáveis. Bom, que 100% era? Até a minha irmã, a santinha correta e dona da verdade, se deixou fotografar com os peitos de fora beijando um cara só para ter mídia. Eu? Mesmo amando Johnny, fui capaz de traí-lo uma vez, por uma noite. Quem poderia atirar a primeira pedra em direção a Julio? Ele poderia ser um escroto, mas ainda era da família. Por outro lado, eu realmente gostava de Mercedes. Ela era uma boa amiga e só poderia sentir pena de toda situação.

Ajudei Mercedes a tomar um ar e a se recompor antes de voltar a encarar os demais na festa. Passei o braço pelos ombros e ela encostou a cabeça no meu. Ficamos quietas, silenciosas. Foi quando vi, Rachel e Finn escapulirem para um lugar mais discreto. Eles não nos viram. Fiz sinal de silêncio para Mercedes e fui atas deles, sorrateira. Queria descobrir o que se passava. Encontrei os dois numa parte isolada do jardim que circundava o prédio do salão de festas. Finn estava se inclinando para beijar a minha irmã e a vaca permitiu. Meu sangue ferveu. Mas logo vi Rachel se afastando e o empurrando.

"Desculpe, Finn, não é isso que eu quero. Eu a amo" – minha irmã disse olhando para baixo.

"Não negue que não se sente atraída, Rach. Você e eu... se até hoje existe essa química entre nós, essa atração é porque a vida está mostrando que ainda precisamos acontecer."

"Tá, eu confesso que cantar junto contigo traz boas lembranças. Foi divertido. Mas o que tivemos ficou no passado."

"Então por que você começou a responder o meu beijo? Por mais que você fale que não. Ainda há algo entre nós, Rachel."

"Porque estou meio bêbada e ela não está aqui..."

"Nós ainda podemos ser" – Finn segurou o braço de Rachel – "Eu posso te dar o filho que tanto quer. Ela nunca poderá fazer isso."

"Ela pode" – Rachel parecia querer se libertar – "Ela pode" – minha irmã repetiu mais forte – "E eu a amo, Finn. Eu amo Quinn Fabray. Agora me larga."

"Você sabe, no fundo do seu coração, que eu estou certo" – ele a beijou, mas dessa vez foi um ato forçado.

Era a minha vez de entrar em cena.

"Larga ela!" – gritei e ele se assustou. Largou Rachel e olhou para mim como se quisesse me bater.

"Por que você não se mete nos seus próprios assuntos, Satan? Por que não vai brincar com o seu noivinho."

"Se afaste da minha irmã" – me aproximei mais enquanto Rachel vinha em minha direção quase que querendo se esconder atrás de mim – "Volte para a sua bandinha e vá tentar ganhar o seu dinheiro para consertar o telhado do teatro. Assim esquecemos tudo e evitamos dramas desnecessários, ok?"

"O que você quer Rachel?" – ele mudou completamente o tom de voz. Falou com suavidade, manipulativo.

"Quinn" – Rachel disse com firmeza que me deixou orgulhosa. Isso me fez sorrir.

"Adeus Finn" – disse com um sorriso provocador.

"Não, eu quero ouvir isso dela" – ele esbravejou.

"Não" – Rachel balançou a cabeça e recobrou a postura de uma verdadeira Berry-Lopez – "O que aconteceu aqui foi nada, Finn. Me desculpe, porque eu sei que vai doer, mas você é apenas um namoradinho de adolescência e só. Não representa mais nada para mim. Meu passado, presente e futuro é com Quinn Fabray, minha esposa. É ela quem eu amo. O que você pensa sobre nós, é só um sonho seu. Eu sonho com Quinn."

Sorri para minha irmã e segurei a mão dela, entrelaçando nossos dedos. Estava orgulhosa. Chegamos ao salão. Tina estava ao microfone. Meus pais dançavam. Beth também dançava com meu primo Simon que era apenas um ano mais velho. Mercedes parou de beber e estava sentada à mesa ao lado de tia Maria. Senti pena. Toda a situação dela era uma pena, sobretudo porque Mercedes era bem estimada pelos meus tios. Julio foi um cachorro. Amava meu primo, mas ele foi um cachorro. Johnny estava sentado à mesa bebendo um pouco e observando a movimentação. Fui até o meu noivo e ofereci a minha mão, sem largar da minha irmã.

"Gostaria de dançar com as gêmeas Berry-Lopez?"

Johnny sorriu. Pegou minha mão e nós três fomos à pista de dança. Precisávamos nos desintoxicar de certas notícias.

...

18 de agosto de 2019

(Rachel)

Estávamos no velho Teatro Reiner, onde era casa do Teatro Comunitário de Lima. Dei os primeiros passos da minha carreira ali naquele espaço. Foi quando fiz a minha primeira protagonista na montagem do Mágico de Oz em 2008. Nossa, isso foi há mais de dez anos. Era triste ver o lugar detonado. Tina disse que aquele espaço ficou trancado e abandonado por cinco anos. Pudera. Toda renda pública ia para manter o luxuoso (para uma cidade pequena, claro) teatro municipal próximo a prefeitura, local onde Lima costumava receber shows e peças dos grandes nomes que se arriscavam ir a uma cidade pequena de Ohio, além de sediar etapas do concurso de corais. O grupo de teatro amador chegou ao fim em 2010 e o Teatro Reiner foi cedido para alguns outros grupos menos organizados por um tempo até a prefeitura trancá-lo de vez. Isso até Tina, Marley e Finn, com a ajuda de Burt Hummel, apresentarem um projeto para reabrir o lugar. Precisava de reparos na acústica, trocar os carpetes, reformar as poltronas do lugar e fazer atualizações nos equipamentos de luz e som.

"É para isso que lutamos tanto para conseguir um dinheiro" – Tina explicou – "A prefeitura nos concedeu o espaço por dois anos, com contrato renovável a cada dois anos. Isso foi uma conquista. Mas as melhorias são por nossa conta. Por enquanto temos 15 integrantes, sendo a metade pertenceu ao Nova Direções. A outra metade vem de pessoas de Lima Heights. Nosso objetivo é montar futuramente uma escola comunitária de artes com o coral, teatro musical, aulas de dança..."

"Imagine Finn Hudson dando aulas de dança" – Santana desdenhou.

"Eu sei que não gosta dele, San, e realmente até hoje ele não sabe dançar nem se a vida dependesse disso. Mas ele se importa com esse projeto, se importa com as pessoas daqui e se tornou um bom professor."

"Tem razão, Tina. Eu não gosto dele."

Ignorei Santana e continuei passeando pelo espaço. Subi no palco e tive a mesma visão de quando era uma garotinha adolescente de pernas que pareciam dois gravetos com sonhos de Broadway e ambição incomum para alguém da idade.

"Artie disse que poderá se envolver a partir do próximo ano para dirigir o teatro musical. Jake, o namorado de Marley, vai começar a dar aulas de dança. Eu cuido da administração. Finn e Marley são co-diretores do coral. Todo nosso trabalho é voluntário e contamos apenas com doações para nos ajudar" – continuei a ouvir as explicações de Tina.

"Qual o orçamento para toda reforma?" – Santana perguntou.

"São 200 mil dólares. Temos 37 mil dólares arrecadados em quatro meses de campanha. A meta é conseguir 50 mil até o fim do ano para reformar o som e alguma coisa da parte eletrônica para reabrirmos oficialmente. Por hora, usamos o auditório de McKinley para apresentações."

"Santy" – chamei a atenção da minha irmã e das outras duas mulheres – "Não acha que podemos fazer a nossa parte? O que acha de meio a meio?"

Minha irmã acenou. Apesar de Finn, embora não tenha mágoas do que ele fez ontem, do que ele queria me forçar a fazer, aquele era um bom projeto tocado por pessoas que realmente se importavam.

"Oitenta e seis e meio para cada, Ray" – ela disse quase que instantaneamente.

Peguei minha bolsa e assinei o meu cheque. Minha irmã fez o mesmo e entregamos as duas folhas para Tina, que ficou boquiaberta junto com Marley.

"Acho que isso garante a reforma completa do teatro" – Santana disse séria.

"Por favor, nos convide para a inauguração" – completei.

...

30 de agosto de 2019

(Rachel)

Tinha três propostas à minha frente. Uma era um acordo para um ensaio de moda que eu costumava aceitar. Desta vez para a Latina com a proposta de explorar mais a minha curiosa e "exótica", como foi colocado, identidade judaica e latina. Tudo bem. Essa era a minha identidade cultural e tinha todo orgulho dela. A segunda era estrelar um filme indie a ser rodado em março e outro dizia respeito a participação em três episódios em uma série da CBS. Recusaria o filme e aceitaria o convite para a série que era gravada em Atlanta.

Encostei-me no sofá e prestei atenção no noticiário. Desliguei a televisão cansada de ver tragédia. Mais um conflito estourava no Oriente Médio e eu estava meio farta, por mais que fosse sensível ao sofrimento humano.

Quinn chegaria hoje depois de filmar Solar, a grande aposta para o próximo ano da Bad Things com planos para ser lançado em outubro, que era quando os filmes candidatos ao Oscar costumavam estrear. Eu tinha um compromisso apenas no início de outubro, uma coletiva para a estreia da temporada final de Slings and Arrows além da premiere. Depois em dezembro para a premiere de Stars Wars, a aposta do natal. Tinha mais dois eventos promocionais na Marie Clarie e outro de caridade. Kurt teria trabalho comigo neste semestre.

Fora meus compromissos profissionais, ainda tinha um casamento para ajudar a organizar. Seria mais simples se Santana não fosse tão enjoada. Tinha que ser algo simples e elegante ao mesmo tempo. O preço tinha de ser razoável, mas que pudesse oferecer conforto. Estava osso encontrar um lugar com essas características.

Olhei para o relógio. Duas horas para o voo da minha esposa chegar. Havia dispensado Bena por hoje. Queria a casa vazia para te a liberdade de fazer amor no meio da cozinha caso essa fosse a vontade da minha esposa.

Tratei de me cuidar para receber Quinn como uma rainha. Preparei a cesta de frutas e a coloquei na mesa da sala. Tinha vinho na geladeira e uma bandeja de frios. Tomei um banho e coloquei uma lingerie provocante por debaixo de um blusão velho com estampa do Mickey Mouse. Fazia parte da graça e da fantasia. Roupas velhas aparentes, mas cabelos escovados e uma maquiagem de leve.

Depois de pronta, esperei pacientemente por minha esposa. Meu coração bateu forte quando escutei o barulho da chave na porta. Quinn entrou em casa meio atrapalhada com a bagagem. Fingiu sotaque inglês ao falar comigo e nos beijamos no meio da sala. Tomamos vinho, comemos um pouco de queijo e das frutas, em especial os morangos.

Quinn abriu um grande sorriso assim que ergueu meu blusão e viu a lingerie. Ela me comeu em cima da mesa de jantar. E depois fizemos amor tênue e erótico ao mesmo tempo na poltrona da sala.

"Sim" – ela sussurrou no meu ouvido enquanto eu descansava meu corpo cansado e suado contra o dela.

"O quê?" – fiquei confusa

"Eu te prometi uma resposta quando voltasse. Sim, eu topo."

Peguei no rosto da minha esposa e a puxei para um beijo molhado, cheio de paixão. Meu coração bateu forte com a idéia de que teríamos um filho. Fizemos amor mais uma vez.










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