27 - Cicatriz

2.2K 250 211
                                    

- Então, esse Law – Ace – que tipo de pessoa é ele?

Dei um sorriso com a pergunta. Já esperava que a fossem fazer.

- Ele é boa pessoa, sei lá. Um humano normal.

- Ele nunca fez, realmente, nada contra a sua vontade? – Sabo.

- Ah, isso ele fez. Me obrigou a comer legumes! Chamei ele de monstro por um longo tempo! Aquelas coisas verdes horríveis arruinaram o meu almoço durante toda a minha recuperação.

- Recuperação?

- É… Escravos nunca são vendidos em boas condições, quando vim para aqui tinha uns tantos ferimentos para recuperar então ele me obrigou a comer “comida saudável” por um tempo – fiz cara de nojo – foi horrivel. Depois de ficar bem, acabei retomando a rotina normal. – Eles ficaram calados. Não sei se não tinham o que perguntar, ou se não sabiam como o fazer. Continuei a falar. – Tirando isso, não tenho queixa. Ele passa bastante tempo no trabalho, tem folga às segundas, às vezes tira um dia a mais durante a semana pelas horas extra que faz e nós os três saímos para algum sítio para arejar as ideias. Já fomos no cinema, parque de diversões, beira mar, enfim… Ah é, geralmente ele não gosta de animais, descobri isso com Peter!

- Peter?

- O Peter é um gato, encontrei ele na rua. O Torao ameaçou que nos punha aos dois fora de casa se eu insistisse em ficar com ele, mas acabei o convencendo do contrário e agora até estranha se chega em casa e não o vê. É todo preto de olhos verdes, um amor! Como o Torao detesta desarrumação, foi difícil para ele ter um animal dentro de casa nos primeiros tempos, mas até que deu certo. Geralmente tem cara de mal disposto, mas não é uma pessoa tão ruim como aparenta. Não tenho muito mais a dizer…

Caminhamos em silêncio por algum tempo. Saindo do parque em direção ao apartamento, eu me divertia cantarolando algo enquanto eles pareciam apenas apreciar a minha companhia. O tempo tinha esfriado de novo mas felizmente não ameaçava vir chuva, facto que nos dava mais à vontade para continuar a passear por aí.

- Ele… É o quê a você? – Questionou o loiro. Corei um pouco. Por um lado, senti-me tentado a abrir o jogo com eles em relação a isso, por outro, achava que não dava para dizer a verdade ainda. Ambos estavam de pé atrás com o meu comprador, talvez fosse melhor deixar que se conhecessem primeiro. Depois pensaria na melhor forma de agir…

- Acima de tudo, somos amigos. Pelo menos eu o considero assim e lhe passaria sermão se ele dissesse que não. Também foi ele quem insistiu para eu falar com vocês á um ano atrás. – Agora, consegui a atenção total dos dois. – Não que eu não o quisesse fazer, mas sei lá… É complicado… Se eu me aproximasse de mais, acabaria envolvendo vocês por isso tentei manter distância. Ele resmungou comigo e passou a me arranjar os telemóveis, pelo menos uma vez por mês. Eu me atrasava a ligar por causa de arrumar as papeladas...

- Vamos conhecer ele?

- Se não o esfolarem vivo por mim tudo bem. – Dei um sorriso brincalhão, ao que os dois desviaram o olhar. O que eu esperava? – Não pensem nele como tendo nos separado, pelo contrário. Ele nos juntou. Me tirando daquele lugar, salvou a minha vida. Se não fosse por isso, eu já não existia…

- Você diz isso com imensa certeza.

- Você que não viu o que lá acontece. Está mais para uma cena de filme de terror, isso acontece todos os dias a todas as horas. Enquanto falamos, alguém está a morrer pouco importando o quanto implora pela vida. Enquanto a gente fica andando por aí, tem alguém sendo capturado para esse mundo. Não estou exagerando… - Apertei o meu próprio braço – aquilo é pior do que o inferno. – Deixei, inconsciente, que o meu olhar escurecesse e perdesse um pouco do seu brilho. Detestava aquele lugar, detestava me lembrar dele, detestava falar se quer sobre a sua existência! Não queria entrar mais fundo nesse assunto, não com eles. Voltei a encara-los ao sentir uma mão no meu ombro. A mão do loiro.

Meu carcereiroOnde histórias criam vida. Descubra agora