XXXIX

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Memories On

— Você se esqueceu das luvas térmicas de novo, querida.  — Papai encarou minhas mãos. — Vai queimá-las no gelo.

— Mas já estamos no meio do caminho! — Exclamei do banco traseiro do carro.

— Por isso é sempre bom sair adiantada. — Observei seu sorriso no espelho do carro. — Ainda vamos ter tempo para colocar os brilhinhos em seu cabelo se correr para o seu quarto.

— São presilhas. — Dei risada. — Tudo bem, eu sou rápida.

— Eu sei que é.

Estamos indo para a Competição Natalina Juvenil no centro artístico de Barrie. É a senhora Patty que cuida das competições anuais, e finalmente completei oito anos para poder participar. Talvez eu não seja boa o suficiente para ganhar, porque ouvi dizer que as outras garotas possuem treinadores ou algo do tipo, e eu patino sozinha. Pelo menos posso contar com o ânimo de meu pai e a experiência de Alec — que gostaria que tivesse vindo junto mas está passando o natal na fazenda de sua família no Kansas, nos Estados Unidos.

Não sei quanto tempo levamos para chegar em casa novamente, mas agradeci por ainda não ter começado a nevar, porque isso sempre implica que talvez nem possamos ir a algum lugar para começo de conversa.

— Vamos gatinha, ou o gelo vai te congelar.

— Não tenho medo disso! — Exclamei com um sorriso enquanto saía correndo do carro.

Ouvi a risada abafada de meu pai e balancei a cabeça ao chegar na porta de casa. Esqueci das chaves. Mesmo assim, a porta estava aberta. Como lembro-me de ter visto papai trancá-la, é um sinal de que mamãe chegou em casa. Fechei a porta e corri pelas escadas, pegando minhas luvas especiais dentro da gaveta do armário. Quando sai do quarto, pensei em chamar mamãe para... Eu não sei, talvez dar tchau. Mas as vezes ela não gosta de ser incomodada com esse tipo de coisa, então é melhor não.

Por que será que ela não vai as minhas apresentações? Devo ser ruim mesmo.

Coloquei as luvas nas mãos e passei silenciosamente pelo corredor, ouvindo as risadas aumentarem dentro de seu quarto. Então observei uma bota térmica jogada entre a fresta de sua porta, fazendo com que um vão ficasse disponível. Não é a bota de papai, pensei. Porque ele sempre diz que prefere as sem estampas, e esta possui um bordado xadrez. Se estivesse aqui daria risada do quão feia a estampa é.

Continuei andando até enxergar um homem pela fresta da porta. Estava de costas e com as mangas do suéter marrom nos cotovelos. Mas não consegui enxergar outra coisa, apenas o vi tirar algo do cabelo de mamãe. Ele colocou alguns fios para trás de sua orelha, então provavelmente estavam enroscados ou bagunçados. Fiquei colada na bota a fim de tentar enxergar um pouco mais a fundo o homem, mas sem querer, meu pé escorregou e a bota acabou deslizando alguns centímetros para o lado, abrindo um pouco mais a porta.

— Quem está aí? — Minha mãe perguntou de dentro do quarto? — Mark?

Entrei em pânico ao ver que ela estava prestes a abrir a porta e corri o mais rápido que pude para o andar debaixo, tentando pisar nos degrauas nas pontas dos pés para que ela não me visse. Escutei mais alguns chamados ecoando do corredor de cima e meu nome estava em um deles, por isso decidi sair pela porta da cozinha e contornar o caminho pelo jardim. Me escondi por alguns segundos no arbusto de margaridas do senhor Keplas, nosso vizinho, e então apressei-me para entrar no carro, ofegando com a respiração irregular.

Shattered IceOnde histórias criam vida. Descubra agora