Capítulo 30

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Ando rápido pelo corredor, tropeçando nos próprios pés e com medo de olhar para trás. Sem ter muita certeza se ainda estou aqui, se o que aconteceu, aconteceu, ou foi imaginação. A visão girando. O chão para cima e o teto para baixo. Apoiando-me pelas paredes sigo para frente, as luzes do dia nublado lá fora entrando pela janela no final do corredor. Tateando a superfície, chego a uma maçaneta e a giro. A porta se abre com o meu peso e quase caio para dentro do quarto. No interior dele, Jesse dá um salto, ficando em pé. Eu tento me equilibrar. Nós ficamos nos encarando, paralisados. Olho rapidamente para a bancada ao seu lado, carreiras de pó branco sobre o mármore.

"Aconteceu alguma coisa?" Jesse pergunta. Ele se coloca entre a bancada e mim, bloqueando minha visão. Funga algumas vezes e me olha de cima a baixo.

Sem dizer nada, olho para ele por instante. Parece mais calmo agora que antes, mas a aparência ainda está uma bagunça. Percebo também que suas pupilas estão estranhamente dilatadas. Felizmente as íris continuam da mesma cor. Com a mão trêmula, subo meus cabelos, expondo a pele do pescoço. O ar frio causando-me arrepios, as marcas de dente ainda doendo e sangrando.

Ele fica rígido no mesmo momento, o olhar muito sério. "Meus Deus!" exclama, arqueando as sobrancelhas. "Ele fez isso com você?" Dá alguns passos em minha direção. Ele analisa demoradamente as marcas com o cenho franzido.

Apenas balanço a cabeça, soltando os cabelos, ainda sem confiar em minha voz para falar.

"Eu vou resolver isso agora," ele diz, esquecendo-se do pó na bancada e correndo para a porta ainda aberta. Seus passos enfurecidos ecoando por toda a casa.

Quando ouço a porta se fechar atrás de mim, meus joelhos cedem e eu caio no chão. As lágrimas começam a rolar. Uma por uma até se tornar uma torrente. Já não consigo ver mais nada a minha frente, minha visão está encharcada.

A imagem de seus lábios manchados de sangue não sai da minha mente. A dor. O sangue. Os minutos intermináveis. O olhar vítreo. As palavras estranhas. O toque frio. Logan que prometera nunca me machucar. Logan que dissera jamais faria qualquer coisa contra mim. Logan que nunca provaria uma gota do meu sangue. Fez todas essas promessas e no fim não cumpriu nenhuma delas. Queria acreditar que ele está sob o controle de alguém como ele mesmo me disse uma vez, mas e se não estiver? E se for como Bern falou, que ele mente? E se ele só fez o que sempre quis fazer desde o início, beber o sangue "encantado"?

Abraço meu corpo soluçando. O chão parece mais frio e duro do que deveria. As marcas ainda doem e as lágrimas não vão parar.

***

"Logan deixou isso para você," Eleanor diz, sem tirar os olhos do quadro.

Olho para baixo. Sobre o meu livro de química ela deixa um bilhete, um pequeno pedaço de papel dobrado. "Obrigada," respondo. Pego o papel também se desviar o olhar da professora e amasso-o sem ler, guardando a bolinha de papel no bolso.

Desde o tal acontecido que eu prefiro nem pensar sobre, tenho fugido de Logan. Eu tento passar despercebida na escola. Chego atrasada em todas as aulas e sou a última a sair delas para não correr o risco de encontrá-lo no corredor. No intervalo, eu almoço todo dia num lugar diferente e escondido. E eu ignoro todas as mensagens que ele manda. Meu único empecilho é a aula de educação física, não sei por quanto tempo posso fingir mal estar para não participar delas e assim não ter de vê-lo. Mas o quanto eu puder evitar, melhor.

"Ele também disse que gostaria de falar com você hoje depois da escola," ela sussurra.

"Então diga a ele que eu não posso. Lisa e eu temos um trabalho." É claro que é uma mentira, mas Eleanor não precisa saber do real motivo que me faz não querer nunca mais vê-lo. "Vamos nos encontrar na biblioteca depois da aula."

"Lisa?" Ela franze o cenho e dá uma olhada rápida em mim antes de voltar a encarar a sra. England.

"É."

Uma expressão de preocupação toma conta de seu rosto, e eu me pergunto se disse alguma coisa de errado. "Então você não sabe?" ela pergunta.

"Saber o quê?" Agora é minha vez de franzir o cenho.

Ela dá uma rápida olhada na sra. England e então volta a sussurrar. "Ninguém sabe onde ela está."

"Como assim?" Percebo falar mais alto do que gostaria. A sra. England olha em nossa direção, mas não diz nada, e volta a sua explicação. Nós duas ficamos paralisadas até ela desviar o olhar.

Com o olhar fixo na frente da sala, Eleanor responde baixinho, "Ela simplesmente sumiu."

"Espera. Quando?"

"Se você falasse com alguém além do seu grupinho talvez soubesse." A forma como ela diz soa como uma repreensão. Eu sei que as pessoas da escola, apesar de todos eles serem encantados pela aparência de Lindsay, ainda não gostam muito dela e de seus amigos por eles não se 'misturarem'. O único que pareceu ser um pouco mais sociável foi Logan. Mas o único interesse dele nos humanos era puramente para descobrir qual deles era o descendente de Anthony. Então, depois de me encontrar, ele não deu uma segunda olhada neles. Acho que um lugar tão sedento por fofoca se sente um pouco aborrecido por não conseguir arrancar nenhum podre deles. Mas se eles soubessem o verdadeiro motivo de todo o mistério e isolamento, talvez evitassem ficar perto deles. "Dizem que foi depois de ir a uma festa. Os pais falaram que ela foi e não voltou mais... É ainda mais engraçado pensar que a festa era justamente da Lindsay." Ela apoia o rosto em sua mão esquerda.

"O que você quer dizer com isso?" pergunto, deixando escapar um leve tom de irritação na voz. Apesar do que aconteceu entre Logan e mim, eu ainda prezo pelos outros e não gostaria de que começasse a surgir boatos os acusando injustamente. "Acha que Lindsay tem alguma coisa a ver com isso?"

"Não estou dizendo nada." Ela passa os dedos em volta de uma gravura em seu livro de química. "Mas você tem de admitir que é estranho. Ninguém sabe nada sobre ela... ou sobre o irmão e os amigos dela... alguns acham que eles participam de uma seita... e que você entrou para ela." Ela ri discretamente sem tirar os olhos da lousa.

"Eu posso garantir que nada disso é verdade." Eu rio junto. "Nem a seita, nem ela ter a ver com o desaparecimento." Será que posso mesmo? Eu sei que Lindsay e os outros não fariam nada do tipo, mas e Logan? Ainda não sabemos o que ele fazia no momento que Carolin desapareceu naquela sexta depois da escola e, desde o acontecimento no sábado, não é difícil de imaginá-lo atacando outro humano... 'Atacando'. Nem parece que é sobre o mesmo Logan de algumas semanas atrás. Talvez eu devesse dar ouvidos a Bern. Vampiros são traiçoeiros, e eu mal conheço Logan. Talvez ele fosse capaz de tudo isso e muito mais, e eu apenas não quero acreditar. "Mas ninguém realmente sabe de nada?" pergunto, agora séria.

O sorriso nos lábios dela morrem, e ela diz, "É o mesmo que aconteceu com Carter: sumiu sem deixar vestígios e ninguém sabe o que aconteceu."

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