Capítulo 02

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Acordei com um terrível barulho de um cortador de grama ao lado de meu quarto, provavelmente deveria ser os vizinhos mais odiados por mim.
Despertei-me bocejando e coçando os meus olhos que estavam com um pouco de dificuldade para abrirem e em seguida, fui até a janela de meu quarto para conferir o que era aquele ruído insuportável.
E como disse, eram mesmo os vizinhos.

- Porra Sr.Rosa, você não tem nada para fazer além de acordar toda a vizinhança? - Gritei com a voz um pouco falha debruçada em minha janela.

- Que garotinha mais insuportável! - Ela disse na esperança de que eu não iria escutar e entrou para dentro de sua residência.

- Mais que mulher chata! - Sussurei e fechei a janela bruscamente.

Enrolei meus cabelos longos em um coque despojado novamente e lavei meu rosto.
Quando terminei, coloquei uma regata na cor preta e um shorts curto jeans.

Não queria descer até a cozinha, mais fui obrigada, pois estava morrendo de fome.

Desci às escadarias e encontrei meu pai, James Thompson com uma garrafa de vodka em uma de suas mãos sentado em uma cadeira.
Sem dizer nada, apanhei um copo de coloquei um pouco de café. Depois, retirei uma torrada da embalagem e passei um pouco de geléia.
Sentei-me na frente de meu pai e começei a comer com a cabeça abaixada.

- Onde estava ontem a noite? - Perguntou, rompendo o silêncio.

- Saí com alguns amigos.

- Perguntei onde estava, e não com quem. - Aumentou seu tom de voz.

- Em uma lanchonete. - Menti, tentando amenizar a situação.

Quando ele foi dizer algo, eu não me contive e tive que dizer o que estava me incomodando.

- Pai, você está bebendo novamente, já cedo?  - Perdi o apetite.

- Não Larissa, eu não estou bebendo.  - Falou, mesmo com uma garrafa de vodka em suas mãos.

- Não? Sinto o cheiro de bebida daqui.

- Porra que garota insuportável! - Levantou bruscamente da mesa.

- Calma! Eu não...

E antes de me deixar terminar a frase, apanhou meu braço fortemente, deixando uma marca vermelha.

- Você não tem nada haver com minha vida, entendeu? Além de ser imprestável quer ser minha mãe, onde já se viu! - Soltou-me.

- Eu só me preocupo com você. Será que pode ter pelo menos um pouco de empatia? - Uma lágrima começou a escorrer por meu rosto.

- Empatia? Você não é mais uma criança, já sabe se virar sozinha, posso beber à hora que eu bem quiser. - Deu um tapa forte em meu rosto.

Na mesma hora eu passei minhas mãos no local onde ele havia ferido. Meu coração começou a acelerar, lágrimas e mais lágrimas saíam de meus olhos e o que eu conseguia fazer era apenas tentar tomar aquele litro de vodka de suas mãos.

- Você está bêbado, não tem noção do que está fazendo. - Falei, aumentando meu tom de voz.

Ele apenas olhou para mim com seu olhar furioso e saiu, com suas pernas fracas e dificuldade para andar.

Eu tinha 16 anos quando minha mãe, Alicia Thompson, havia falecido por conta de uma grave doença que não possuía cura. Todos os dias nós íamos até uma unidade de tratamento e ela nunca apresentava uma certa melhora. Foi difícil ve-lá paralizada em uma cama, sem conseguir comer, falar e principalmente andar.
Até que um certo dia, seu coração parou de bater, o que já era esperado pelos médicos que à atendiam.
Passei vários dias e noites chorando sem parar com a falta de minha mãe. Ela havia me ensinado tudo, menos a viver sem ela.
E depois de 2 meses, meu pai começou a frequentar bares todos os dias, me deixando sozinha quase todas às noites. Eu já havia me acostumado, mais então ele começou a se tornar agressivo.
Sempre quando chegava, estava bêbado e não conseguia controlar sua força, descontando tudo em mim. Tenho cicatrizes, marcas roxas, vermelhas e hematomas em todo meu corpo por sua culpa. O que eu conseguia fazer era chorar e me defender com minhas próprias mãos, tentando fazer com que os impactos de seus tapas e socos forem menores.
E, ainda hoje, com 18 anos, eu continuo sendo seu saco de pancadas. Por isso saio quase todos os dias com meus amigos, para não precisar aguentar ser espancada por meu próprio pai e vê-lo nessa situação.

Havia combinado com Eliza para nós nos encontrarmos em sua casa, e foi o que eu fiz. Com a mesma roupa que estava no corpo entrei em meu carro e estacionei na frente de sua casa.
Mas, quando ia bater em sua porta e chama-lá, posicionei meu ouvido rente à  madeira e ouvi várias vozes, inclusive a sua, que cortou meu coração em pedaços.

- A Larissa? - Thomas perguntou.

- A própria. - Eliza respondeu. - Ela é uma menina que não bebe muito, não sabe nem fumar! Como poderá fazer parte do nosso bonde?

Naquele mesmo momento eu entrei novamente para dentro de meu carro e posicionei a cabeça ao volante. Chorei como nunca havia chorando antes. Porque tudo isso estava acontecendo comigo?
Era espancada praticamente todos os dias, e tentava escapar saíndo com os meus amigos, que agora, não eram mais meus amigos.
Se eu tivesse uma arma em meu carro atiraria naquele mesmo momento para acabar com todo aquele sofrimento, não sabia o quanto poderia suportar todo aquele peso que carregava em minhas costas.

Estacionei o carro novamente em minha garagem e quando desci, me deparei com várias roupas jogadas no chão. E só depois percebi que eram às minhas.

- O que está acontecendo aqui? - Gritei, fazendo com que meu pai escutasse.

Ele então, desceu até o meu encontro.

- Você vai embora daqui. - Falou, sem piedade alguma.

- Como assim? - Perguntei, sem entender nada.

- É isso mesmo que você ouviu. Estou cansado de escutar suas reclamações, e além de tudo você é apenas uma pessoa a mais para sustentar.

Aquilo foi o que mais acabou com meu dia, que já não tinha sido nada fácil.

- Mais sou eu que compro tudo! - Exclamei, com os olhos cheio de lágrimas e o rosto completamente inchado.

- Não me interessa Larissa, você irá sair daqui por bem ou por mal. - Apanhou um palito de fósforo e colocou fogo em minhas roupas.

Eu ajoelhei na frente de tudo, vendo todas às minhas coisas que eu batalhei para conquistar em chamas. Como meu próprio pai teve coragem de fazer aquilo comigo?
Resolvi que nunca mais seria à pessoa que era antes.
Eu estava sendo uma boa pessoa, e não recebia nem se quer um pouco de amor em troca, era tudo o que eu mais queria, um abraço de meu pai, já que nunca mais iria sentir o de minha mãe.
Então, para que ter um coração bom? Para às pessoas pisarem por cima de mim ou quebrassem meu coração?

Entrei dentro de meu carro e tentei ligá-lo, mas não tive sucesso, e mesmo que eu tentava acelerar, ele não se movimentava. Fui interrompida pelo monstro que habitava naquele homem que eu chamava de pai, e friamente ele me disse:

- Está sem gasolina. Acho que você precisará sair daqui sem ele. - Jogou a chave que estava em suas mãos para longe.

O meu carro, que eu suei tanto para tê-lo agora não estaria mais em minhas mãos.

- Eu te odeio com todas às minhas forças! - Gritei, o empurrando.

- Saía daqui! - Ele gritou devolta.

- Eu irei sair sim. Mais saiba que quando você estiver sozinho, e precisar de mim, eu não estarei aqui. Mesmo que você implore por minha ajuda, eu irei fingir que nunca te conheci. - Cuspi em seus pés.

Sai pelo enorme portão de "Minha casa" que agora já não era mais minha, e andei sem rumo naquela noite fria apenas com a roupa que estava no corpo.

Não tinha ninguém para me seder uma moradia. Tudo o que mais queria era me minha mãe ainda estivesse junto à mim, tenho certeza que ela nunca faria aquilo comigo.

- Mãe, se estiver me observando agora, por favor, me ajude! - Olhei para os céu estrelado com lágrimas nos olhos, sentada em uma calçada.

Às vezes, costumava conversar com ela, para tentar me livrar do medo, mesmo sabendo que eu não teria nenhuma resposta. E naquela fria noite, tudo o que eu mais implorei foi para que ela me protegesse para que nada de mal ocorresse comigo.

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