Muitas coisas podem acontecer em um ano.
E eu vivi tantas coisas esse ano, resgatei tantos anos, que sinto como se ele jamais fosse acabar.
Mas em alguma horas, chegará ao fim.É um ciclo eterno — pelo menos até o dia em que morrermos — que todos os seres humanos vivem. São trezentos e sessenta e cinco dias novos. Costumava refletir a respeito disso quando era criança com o meu pai: por que nós tratamos esses 365 dias de maneira tão diferente se, tecnicamente, são apenas um extensão dos dias que já estamos vivendo?
E então compreendi que são uma forma de não termos uma extensão. Os seres humanos precisam de um momento que separe uma etapa da outra. No momento em que o relógio bater meia-noite, será um novo começo. Não será o dia 366, ou 367. Será o dia 1. Simplesmente.
É o dia que usamos para preencher nossos corações com todos os sentimentos que estão necessitando de um refil. Talvez você precise de amor próprio, confiança, coragem, cura... amor. Um novo ciclo nos dá esperança para buscar todas as coisas que estamos atrás.
E a véspera de ano-novo é a nossa oportunidade de nos despedirmos desses 365 dias que nunca mais serão revisitados. Apesar de que pode muito bem mandá-los para o inferno também, isso é sempre uma opção.
Mas hoje, é uma despedida. É a última distância que temos da possibilidade de começar nossos novos passos.
E eu estou pronta para um recomeço. Mas também estou com medo. Estou com medo porque há muitas mudanças acontecendo. Mudanças positivas, mas ainda são mudanças. Dessa vez, teremos mais 365 dias, porém cada um seguirá o seu próprio rumo.
E acima de tudo, o fato de como irei utilizar meus novos 365 dias me dá medo. Me assusta porque Nova York não será mais a minha constante. Eu não terei uma constante. Viajarei por uma boa parcela do mundo. Mas o epicentro do medo é o fato de que Nova York é a constante de Alec, e isso não vai mudar quando o relógio bater meia-noite.
Como nossa relação pode coexistir em duas constantes diferentes?
Os nova-iorquinos passam seus anos-novos de maneiras diferentes. Alguns procuram a festa mais badalada do momento, outros organizam a própria festa, alguns viajam para fora de Nova York, lotando o aeroporto JFK e uns preferem ficar em casa. No entanto, o que aprendi morando aqui por quase cinco anos foi que a maioria compartilha do mesmo objetivo: assistir a queda da bola na Times Square.
Desde 1907, uma bola que foi adaptada ao passar dos anos com efeitos especiais desce cerca de quarenta e três metros em sessenta segundos através de um mastro especialmente projetado na cobertura de um dos principais prédios da Times Square. Ao descer completamente, o enorme relógio digital mostra que a contagem chegou ao fim, assim como o ano. É uma tradição religiosamente planejada todos os anos, e quando a bola completa sua queda, todos comemoram com as pessoas que amam — seja da própria Times Square ou de outro lugar — assistindo ao show de fogos que é programado para acontecer logo em seguida.
Elijah mora em Nova York desde que nasceu e nunca perdeu um ano sequer a queda da bola. Como eu era nova na cidade, não entendia o que era tudo isso. Geralmente me infiltrava em alguma festa que Elijah arranjava para nós e assistia da cobertura, mas em um ano fui até a Times Square e tentei a sorte no meio da multidão. É incontrolável e um pouco maluco, mas acredito que sua queda seja especial por conta de que simboliza um rito de passagem. As pessoas gostam de acompanhar sua queda porque buscam conforto e esperança. A bola cai, assim como todas as nossas angústias passadas.
Neste ano no entanto, iremos assisti-la de outro lugar. O Campeonato Regional de Hockey é um verdadeiro evento que ocorre de três em três anos. Nos anos de campeonato, os nova-iorquinos — que são na maior parte eternos amantes do esporte — tratam suas comemorações duplas. É uma tradição assistir ao jogo, torcer por Nova York e assistir a queda da bola. Por isso o jogo começa relativamente mais tarde, terminando meia hora antes da meia-noite. Os próximos trinta minutos passam muito rápido, e há somente duas maneiras de passá-los: comemorando ou lamentando.

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Shattered Ice
RomanceO DESTINO É FEITO DE GELO Quando se é uma patinadora artística, baseia-se na confiança. Nos outros, e em si mesma. O gelo é o nosso fiel confidente, um reflexo de nossa alma. Prometemos manter o gelo que nos desliza por nossos destinos intacto, ...