A transformação e o amor

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"E Julieta disse a Romeu: De que vale
um nome, se o que chamamos de
rosa, sobre outra designação teria igual perfume?".

- Romeu & Julieta - William Shakespeare.

A manhã de primavera se ergue de forma fria sobre Edimburgo, deixando o clima ameno levemente frio, dificultando a saída de algumas pessoas de suas camas, mas aquela regra não se aplicava a Jiang Cheng, não naquela manhã.

Posicionado na sacada do quarto de seu marido, trajando uma das blusas sociais do outro e um short de moletom qualquer, o Jiang olhava as ruas e os desenhos da cidade enquanto fingia os processar, mas seu olhar perdido era mais do que nítido.

Sentia o cheiro de café vindo da cafeteiria logo em frente, sentia o cheiro de primavera vindo da própria cidade e via aos poucos a neblina da manhã se dissipar, dando clara visão dos postes de luz de época se apagando lentamente, ao mesmo tempo em que o sol se levantava no céu. Um lindo cenário, mas não era suficiente para espantar seu mal pressentimento.

Quando o relógio marcou exatas 6:30 da manhã, o Jiang se levantou, olhando os lados e sentindo uma grande vontade de usar Zidian, como se precisasse se defender de algo ou alguém. Odiava sentir aquilo, porque a última vez que sentiu foi em uma caçada noturna ao qual os juniores foram sozinhos, quase não voltando vivos. Principalmente JingYi, que passou semanas de cama, se recuperando de um parasita espiritual. Quando levantou da cama de casal, tomando muito cuidado para não acordar o Lan no processo, sentiu um pico de energia ressentida fortíssimo, ocasionando um pulsar em seus ouvidos sensíveis e já frágeis pela forma como morreu, seu corpo arrepiou de imediato, tanto pela sensação ruim como pelo medo. Passou alguns bons minutos olhando o quarto e o mundo a fora pela janela, se sentindo observado enquanto estava naquela sacada, mas nada parecia suspeito aos seus olhos, ao mesmo tempo em que tudo parecia estranho.

Jiang respirou fundo, sentindo a paz voltando a reinar em seu corpo ao mesmo tempo em que a energia se dissipava. Sentia as brisas da manhã limpando o rastro de dor que a situação havia deixado, mas a ressalva permanecia, martelando sua alma e seu coração de que algo grande estaria por vir, apenas não sabia identificar se será algo bom, ruim, ou ambos. Também não sabia dizer quando aconteceria, mas iria e não demoraria muito.

Deitado na cama, Xichen olhava o marido de forma devota, destacando cada parte do homem em sua sacada como se ele fosse algum tipo de ser místico que se deu a chance de passar um dia com um mero mortal como ele. Os cabelos negros e curtos ondulavam com o vento, assim como a camisa social preta e consideravelmente amassada, além de quase dois números maior que o Jiang, as pernas cruzadas preguiçosamente durante seu sustento, enquanto o rosto do homem permanecia virado para a rua, observando o pequeno movimento da cidade.

Lan Huan sorriu genuinamente feliz.

Por longos vinte e seis anos, foi obrigado a acordar sozinho, com o mesmo sentimento de vazio em seu peito, assim como durante sua reclusão. Sentindo o peso do mundo e da depressão batendo em sua porta, após perceber que fora traído e que se tivesse prestado atenção em alguns detalhes, poderia ter evitado tragédias e injustiças. Nesse tipo de manhã, tudo que conseguia ver era seu marido passando pelo batente da porta do Hanshi, com as vestes roxas e com uma cesta de qualquer coisa comestível, com sua carranca e falando como Jin Ling e Lan JingYi o estavam enlouquecendo com fada e como tinha pena de Lan Shizhui, pois seu sobrinho estava a fazer malabarismos para controlar os primos mais novos para que não quebrassem alguma regra da seita Lan. Mas Jiang Wanyin nunca passava pelo batente de seu quarto quando ele tinha 17 anos, obrigando assim o mais velho a por um sorriso no rosto e se arrastar para fora da cama. Era deveras superficial e contrário a regra de sempre dizer a verdade, mas o que podia fazer? Ele não era tão confiante quanto o irmão, que sempre teve plena certeza de que acharia Wei Wuxian e também nunca chegaria aos pés de seu marido, que com pouco menos de 20 anos perdeu tudo e todos que amava, se tornou um líder de seita durante uma guerra, comandou e treinou um exército de homens e mais tarde cuidou sozinho de uma criança enquanto enfrentava o luto pelos irmãos e cunhado.

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