Limpo a garganta. Aceito a chamada após pegar os fones de ouvido.
— Alô? — Minha voz sai relutante. Eu ouço uma respiração ao fundo. Nenhum ruído ou coisa parecida. Só Isaac.
— Olá, Ana Julia. — O sotaque britânico vibra em meus ouvidos. A voz grossa, diferente de como havia imaginado. Por um momento pensei que escutaria algo como um garoto na puberdade, mas não Isaac. Com dezessete anos ele soa como um homem. — Você atendeu.
— É, eu atendi.
— E agora é oficial, estou falando com uma garota grávida.
— Isso deve ser muito relevante. — Zombo
— Vai para a minha lista de coisas relevantes. O que uma grávida faz? Yoga? Pilates?
— Dorme quando não está cumprindo com as obrigações de uma futura mãe.
Me ajeito na cama, descansando as pernas esticadas no colchão.
— Sinto por interromper.
— Uma interrupção solicitada. — Argumento.
Ele ri nasalado do outro lado.
— Quais as obrigações de uma futura mãe, afinal?
— As minhas, trabalhar e estudar.
— Mais uma descoberta, Ana Julia. Você trabalha. Grávida.
— Oh, papos machistas. — Faço uma careta, os cantinhos de minha boca se erguendo.
— Estou fora dessa. O seu bebê está quase lá e você trabalha, é tudo uma surpresa. Não tem aquele lance de não se esforçar?
— Apenas no oitavo mês, no meu caso, quase nove. Foi o combinado com meu chefe.
— O que você faz?
— Opero caixas em um supermercado.
— Às vezes eu trabalho no verão com meu tio. Sou um excelente mecânico de motos.
— Aposto que as pessoas adoram levar as bikes para você olhar. — Brinco. — Quando voltam às suas aulas?
— Em uma semana e meia. Temporada maluca. Não ajudei meu tio, estive ocupado viciado em jogos.
— Tão nerd. — Cantarolo.
— Demais!
— Nem um pouco de fotossíntese, Isaac?
— Saí com uns amigos. Sou bastante sociável, acredite ou não.
— É claro, nós nem nos conhecemos e você me ligou.
— Um dia eu me arrependo de ter ligado e você de ter atendido, Ana Julia. — Ouço um farfalhar através da chamada. — Me conta mais sobre você.
— Sabe o quão bizarro isso soa?
Sua risada baixa reverbera meus ouvidos. É melódica, sem parecer um ganso ou uma hiena. Eu.
— Está bem, eu falo sobre mim.
— Por que confiaria?
— Porque você é uma grávida.
Meu queixo pende para baixo, mas antes que possa dizer algo, ele começa:
— Coisas banais, hum...meu nome é Isaac e você já sabe disso, sabe que estudo na FDII, o que é um convite dourado caso você seja uma maluca. — Rio nasalado. — Sou do Reino Unido, eu gosto de jogos on-line que a maioria das pessoas acham sem graças. Sou um grande apreciador de livros, e, Ana Julia, o meu segredo é que eu gosto de romances dramáticos, por favor não espalhe isso no Facebook.
— Não brinca! Romances dramáticos?
— É como eu chamo aquele tipo de romance de você sabe quem onde o casal morre no final.
— Adorável!
— Eu sou desatualizado, chame de lerdo se quiser, mas a minha vida inteira foi dentro de uma escola católica.
— Seus pais são religiosos?
— Não, mas a educação é ótima. Muitas pessoas criam certos estereótipos. Nós aprendemos sim sobre teologia, mas no que vamos acreditar no fim é um problema nosso. Huh?
Sorrio.
— É isso aí, Isaac.
— Hum... — Pensa. — Desatualizado ou não, eu tenho uma namorada desde os treze anos.
— Como você conheceu uma garota estudando em um colégio para rapazes. Aliás, você mora lá ou o quê?
— Não moro, mas estudo em período integral. Eu conheço Amelie desde sempre, a mãe dela é amiga da família. Ela é uma garota especial, acabei me apaixonando.
— Que doce, Isaac. — Sorrio.
— Sou um namorado meloso.
Eu até posso vê-lo dando de ombros.
— Meus hobbys...além de ler e de jogar, se é que é catalogado hobby, gosto de fotografar, mas é algo meu. Há algum tempo fui num estúdio, fiquei absolutamente encantado.
— Quer ser fotógrafo?
— Estou decidindo sobre isso. — Seu tom vago me deixa cheia de curiosidade. — Sua vez, Ana Julia.
— O que poderia falar sobre mim? Sua vida parece mais interessante.
— Você tem um bebê aí! Com certeza a sua é ainda mais interessante.
— Não, nem mesmo antes do bebê. Não frequentava festas ou matava aula para me divertir com amigos. Estudava muito, tinha vários planos, quando conheci o pai do meu filho passei a incluí-lo neles e era até legal. Por ele eu saía uma vez ou outra e por mim ele participava das aulas. Mas nem tudo eram flores, tínhamos um relacionamento complicado, na verdade, nunca foi oficial, isso era o que mais me destruía. Achei que para ser levada a sério precisaria dar o que ele queria. — Sorrio sem vontade, as lágrimas pinicando meus olhos. — Aí eu fiquei grávida e ele foi embora. É isso.
Silêncio.
Silêncio que possivelmente julga.
Isaac deve estar pensando o que todo mundo pensa.
Fácil. Desesperada. Vagabunda.
Engravidou porque quis.
Talvez eu tenha levado essa gravidez adiante porque quis mesmo, mas eu não escolhi isso. Acabar caindo nessa cascata e me machucando a cada solavanco, em cada rocha. Isso dói pra caramba.
A solidão dói.
O desprezo dói.
O abandono dói.
Não me entregaria a Theo se soubesse que passaria por tudo isso. Eu preferia que ele me abandonasse quando não existisse um bebê entre nós.
Passo o dorso da mão pelo rosto.
— Estou cansada, Isaac. Deixamos isso para outro dia, tá?
Encerro a chamada.
Eu odeio lembrar. Odeio falar.
Me faz me perguntar porque continuo aqui.
∞
Desculpe os erros.
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Via Internet
Teen FictionAos quinze anos, Ana Julia é só mais uma garota grávida, a qual não planejara a gestação precoce. Abandonada pelo namorado, amigos e a vida a qual considerava a melhor, Ana, se vê só, tendo de lidar com as mudanças físicas e psicológicas, entrando n...