Eileen
- Estamos muito satisfeitos com a sua dedicação Eileen, mas precisa de descansar. Ir para casa ao final do dia e deixar o trabalho cá, pode fazer isso? - Assenti.
Após os últimos três dias a sair mais tarde, recebi um aviso do meu chefe. Um homem com os seus quarenta e oito anos, com uma carreira impressionante como advogado em Espanha, o homem que nunca perdeu um caso.
Era também um abrande grande amigo da família, que manteve o meu pai são, quando se separou da minha mãe e esta foi para Portugal e levou a sua querida filha.
Daí a facilidade em conseguir o estádio, embora sendo bastante duro manter-me nesse, pois seria tudo mérito meu.
Tal como fazia sentido.
Agradeci-lhe pelo conselho, por se preocupar e garanti que ia tomar mais atenção.
Sabia o que tinha acontecido e o porquê de estar a viver com o meu pai, após cinco anos de separação. Mesmo com várias visitas, desta vez era permanente. Infelizmente pelo motivo, mas o meu pai estava feliz.
E honestamente, senti falta de Espanha.
- Não te esqueças que tens vinte e um anos, minha querida. E uma vida pela frente, por isso Eileen, não a desperdices.
Mantive-me em silêncio.
- Por muito difícil que seja ouvir o que te vou dizer, precisas de te lembrar. Pensa na tua mãe e lembra-te que as suas escolhas, foram por ti e a pensar em ti. - Murmurou baixo.
- Só quando estou a estudar os casos, é que consigo desligar do que aconteceu. Fora isso, é só nela que penso.
Baixei a cabeça, sentindo-me vulnerável.
- Compreendo o que dizes. Mas não é o trabalho que vai apagar o que aconteceu com a tua mãe. Contigo. Mas podes viver, tal como foi o plano da Eleonora.
Lágrimas ardiam nos meus olhos, embora não querendo mostrar fraqueza.
- Pensa nisso. Descansa, sai um pouco no fim de semana. Precisas e mereces. Já mostraste as tuas capacidades.
- Obrigada Sr. Garcia pela oportunidade. E por ser tão sensível com a situação.
Afagou o meu ombro, saindo do escadório.
Respirei fundo, deixando escapar todas as lágrimas que segurava. Encostei a porta, fechei as persianas e sentei-me de novo. Passei a mão pelos meus cabelos, prendendo-os. As lágrimas insistiam em desligar, de tanta frustração e por ter resistido durante a conversa.
Estava exausta, ainda mais que no dia anterior, visto que pouco tinha dormido.
Receava fechar os olhos, pois tudo remetia para a noite infernal que vivi. Revivia sempre o momento em que a via com a arma nas mãos e o corpo a cair inanimado.
Foi um único tiro. No coração. Certeiro.
Não a julgava pelas suas ações, nunca. Pelo contrário, não merecia estar presa, por nos ter salvo daquele inferno.
Prometi que não a ia visitar, embora me arrependesse todos os dias de o ter feito. Antes de viajar para Espanha, visitei-a. Dez dias após estar presa. Expliquei-lhe que ia ficar junto do meu pai, para criar Constança.
Jamais iria conseguir sustentar-nos. Para além que tudo se soube na vizinhança.
Precisávamos de um recomeço.
- Pai, estás em casa?
- Na sala de jantar! - Elevou o tom. - Chegaste mesmo a tempo! - Ao adentrar na divisão, só vi a minha irmã coberta de pizza. - Anda, senta-te e come uma fatia de pizza!
Parecia mais animado que no dia anterior.
Estava bastante grata por ter aceite a pequena de quarto anos, mesmo não sendo filha dele. O seu coração era demasiado puro.
Como condenar uma criança? Esta igualmente pura e com um coração enorme.
- Falei com o Garcia.
- Sim, imagino o que te disse. Prometo que vou ter mais cuidado na próxima semana. - Disse, a querer fugir a outro sermão.
- Porque não ligas ao teu primo? Ele anda nuns ambientes meio malucos, mas fazia-te bem! Ou então á tua amiga Nádia, tenho a certeza que te vai querer ver. - Sugeriu.
- Vou pensar nisso. Mas hoje não, talvez amanhã. Preciso de tentar descansar. - Levei a pizza á boca, saboreando-a.
- Acho que fazes muito bem.
Concordei com ele, sentindo o ambiente leve e bastante acolhedor e familiar.
Encarei a pequena á minha frente.
O seu sorriso enchia-me o coração. Ela era, sem dúvida, a minha força. O motivo pelo qual me levanto todas as manhãs e me mantenho sã, depois de tudo. Apesar de todo o mal que fez à minha mãe, deu-nos uma criança maravilhosa pela qual vou estar sempre grata.
Infelizmente a minha mãe não a pode ver crescer, no entanto, prometi certificar-me que a Constança cresce a saber tudo sobre ela e que nos protegeu sempre.
Apesar de ter a certeza que se lembra. E que vai sempre recordar aquela noite também.
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BALANCE ➛ ARON PIPER
Teen Fiction'O frio da tua alma, apagou a chama que há em nós'