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ISABELA SOUZA;

Se aproximava das três horas da manhã. Estava na sacada de Agustina, minha melhor amiga, a qual havia sumido durante toda a noite, ou melhor, eu não sabia de seu paradeiro. Em momentos como esses, era bom frisar.

Não me sentia solitária, muito pelo contrário, um turbilhão de pensamentos me rodeavam naquele lugar. Pensamentos estes que atormentavam minha mente, a qual não conseguia — por nem sequer um minuto — ficar sem pensar no ocorrido. Ainda não havia entendido o que de fato aconteceu. Tudo parecia tão diferente do "normal". Do nosso normal. Éramos diferentes daquilo. Pelo menos, eu achava.

Contudo, num piscar de olhos, todos viramos criminosos.

Criminosos. Ouvir essa palavra, mesmo que apenas expressa por uma voz na minha cabeça, foi suficientemente torturador. Foquei minhas atenções em controlar meus batimentos que pareciam mais fortes do que nos dias que acreditava serem os piores de meus curtos vinte e dois anos vividos.

Nem quando o Cruzeiro perdeu o pênalti tão importante naquela final, me senti assim. Como poderia comparar isso? Não tem comparação! 24 de junho sem dúvidas, era o pior dia da minha vida.

Apenas admirava a paisagem tentando, ao máximo, sentir a brisa leve e suave do lado fora. As árvores, balançavam como se estivessem em uma dança. Pude ouvir o som do vento e a beleza que havia ao redor. Antes, nunca havia reparado nos detalhes ali presentes.

— Que vista! — disse à mim mesma enquanto puxava mais um pouco de ar fresco buscando desacerbar minha respiração.

As estrelas pareciam me abraçar, a lua estava brilhando como nunca antes. Da varanda, percebia o movimento da principal rua de Buenos Aires, olhava com muita atenção os bares que estavam em meu campo de visão. Eles iam se esvaziando aos poucos. Bem lentamente. O soprar da natureza batia em meu rosto, de um jeito delicado e confortador, parecia me dar um recado. Um recado dizendo que depois daquela noite, nada mais seria igual.

A cada minuto que passava, os barulhos de sirenes aumentavam, até ter sido tirada do transe com um toque conhecido em meus ombros. De um jeito leve, para que não me assustasse visto minha crise interna, ele dirigiu-se até mim.

— Isa? — falou em tom sutil demonstrando preocupação.

— Oi — respondi seca, porém fazendo um grande esforço para cuspir a curta palavra que não queria sair de meus lábios.

Ainda me encontrava de costas contemplando o máximo de detalhes junto com os pensamentos que me deixavam imóvel.

— Eles querem te interrogar agora, você precisa ir. É a única que falta. — meu mundo acabava de ser totalmente destruído com as poucas palavras pronunciadas por ele.

— 'Tô indo! — respondi em um fio de voz. Não por querer, e sim por não encontrar forças para dizer qualquer frase de forma convincente.

Notando isso, inspirei fundo e virei vagarosamente, reconhecendo, enfim, o rosto com quem falava. — Avise para os investigadores que já estou indo. — dessa vez, falei firme e determinada, pois, de acordo com os poucos filmes policiais que havia visto, demonstrar medo ou pânico poderia me incriminar.

Mas se fosse ao contrário? E se na verdade demonstrar medo provasse que sou inocente? Eu era inocente e tinha medo! O que deveria fazer? Entrar em pânico na frente de todos os investigadores, policiais, peritos e detetives que estavam lá, ou ser firme comprovando o ditado brasileiro que tanto ouvi de minha falecida mãe? Quem não deve, realmente não teme?

— Olha, fica tranquila, ok? — colocou as duas mãos em cada lado do meu rosto , direcionando meu olhar perdido de encontro com o dele. — Só diga o que combinamos e vai ficar tudo certo para todos. 

24 de JunhoOnde histórias criam vida. Descubra agora