Olho para a casa do outro lado da rua, e ela olha de volta para mim. É suposto que não haja ninguém lá. Todas as portas e janelas estão fechadas e não há nenhum carro na garagem. No entanto, tenho a impressão de ver uma leve movimentação na cortina de uma das janelas do andar superior.
"Você está me ouvindo, Sophie?" Abigail passa a mão na frente de meu rosto, tentando chamar minha atenção.
"O quê?" digo, desviando meu olhar para ela. Abigail está olhando para mim, séria. Não deixo de me impressionar com sua beleza. Hoje, seu cabelo crespo está destrançado e ela usa um batom escuro que realça o formato de seus lábios. Bernard disse que o vampirismo os torna mais atrativos aos olhos humanos, mas tenho certeza de que antes de ser transformada, ela já era muito bonita.
Nunca tive a oportunidade de trocar mais do que umas poucas palavras com Abigail, tudo o que sei sobre ela foi o que Anna me contou. As três — Anna, Emily e Abigail — são amigas desde a infância e faziam tudo juntas, inclusive se tornaram vampiras juntas. Um dia estavam num carnaval, e Abigail iria se encontrar com um garoto da escola. Anna e Emily tinham vindo junto para dar apoio. Enquanto elas aguardavam o rapaz, conheceram um cara misterioso e de aparência curiosa. Eles conversaram e riram bastante, inicialmente. Anna não soube explicar, mas disse que era como se o garoto tivesse um encanto magnético sobre elas. Era impossível desviar o olhar dele ou negar seus pedidos. Um desses pedidos fora que elas o acompanhassem até um lugar afastado do festival. Como ele disse, queria um lugar silencioso para conhecê-las melhor. Nenhuma delas se importou, pois as três já estavam completamente encantadas por ele. O garoto não era ninguém menos que Bernard. Depois de ficarem sozinhas com ele, Anna diz não se lembrar direito do que aconteceu. As coisas começam a ficar nubladas em sua memória. Apenas recorda-se de amanhecer numa praia ao lado de Emily e Abigail com a garganta queimando de sede e um machucado no pescoço.
"Eu estava te contando que-" ela começa a dizer. "Esquece. O que você tanto olha?" Ela segue meu olhar.
Sem tirar os olhos da janela, respondo, "Não tem a impressão de estar sendo observada?"
Ela franze o cenho e intercala o olhar entre mim e a casa do outro lado da rua. "Não...? Acho que o episódio de terça esteja te afetando."
Penso em contradizê-la, mas desisto antes de abrir a boca. Em vez disso, digo, "Talvez." Não desvio o olhar da janela. Não consigo me livrar da sensação de estar sendo vigiada.
"Não se preocupe." Sorri para mim, exibindo seus dentes brancos. Tenho a visão de seus caninos pontudos, e é tão estranho. Eles parecem deslocados em relação ao resto do rosto. Como se Abigail nunca pudesse ser uma criatura assassina que toma sangue para sobreviver. A energia dela é totalmente oposta à de Anna, que é selvagem e temperamental. "Vamos protegê-la."
Estamos de volta ao casarão do Charlotte. Como no domingo não tivemos tempo de inspecionar o local, Logan decidiu voltar aqui e checar se Lisa não havia deixado alguma coisa na casa que pudesse nos ajudar a entender o que está acontecendo. Depois que lhe demos a cura e a deixamos em um lugar seguro, ela foi encontrada e felizmente está bem. Mas ainda não apareceu na escola. Tudo o que sabemos é que ela não se lembra de nada.
Não há qualquer utilidade eu estar aqui com eles, mas Logan decidiu que enquanto meu pai — e consequentemente o crucifixo — não estivessem próximos, é melhor que eu fique com eles. Ele acredita que seja mais seguro assim. Apesar de eu ainda me sentir um pouco insegura em relação a Logan, não discordei de sua ideia. Para o meu alívio, nunca estou sozinha com ele. Sempre há mais alguém. Eu sei que pelo tempo em que houver pessoas atrás de mim e eles estiverem me protegendo é impossível evitá-lo, mas isso não me impede de tentar mantê-lo longe. Também sei que nunca conversamos sobre o que aconteceu, porém, às vezes penso que eu nem quero isso.
Um vento frio sopra, e eu me encolho no meu casaco. Quando chegamos aqui, decidi ficar do lado de fora da casa porque, em parte, ficar vagando por aqueles corredores enormes e escuros me causa arrepios e, em parte, não queria atrapalhar ninguém. Mas agora estou me arrependendo de minha escolha.
"Vamos subir," Abigail diz ao me ver tremer e segue porta adentro. Eu apenas concordo, mas não deixo de olhar uma última vez para a casa. Enquanto me viro para a porta, tenho a impressão de ver um borrão passar pela janela. Infelizmente é rápido demais, e eu não tenho certeza se foi real ou apenas minha imaginação. Penso em dizer alguma coisa a Abigail, mas ela já se foi.
Subimos pela escada ainda intacta e seguimos por um corredor sem iluminação e vazio em direção a um quarto na ala leste da casa. Nem uma de nós fala qualquer coisa durante o trajeto, tudo que tenho é as costas de Abigail a minha frente. Apesar de todo o meu medo de Logan, dela não tenho nenhum receio. É difícil imaginar uma criatura tão delicada bebendo sangue.
Sangue. A imagem me faz levar a mão até meu pescoço. As marcas há muito já se foram, mas é impossível esquecê-las.
Quando chegamos ao quarto, encontramos Logan sentado numa cadeira próxima de uma escrivaninha no centro do cômodo, encarando com a testa franzida uma pilha de papéis. Emily está em pé ao lado dele igualmente intrigada com as anotações.
"Encontraram alguma coisa?" Abigail pergunta parando na frente da escrivaninha e olhando para a bagunça de papéis sobre o tampo.
Logan larga a folha que está segurando e diz, "Apenas notas com números e contas sem especificar para que são." Ele pega um papel e o alcança para Abigail. Ela aceita-o. "E esses documentos de uma casa em Pittsford."
Abigail baixa os olhos para o documento e então, após ler algumas palavras, comenta, "Tem um endereço aqui."
"Sim," ele concorda. "Estava pensando em ir até lá."
"Vocês não têm medo do que podem encontrar lá?" digo. "Quero dizer, aqui, naquele dia, estava cheio de vampiros. E se encontrarem coisa do tipo, ou até pior?" Olho para cada um deles com uma expressão de preocupação.
"É um risco que corremos," pela primeira vez Emily se manifesta. Ela olha para mim com seus olhos verdes penetrantes. Depois de um tempo, começo a me sentir desconfortável e baixo meu olhar para o chão. Os outros dois não dizem nada.
De repente o celular de alguém começa a tocar. Imediatamente Logan tira o seu do bolso e olha para a tela por um tempo antes de atender. Ele troca algumas palavras com a pessoa do outro lado da linha e logo finaliza a chamada. "Tenho novidades," ele anuncia, e nós três olhamos para ele em expectativa. "Meu pai disse que ele e Bram estão voltando para Rochester."
"Isso é uma ótima notícia," Abigail diz colocando a folha de papel sobre a escrivaninha. "Já sabe quando eles vêm?"
"Ele não disse," ele responde. "Mas parece que logo."

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BLOOD LOVER
VampirosSophie sempre se viu como vítima de estranhos incidentes. Perseguições; invasões em sua casa; pequenos acidentes que se transformam em cortes sangrentos. Nada disso seria um problema até ver sua vida em verdadeiro perigo numa estranha tentativa de a...