Alec
Estou a onze mil metros de distância do chão.
A terra parece pequena agora, os tons de vermelho aflorando no céu enquanto o sol torna-se uma esfera de poder solar. Só há uma linha tênue, e as nuvens banham a camada abaixo de mim.
Nove horas de voo nunca passaram tão devagar. Peguei-me cochilando após o almoço, e por mais que isso tenha tirado duas horas, ainda senti-me preso em uma infinidade de horas e minutos. Deus sabe quantas vezes calculei o tempo restante em meu celular. Quando senti-me prestes a colapsar há cerca de trinta minutos atrás, resolvi tirar a camiseta de algodão amarrotada e me arrumar.
Tentei manter-me ocupado com o meu ritual de sempre. Passo alguns óleos na pele para tentar aliviar as dezenas de hematomas e cortes que faço todos os dias. Faço a barba se necessário e me certifico de que meu cabelo não está amassado ou se as ondas estão fora do lugar — que agora estão quase em meu ombro. Penteei a frente de meu cabelo para trás e deixei somente uma mecha, vestindo minha camisa de seda verde-oliva em seguida. A deixei pendurada em um cabide, e por isso, tive a sorte de não amarrotar no caminho. A calça capri branca não poderia ter sido vestida no avião, ao contrário teria sujado.
Pelo menos meu tênis branco não sujou.
Minha corrente de prata contém uma pequena esmeralda, e isso me lembra de algo que trouxe na mala. Gasto tempo com minha aparência, isso não é novidade. Mas hoje, estou gastando algo que não gasto: preocupação. Estou verdadeiramente pressionado para me sentir pronto. Preocupado com a maneira como serei visto.
Me arrumando, sinto que estou com pelo menos uma coisa no lugar e em controle.
Apliquei meu perfume de sândalo indiano e o guardei na mala de mão que estava acima de meu assento.
Quinze minutos.
Escuto a voz de Grace, a aeromoça, avisando que meu cinto deveria estar afivelado porque logo aterrissaríamos. Concordo e sinto a realidade bater em meu rosto como uma porta.
Verei Safira pela primeira vez em três meses. E a melhor parte de todas: ela não faz ideia.
Ela está em Atenas, capital da Grécia, porque teve uma competição ontem — a qual foi muito bem. Nós aprendemos a desenvolver uma boa relação virtual, mesmo que a falta de seu toque me enlouqueça de vez em quando. E no início, costumávamos nos ver um pouco mais, mas isso acabou sendo uma opção um tanto quanto difícil.
No entanto, não foi por falta de esforço de ambas às partes. É só que com o passar do tempo, Safira foi ganhando mais competições, conhecendo mais pessoas, aumentando sua reputação e criando mais fama — o que é ótimo — e claro que acabou enchendo seus dias livres de reuniões e atividades.
Já eu, estou desenvolvendo um projeto em que irei investir uma boa quantia de dinheiro, mas não sozinho. É algo que vou cultivar pelo resto da vida e a maior coisa que já fiz, e por mais que não tenha planos de parar de jogar agora, pode ser uma segunda opção rentável no futuro. Isso tem tirado tempo de mim porque estou conhecendo investidores, avaliando sócios e conhecendo milhares de pessoas que estão sendo e serão responsáveis para fazer esse projeto acontecer. E como Safira está sempre por alguma parte do mundo, é um pouco difícil acompanhar em um piscar de olhos.

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Shattered Ice
RomanceO DESTINO É FEITO DE GELO Quando se é uma patinadora artística, baseia-se na confiança. Nos outros, e em si mesma. O gelo é o nosso fiel confidente, um reflexo de nossa alma. Prometemos manter o gelo que nos desliza por nossos destinos intacto, ...