Capítulo 39

315 51 92
                                        

"Vocês acham que eu imaginei tudo isso?" pergunto. Intercalo o olhar de Jesse para Logan, esperando uma resposta. Os dois só olham de volta para mim, em silêncio.

A primeira coisa que eu fiz hoje de manhã depois de levantar foi correr checar a janela do quarto, e a parte mais estranha é que ela estava exatamente como havia deixado antes de dormir, trancada pelo lado de dentro.

As cenas da noite anterior já estão confusas em minha mente. Lembro-me de Bernard estar no meu quarto e exigir meu sangue. De discutirmos. Mas depois disso, as coisas estão distorcidas. Ainda consigo sentir o local onde a agulha esteve e ouvir a voz baixa dele dizendo como tudo ficaria bem. No entanto, não tenho nenhuma lembrança de ele deixando-me. Na verdade sequer lembro ter dormido. Só lembro de em um momento ser madrugada e, no outro, acordar com a luz do dia no rosto.

Depois de checar a janela, não perdi tempo e me vesti com pressa, logo saindo rumo à casa dos vampiros. Para a minha sorte, não tivemos aula nesta segunda, então felizmente uma preocupação a menos no dia. Luce novamente não gostou nada de me ver mais uma vez saindo para ir à "casa de Anna". Eu sei que estava saindo demais e que nunca mais conversávamos, mas com tanta coisa acontecendo, é difícil conciliar tudo. Eu tento não me importar, mas o olhar desapontado de Luce me fere.

Quando vim aqui, fui recebida por Jesse. Eu disse que tinha algo importante a dizer e por isso ele chamou Logan. Não sei por quê, mas parece que todos sentem uma necessidade de contar tudo o que acontece a ele. Como se realmente fosse o líder que ele pensa ser. Então, nós três nos sentamos na sala de estar e eu contei o que aconteceu na madrugada. Por mais que me doesse admitir que Bernard estava nos enganando esse tempo todo, não omiti nenhuma parte. E Logan me pareceu bastante satisfeito em ouvir sobre a confissão de Bernard tê-lo usado. Eu por outro lado me sentia cada vez mais idiota quanto mais contava.

Uma parte em mim se sente decepcionada e frustrada com Bernard. Ele era meu amigo, e eu confiava nele. Se ele está com as pessoas que querem meu sangue, isso pode significar que tudo não passou de atuação. Desde o primeiro momento que nos conhecemos lá na escola em Nova York até aqui. E eu não desconfiei de nada. Caí idiotamente como eles esperavam. Gostaria de dizer que o odeio e sinto raiva de tudo que ele fez, mas algo em mim não deixa. Eu ainda gosto dele, ainda não o desvinculei de sua imagem de amigo. E ainda há um sentimento de esperança. Como se ele pudesse voltar. Voltar e ser quem sempre disse que era. Meu amigo e humano.

"Eu acredito em você," Logan decide se manifestar. Ele passou o relato inteiro olhando para mim sem desviar o olhar, ouvindo cuidadosamente cada palavra.

"Eu não desconfio da história," Jesse diz, "Só é triste que o tínhamos o tempo todo conosco e não fizemos nada."

"Bram deveria ter vindo quando chamamos," Logan diz franzindo o cenho. "E temos que falar disso para ele também."

"Por que vocês dependem tanto desse Bram?" pergunto.

Os dois olham para mim ao mesmo tempo e então um para o outro, decidindo quem falar. Logan limpa a garganta e começa, "Porque tudo é plano dele. Nós só estamos ajudando e não fazemos nada sem sua permissão. Se dependesse de mim, talvez Bernard nem estivesse mais vivo." A ideia de Logan matando alguém, mesmo um vampiro, me faz arrepiar. Lembro-me instantaneamente do dia do jogo e suas roupas ensanguentadas. Mesmo que ele estivesse sob o controle de Bernard, ainda não sabemos o que ele fazia naquele dia, e eu tenho medo de descobrir.

"Mas o que Bram faria?" digo.

"Não sabemos," desta vez é Jesse quem responde. "Mas aposto que ele não deixaria Bernard fugir."

"E onde ele está agora?" Olho de Jesse para Logan.

Jesse para para pensar e então diz, "Ele está ocupado com alguma coisa no Oregon. Disse que talvez tivesse pistas importantes. Ainda está investigando lá. Em breve vocês se conhecerão."

***

Entro no sótão depois de Logan. Jesse já está do lado da cama observando Lisa desacordada. Em uma mão ele segura um frasco com o mesmo líquido azul e, na outra, um vermelho. O espaço permaneceu intocado desde ontem quando Lisa foi trazida para cá, até as cortinas que abri ficaram do mesmo jeito. Lisa também continua da mesma forma, imóvel. Sua pele sem cor e provavelmente fria lhe dão um aspecto cadavérico. Queria poder dizer que o movimento de sua respiração contrariasse esse fato, mas nem assim ela parece viva. Sua aparência é péssima, e aqueles círculos escuros em volta de seus olhos continuam presentes, como se ela vivesse em um eterno cansaço.

"Se ela não beber isso, nunca mais acorda?" pergunto ficando ao lado de Jesse.

Ele olha para Lisa e então para os líquidos em sua mão e diz, "Na verdade podemos deixá-la acordar naturalmente, mas sem previsão de quando aconteceria. Entenda que quando um feitiço é quebrado, a pessoa afetada precisa de um tempo para se 'recuperar'. Isso aqui só acelera o processo." Ele levanta o frasco de líquido azul.

"Tudo pronto, Jesse?" Logan pergunta parando ao meu lado. Eu dou um pequeno passo de distância, ficando mais perto de Jesse. Depois da revelação da noite anterior, eu não sei mais como agir perto de Logan. Não sei se é seguro ficar perto dele, ou se devo apenas manter distância independentemente das circunstâncias. A verdade é que eu não consigo me esquecer do que ele fez e talvez nunca mais me sinta confortável em sua presença.

"Sim," responde Jesse levantando os dois frascos no ar para o amigo.

"Vamos curá-la?" pergunto olhando para o líquido vermelho.

"É isso que vamos decidir agora," responde Logan sem tirar os olhos de Lisa. "Ou vamos acordá-la, ou fazê-la humana novamente."

"Não podemos fazer as duas coisas?" Olho para Logan.

"Esse é o problema," quem responde é Jesse. "Temos de decidir entre acordá-la e assim deixar suas memórias intactas, ou transformá-la em humana e fazer todos os últimos acontecimentos não se passarem de um sonho nublado para ela."

"Não vejo qual é o problema," digo. "Não dá mesmo para fazer as duas coisas?"

"O problema é que ou nós a acordamos e fazemos perguntas sobre Bernard e seus planos, e assim revelando nosso segredo; ou simplesmente lhe damos a cura e ela nunca achará nada disso real, e nós, sem respostas," Logan diz sem tirar os olhos de Lisa, a testa franzida em preocupação. "Nas duas opções vamos ter de dar a cura a ela, só que a que nos beneficia é perigosa."

"Hum," Jesse se manifesta, visivelmente pensando em alguma coisa. "Se a acordamos, teremos que ajudá-la em sua nova condição, talvez até convidá-la para se juntar a nós. Isso se ela quiser ficar assim. Talvez decida tomar a cura. Não fazer a vontade dela parece-me injusto. Mas um humano daqui saber o que nós somos também não me parece uma boa ideia."

"Qual é o problema de um único humano saber de vocês?" pergunto. "Eu sei de vocês e nem queria isso."

"A diferença é que de você nós precisamos," Logan responde. "Não sei se você lembra, mas eu tinha dito que, se pudesse, nem te envolveria nisso. Não tínhamos escolha. Era você ou seu pai. Bram te achou mais fácil de alcançar."

Na verdade eles tinham uma escolha: deixar-me em paz e nunca obter a cura. No fim não foi isso que aconteceu? Depois de tanto trabalho, nenhum deles conseguiu voltar a ser humano. A maldita cura simplesmente não funciona. Sei que Logan ainda tem esperanças, no entanto, eu fico cada vez mais descrente de que haja o que fazer. Mas não parece boa ideia falar isso em voz alta, então apenas digo, "Maldito Anthony."

"É," Logan diz, sorrindo. "Maldito Anthony."

"E então," Jesse olha para nós dois, "já decidimos?"

Logan fica sério e olha para Lisa. "Sim," ele diz. "Vamos curá-la."

BLOOD LOVEROnde histórias criam vida. Descubra agora