Outubro 2019

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12 de outubro de 2019

(Santana)

Long Beach. Esse será o local do meu casamento. Pelo menos no que depender da minha irmã. Eu não sabia onde estava com a cabeça quando disse que ela seria a minha madrinha principal do meu casamento, aquela que assinaria com minha testemunha. Como ela estava com bastante tempo livre nesses dias e eu não, deixei ela tomar conta da organização das coisas. Some aí o fato de ela ter recebido a notícia de que não estava grávida depois de fazer a tal inseminação na Alemanha. Para não deixar a minha irmã entrar em depressão por conta disso, larguei o trabalho todo nas mãos delas para ver se ela mantinha a mente ocupada. E para quê? Para ter mais dor de cabeça em ligações diárias sobre minha opinião disso e daquilo. Só não dava carta branca total para Rachel e lavar minhas mãos porque correria o sério risco de eu chegar na hora de me casa e me deparar com uma festa e produção que me daria raiva.

“As fotos desse lugar são lindas, Santy. O jardim é perfeito. Você pode se casar no jardim se quiser. Vai ter vista para o mar.”

“Você viu alguma foto desse jardim após o inverno para saber se ele estará inteiro para abril?” – desafiei.

“Um lugar sério certamente vai ter tudo isso muito bem cuidado.”

“Claro...” – mantive meus olhos na estrada enquanto Brittany e Kurt davam risadinhas da minha discussão com Rachel no banco de trás.

Ao menos Quinn não veio conosco para ser mais uma a rir da minha cara. Ela tinha o lance do filme para montar e editar. Johnny, numa coisa que nunca imaginei acontecer na minha vida, estava em casa servindo de babá para Robert. Hilário por um lado, grandioso por parte de Johnny se for pensar bem. Eram coisas assim que só me fazia amá-lo ainda mais.

“Vire à esquerda, Santy.”

“Eu estou vendo o GPS.”

“Não deveria. Você é a motorista.”

“É você é uma navegadora irritante. Se a gente tivesse pego a direita lá trás, teríamos cortado caminho.”

“Desde quando você é uma expert em Long Beach?”

“Johnny e eu gostamos de vir aqui, ou você se esqueceu? É você que tem nojinho de praia e morre de medo até de molhar as patinhas no mar.”

“Patinhas?” – Brittany repetiu e tentou sem sucesso suprimir uma risada. Kurt a acompanhou.

“Está bom, falo mais nada” – cruzou os braços e virou a cara – “Aliás...” – a trégua não durou nem um segundo – “Se você gosta tanto de Long Beach, porque está relutando em se casar aqui.”

“Você já viu o preço do aluguel do lugar?”

“E daí? Você ganha um milhão de dólares por mês.”

“Mas Johnny não.”

“Ele supera.”

“Quinn já superou?” – rebati e Rachel não respondeu – “Há!”

“Isso não quer dizer que você não possa fazer um casamento bonito.”

“Isso não quer dizer que eu não possa fazer um casamento bonito e sem gastar muito dinheiro.”

“Entendi!” – ela esbravejou – “Mas já que estamos aqui e marcamos um horário para estarmos aqui, será que dá para você ao menos conhecer o lugar?”

Maldita seja Rachel Berry-Lopez, filha da minha mãe e do meu pai. Quando chegamos ao tal hotel especializado para acolher eventos como casamentos, deparamos com uma construção de dois andares linda, com pinceladas coloniais na arquitetura do edifício. O jardim já sofria as intempéries do inverno e havia uma tempestade se aproximando nos próximos dias, mas assim como houve tantas outras e o lugar continua ali, de pé, e próximo do oceano, talvez precisasse dar algum crédito. Estacionei o meu carro no estacionamento de cimento e britas meio soltas. Disse para mim mesma que se fosse fazer um casamento tão próximo ao oceano, que fosse no Hawaii. Mas ali estávamos em Long Beach, no hotel Imperium, a alguns passos da praia, encantada. Maldita seja Rachel Berry-Lopez por me conhecer tão bem.

“Bom dia, posso ajudá-los” – uma mulher loira com terninho preto nos recebeu.

“Bom dia, eu sou Rachel Berry-Lopez e estou a procura de Clarie Jackson. Temos um horário marcado.”

“Claro, é que estamos com um casamento para amanhã e há muitas pessoas circulando por aqui hoje...” – a moça divagou – “Vou levá-los a senhora Jackson.”

Fomos recebidas por uma moça que estava por volta dos quarenta e tantos anos, talvez tivesse mais com os inúmeros retoques plásticos que se faz hoje em dia.

“Senhorita Berry-Lopez” – a senhora Jackson foi direto na minha irmã para cumprimentá-la – “Como vão vocês?” – cumprimentou a todos nós rapidamente.

“É um prazer, senhora Jackson. A gente se falou por telefone, mas quem está interessada em conhecer o lugar é a minha irmã, Santana Berry-Lopez.”

“Oh, claro” – impressionante como a atenção dela voltou-se totalmente para mim em menos de um segundo. Vi que era uma profissional – “Então está com casamento marcado, senhorita Berry-Lopez?” – acenei – “Garanto que veio ao lugar perfeito para realizar a cerimônia e recepção. Estamos nos preparando para receber um casamento amanhã, o que é perfeito para mostrar a dinâmica de nossas instalações. Poderia me acompanhar?”

A senhora Jackson mostrou todo o serviço de hotelaria disponível ideal para hospedar não só os noivos e padrinhos como parentes que venham de outras partes do país. O buffet é de uma companhia que tem contrato para explorar o local e não é negociável uma coisa sem outra. Como poderíamos almoçar no restaurante do hotel, como parte da cortesia de degustação, isso não seria um problema. O hotel também auxilia nos serviços de cerimonial, e deixa à vontade para contratar outras empresas de decoração da capela e do salão. O local era maravilhoso também internamente. A capela ecumênica tinha capacidade para 150 convidados, mas havia a possibilidade de realizar o casamento no salão ou na área externa caso houvesse mais convidados. De qualquer forma, o meu casamento seria realizado por um juiz de paz porque sou judia e Johnny não se converteu.

O casamento que aconteceria no fim de semana estava sendo arrumado no jardim, com direito a coreto para os noivos, palco para banda e uma visão privilegiada. Rachel prestava mais atenção nos detalhes técnicos do que eu. Estava pensativa e em conflito se valia à pena mandar o plano de um casamento simples e bonito para o esgoto para ceder as maravilhas e confortos de um lugar de luxo.

Por último, almoçamos no lugar no esquema de degustação dos vários pratos que poderiam ser servidos na festa de casamento. A senhora Jackson sempre estava à nossa cola nos mostrando tudo. Pelo que senti, ali era mesmo um serviço customizado uma vez que o local era caro demais para atender qualquer um. A comida era boa, isso era inegável. Ao que entendi, o local era explorado pela equipe de um famoso chef de Manhattan.

“O pacote pelo fim de semana incluindo a reserva de 20 quartos com os serviços básicos fica por apenas 750 mil dólares. É uma pechincha.”

Eu vi quando Brittany e Kurt arregalaram os olhos, o que me deixou acanhada. Era um valor que estava fora da realidade de ambos e até mesmo de Johnny, apesar de ele estar comigo. Esse dinheiro não era problema para mim. Tratava-se de uma questão ética. Eu queria fazer um casamento para mostrar aos outros o quanto eu tinha dinheiro ou fazer do momento algo sobre mim e Johnny? A própria Rachel se casou num lugar simples e arrumadinho em Manhattan para pouquíssimos convidados com direito a contrato de sigilo que implicava numa multa milionária caso alguém quebrasse.

“É um bom preço” – comentei e sorri sem graça. Rachel apertou minha perna debaixo da mesa com receio de que fosse adicionar um comentário ácido.

“Tenho certeza que é um orçamento à altura de uma diretora de uma grande empresa, senhorita Berry-Lopez. Aliás, como sua família é abençoada. Sua irmã comentou que o pai de vocês é cirurgião, correto? E a sua mãe é professora universitária? Deve ser uma felicidade estar numa família de tantos talentos.”

“Claro. Tenho muito orgulho de todos” – mal sabia ela que tenho tanto orgulho do suor da minha família para conseguir vencer, além do meu próprio, que era um crime esbanjar. Sim, eu gostava da minha atual vida confortável em que nada me faltava. Mas era fruto de um trabalho duro, de um longo processo, de apostas que fizeram em mim, na minha capacidade – “O lugar é magnífico, senhora Jackson. É lindo de verdade. Tenho certeza que esse casamento de amanhã será um sonho de princesa que toda mulher sonha” – disse enquanto pagava a conta de Brittany e Kurt, que não foram inclusos no banquete de degustação – “Eu vou te dar uma resposta até o início dessa semana.”

Nós quatro entramos no carro e eu contei até dez até que a explosão de comentários tivesse início me três, dois, um.

“Você precisa fechar negócio, Satan” – Kurt disse deslumbrado – “O lugar é um paraíso e tenho certeza que até o seu noivo de alma hippie vai gostar” – revirei os olhos.

Kurt tinha mania de se referir a Johnny como hippie e tinha certeza que era ele fofocava com Finn a respeito da nossa vida em Nova York. Não era segredo para ninguém que às vezes Johnny puxava uma erva e eu também. Hoje em dia bem menos do que antes. Além disso, o estado de Nova York faria um plebiscito para legalizar ou não o consumo que já é liberado em quatro estados. Ainda assim, o babaca do Finn tinha o disparate de chamar o meu Johnny de drogado, como se ele fosse a pessoa da mais alta moral.

“Eu não sei...” – Brittany ponderou – “Lembra de quando a gente discutia como seria nossos casamentos dos sonhos? Você dizia que iria se casar na praia a luz de tochas e ao som de um violão e de um ukulele.”

“E você vivia dizendo que gostaria de se casar no castelo da Cinderela na Disney” – olhei para Britt pelo retrovisor – “A idéia de casar na praia também agrada Johnny.”

“Claro que agrada!” – Kurt disse com o habitual desdém.

“Você sabe que não dá para fazer um casamento rústico” – Rachel reclamou.

“Por que não?” – questionei – “Aposto que você, Quinn e nossos pais e amigos mais próximos ficariam muito felizes em ir a festa de casamento no Hawaii e ainda aproveitar para tirar alguns dias de folga num lugar paradisíaco.”

“E no final das contas você gastaria quase a mesma coisa do que se fizesse aqui” – Rachel não sabia dos valores exatos, só estava chutando.

“Não vai me dizer que você não ia gostar de organizar o meu casamento do Hawaii e ainda por cima aproveitar para ficar com a sua esposa numa praia sem paparazzis por perto?”

“Não haveria paparazzis na festa do seu casamento.”

“Mas haveria um monte de empresários chatos.”

“Organizar um casamento no Hawaii é uma insanidade, Santy!”

“Ninguém disse que você precisa fazer isso sozinha. Eu vou ajudar. Além disso, você não tem aquele seu colega que trabalhou contigo na série que mora lá?”

“Sim, o Wilson Romanov mora seis meses aqui e seis meses lá com a esposa e filhos. Ele e a esposa tem um restaurante em Honolulu. Santy, isso é loucura. Vai ser uma festa de casamento cheio de improvisos e você não está sendo racional.”

“Eu ao quero um casamento para convidados, Ray. Eu quero um casamento para eu e o Johnny e para pessoas próximas. O lugar aqui é lindo. O buffet é de primeira linha, mas não acha que isso será um casamento para ser mostrado para outras pessoas, com convenções demais?”

“Ok, eu vou ver o contato com o Romanov.”

“Essa é a minha irmã.”

“É isso aí, Rach!” – Brittany comemorou batendo no ombro de Rachel.

“Não acredito nisso” – Kurt estava inconformado – “O que aconteceu com a Satan que estourou o cartão de crédito dos pais em roupas de grife?”

“Deixou de ter 16 anos” – respondi.

Rachel deu um tapinha na minha perna. Apesar de tudo, apesar de toda ocupação que eu joguei na cabeça dela, sabia que minha irmã estava orgulhosa com a minha decisão. Eu iria me casar com meu Johnny de um jeito simples no Hawaii ouvindo o barulho das ondas do mar e ao som de um violão e de um ukulele. Olhei para Brittany pelo retrovisor. Era uma felicidade tê-la ali não apenas para me apoiar, como também para me lembrar que certos sonhos juvenis valiam à pena serem resgatados.













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