XIX

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Memories On -
Alec Covington

— Eles só contam as coisas superficiais. — Safira sorriu, perdida em seus devaneios. — Van Gogh estava caminhando na cidade de Arles, no sul da França. Ele avistou as margens do rio Ródano e maravilhou-se com as águas azuis cintilantes, e o contraste com as estrelas. Ele era iluminado pela constelação da Ursa Maior. E haviam dois amantes passeando.

Apesar de estar de fato interessado, e sinceramente, admirado com sua explicação, não consegui fixar minha atenção por muito tempo na história em si, muito menos na pintura a nossa frente. Meus olhos transitaram até seu rosto, e a pequena pinta que possui abaixo da orelha esquerda, na linha do maxilar. Aposto que ela mal percebe de tão minúscula, mas é um detalhe que guardo há anos.

— Van Gogh descreveu a cena como "um raro momento de calma nos caóticos anos finais de sua vida". — Finalizou, ainda virada para a frente.

— Uau... — Suspirei, voltando a olhar para a pintura. Ou tentando. — Isso prova que as estrelas realmente não conseguem brilhar sem a escuridão.

— "Eu não sei de nada com nenhuma certeza. Mas a visão das estrelas me faz sonhar." — Recitou. — Concordo com ele, as acho fascinantes.

Amo como sempre fala de tudo com tanta paixão e conhecimento. Isso sim é fascinante.

— É engraçada a forma como a qual olhamos para as estrelas e falamos sobre o quão bonitas elas são, mesmo já estando mortas. Acho que isso significa que a beleza em todas as coisas, é eterna.

Safira parou de encarar a pintura e eu também. Estávamos nos encarando e pude congelar em segredo aquele momento por alguns preciosos segundos para admirá-la. Seus olhos coloridos com um tom especial de azul frio estavam escurecidos por conta da iluminação, deixando seu olhar mais profundo do que já era. Sua sobrancelha cheia e arqueada, os cabelos pretos que a rodeavam como uma névoa. Poderia encarar cada detalhe sem cansar-me.

É hora. Ou pelo menos acho que é. Prometi a mim mesmo que usaria essa pequena viagem e escape de nossa habitual rotina para fazer o que tanto quero. Passei a noite planejando. Poderia beijá-la no ônibus, mas isso é público e indelicado demais, não temos treze anos. Porém todas as vezes que tento, não parece dar certo. Algo ou alguém nos atrapalha, ou Safira simplesmente não percebe e vai embora. Talvez seja um sinal de que não deveria forçar isso a acontecer.

Inclinei o corpo discretamente em sua direção, algo que deve ter passado alheio por ela. Meu coração estava palpitando e não podia importar-me menos com a excursão e pontos extras que estávamos perdendo.

"É agora ou nunca."
"Sempre será nunca."
"Só vai saber se tentar."
"O não você já tem."
"E se o não estragar tudo?"

Esses pensamentos sempre martelavam em minha mente quando pensava em fazer isso, deixando-me receoso em estragar o que já possuímos.

Estava prestes a por tudo a perder. Para que iria estragar o que tivemos hoje ou o momento? Ela me vê como seu melhor amigo, unicamente o suficiente e essencial.

Apenas preciso lembra-me disso com mais frequência.

— Eu... — Murmurei lentamente, jogando meu cabelo para trás. — Trouxe algo.

Shattered IceOnde histórias criam vida. Descubra agora