o corpo

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estou meramente, extremamente afadigado, exausto, consumido, moído, por ser o corpo que afaga pessoas mas que sempre está só.
eles sempre vem como se não quisessem nada, com boas intenções, com planos e futuros longos, futuros próximos, mas no final fazem o mesmo, me quebram. por me doar demais sofro demais. como se fosse errado ser intenso, ou será que só existe pessoas vazias?
sou o corpo usado por você, por ele, por aquele outro. o corpo que aceitou novamente que poderia existir uma possível reciprocidade, mas que no final saiu machucado, ulcerado, lesado, contusado, com hematomas que não se podem sair com gelo, com feridas que não podem cicatrizar com Bepantol.
porque sou o corpo que sente mais, o que chora mais, o que pede por colo, o que pede socorro, o que condiciona a felicidade antes mesmo de perceber. eu sou o corpo usado. e como deixo de ser? quem dera todos vocês viessem com a realidade descrita na testa, assim saberia a quem devo abrir as pernas, para não ser tão usado, para não ser tão adentrado, tão machucado, tão dolorido.
e eu nunca quis ser esse corpo, queria ser cobra para renovar minhas peles para haver algum ano, algum mês, algum dia em que suas mãos não tenham percorrido pelo meu corpo, com sinais de boas intenções, com sinais de alguém que quer ficar, mas ao invés disso sobe o zíper da calça e some, some pra bem longe de mim, pra tão longe que mal posso acompanhar, enxergar.
mas, então, me reconstruo para o próximo, na esperança que esse faça doer menos, que não me prometa as estrelas do céu, que não me esqueça numa janta ou na frente do trabalho, que não transe comigo como se eu fosse apenas um pedaço de carne, que não seja mais um.
porquê eu sou o corpo que afaga todos, mas nunca fui o corpo que fui afagado.

LIMÍTROFE: para você que sente demais.Onde histórias criam vida. Descubra agora