SAUDADES

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— Então, você está realmente grávida? — Carol perguntou, mais para si mesma do que para a irmã.

Carol estava sentada na grama fria e bem cortada da estufa, com o dispositivo de comunicação em mãos, seus olhos brilhando com lágrimas de alegria.

A voz de Dany soava clara, mas carregada de emoção do outro lado da tela.

— Eu tinha mandando uma mensagem de vídeo para você, na hora que descobrir. — Dany disse triste. — Desculpa se eu soubesse que aquela mulher ia estar com seu celular, nunca teria mandando nenhuma mensagem.

— Estou tão feliz! — Carol exclamou, limpando as lágrimas de alegria. — Vou ser tia!

— Sim, você vai ser uma ótima tia — Dany respondeu, a voz levemente trêmula.
Dany, visivelmente emocionada, enxugou suas próprias lágrimas, o sorriso transpareceu através da tela.

— Onde você estava quando tudo aconteceu? —  Carol perguntou curiosa. — Acho que se você estivesse solteira, teria sido obrigado a está Aqui comigo. — Brincou piscando para a irmã.

— Cruzes, eu achava que essa seleção era para quem quisesse participar. — Dany mencionou claramente pensativa.

—Eu também.

As duas ficaram em silêncio por alguns segundos tentando entender o motivo de Carol estar ali sem sua vontade.
Não tem sentido.

— Bom, me conta onde estava quando eles chegaram na Terra?

— Fui à  nossa antiga casa.

— Por que?

— Precisava pegar alguns documentos do escritório do papai — começou a tensão em sua voz perceptível.

— Achou?

— Não, mas encontrei algo intrigante. — Dany falou intrigada.

A curiosidade se acendeu nos olhos de Carol, e ela se inclinou um pouco mais para a frente, como se pudesse absorver melhor as palavras da irmã.

— Sério? O que?— Carol perguntou, sua mente já imaginando mil possibilidades.

Dany respirou fundo antes de continuar.

— Descobri que nosso pai não era exatamente o caseiro que pensávamos que ele era.

A mais nova  sentiu um frio na espinha. Era como se uma porta há muito fechada estivesse prestes a ser aberta.

— Como assim? Nós vivíamos em um casarão. Nossa avó sempre disse que nossos pais cuidavam da casa.— A curiosidade agora misturava-se com um toque de apreensão.

Dany soltou um suspiro, a voz carregada de desdém.

—  Parece que ela não sabia de tudo — Dany explicou. — Encontrei fotos dele com pessoas do exército. Ele trabalhava para o governo.

O coração de Carol batia mais rápido. Ela sempre teve uma imagem pacífica do pai, e agora tudo parecia virar de cabeça para baixo.

Pelos menos isso que minha voz dizia.

— Isso não prova nada — Carol respondeu, ainda cética, mas com uma ponta de dúvida.
Dany deu um leve sorriso, meio triste.

— É, eu sei. Mas consegui abrir o cofre da casa.

A revelação fez o estômago de Carol revirar.

Como Dany, a irmã que sempre teve medo de qualquer coisa perigosa, conseguiu fazer isso?

— Como? — Carol perguntou, assustada e admirada.

— Tenho meus meios — Dany respondeu com um sorriso misterioso.

— Olha, Quem diria, né? Uma mocinha delicada, que tinha medo do perigo, agora fazendo essas coisas.— Carol riu, piscando para ela.

— Acho que antes eu tinha medo porque tinha mais responsabilidades. — Dany revelou pensativa.

Carol riu nervosamente, tentando aliviar a tensão que sentia no peito.

— Verdade, fui um fardo para você. — Carol contou, sentindo seu coração apertar.

— Besta, nunca precisou, eu te amo.— Dany disse com carinho. — Você nunca foi um fardo. Nunca mais fale isso, ou vou ter que te quebrar.

A risada de Carol ecoou pelo cômodo, uma risada que carregava anos de amor e proteção entre irmãs,  mas seu coração ainda  estava  apertado e, lágrimas ameaçavam cair novamente.

— Ah, Dany, voltando ao assunto, o que mais encontrou no cofre?

Dany fez uma pausa dramática, aumentando o suspense.

— Alguns papéis sem importância, um certificado da NASA e um diploma. Parece que ele foi um cientista do governo.

Carol colocou a mão na boca, com os olhos arregalados em descrença.

— Meu Deus Dany, então tudo o que sabemos sobre nosso pai pode ser uma mentira. — Gritou, colocando a mão na boca pasma.

Carol piscou, tentando processar a informação. A memória das histórias da avó sobre a vida simples e rural de seus pais vinha à tona.

— Sim, é muito estranho. A nossa casa ficava ao lado de um posto militar. Entrar lá foi um desafio e tanto. Pra mim consegui entrar, foi a maior burocracia.

Carol ficou pensativa, o silêncio pesado no ar.

O que mais poderiam descobrir sobre nosso pai? Será que a mãe sabia de tudo isso? Será que por isso fui obrigada a estar aqui ? Vão fazer um experimento em mim? Ou será que já fizeram?

— Estou pasma — ela finalmente murmurou, a mente trabalhando a mil por hora.

Dany riu, tentando descontrair, mas a preocupação era evidente em seus olhos.

— Imagina como eu fiquei!? — Dany disse.

Carol pensou um momento, ponderando se deveria compartilhar seu segredo mais recente.

— Será que a mamãe sabe disso? — ela perguntou, a voz em um sussurro.

Dany deu de ombros, mas seu olhar endureceu.

— Provavelmente. Ela era casada com ele, lembra? — Dany disse com desdém. — Temos muito o que conversar.

Carol hesitou. Como poderia contar sobre o beijo com um extraterrestre? Seria demais para sua irmã agora.

— Eu também — Carol finalmente disse, abaixando os olhos.

Será que devo contar que beijei um extraterrestre? Ela sabia que sua irmã a conhecia muito bem. Acho melhor deixar pra lá, eu conto outra hora.

— Carol?

Dany franziu a testa, claramente percebendo a hesitação de Carol.

— Você está me escondendo algo, menina. Fale agora.
Carol mordeu os lábios, um hábito que sempre denunciava seu nervosismo.

— Até parece.

Dany estreitou os olhos, reconhecendo os sinais de sua irmã.

— Você está mentindo, Carol. Eu conheço seus sinais: quando está nervosa, você morde os lábios. E quando mente, pisca os olhos de maneira exagerada.

Carol soltou um suspiro resignado.

— Que droga! Posso contar outro momento?

— Não. Sabe que sou curiosa.
Era verdade. Dany sempre foi implacável quando queria saber algo.

— Eu beijei alguém aqui...
A revelação fez Dany se aproximar mais da tela, com os olhos arregalados.

— O QUÊ? HÁ HOMENS HUMANOS AQUI? OU FOI UMA MENINA? — Dany gritou, a voz cheia de surpresa e curiosidade.— Oh! Meu Deus, a minha bebê beijou alguém.
Carol piscou, confusa com a reação da irmã.

— Bebê? Perai... Por que eu beijaria uma menina? — Carol perguntou, confusa.

O que ela está  insinuando?

Dany deu um sorriso travesso, mas sua curiosidade ainda estava à flor da pele.

— Vai saber. Mas não me desvie do assunto. Então é um homem? Tem humanos aí?

Carol respirou fundo, tentando encontrar as palavras certas.

Como posso dizer isso a ela, sem parecer estranho?

— Não, pelo menos eu acho — ela relatou timidamente. — Foi um príncipe E.T.

A boca de Dany se abriu em choque.

— Pensei que tivesse medo deles.

Carol sorriu, um sorriso que misturava nervosismo e um estranho conforto.

— Eu também, mas estranhamente me sinto em casa.

Dany franziu a testa, a preocupação evidente em seu rosto.

É, eu sei, isso é preocupante.
— O que eles fizeram com você?

— Até agora, só me sequestraram — Carol declarou, tentando quebrar o clima tenso com um sorriso. — Tirando isso está tudo ok.
Dany não parecia aliviada.

— Não estou para brincadeira, Carol. — Ela informou séria. — Isso é grave.

Carol suspirou, o sorriso desaparecendo.

— Desculpa.

Dany, determinada, olhou firme para a irmã.

— Vou dar um jeito de te buscar...

Oh! Dany, minha irmã louquinha, como você vai fazer isso?

Carol sentiu um misto de esperança e inquietação.

— Como? Se você não percebeu, estou no espaço. Nem sei se estou perto da Terra.

Dany, com uma expressão resoluta, respondeu:

— Vou dar um jeito. — Ela estava determinada. — Você é minha bebê, ninguém faz isso com você.

Carol sentiu uma onda de emoções. Ela amava sua irmã, mas também queria descobrir mais sobre o pai delas.

— Dany... Eu...

Dany a olhou, esperando.

— Fale.

Como posso dizer a ela, que quero descobrir mais sobre o que eles sabem sobre nosso pai, sem deixar ela mais preocupada?

—  Estou ficando preocupada.

Carol hesitou, mas sabia que precisava ser honesta.

— Eu tenho que ficar...

— O que? — Ela disse incrédula.

Carol respirou fundo antes de explicar.

— Eles sabem algo sobre nosso pai. Eu preciso descobrir mais sobre isso.

Dany franziu a testa, a apreensão em seus olhos.

— Você não precisa se sacrificar por isso.

— Eu sei, mas quero lembrar mais sobre nosso pai, Dany. Eu não lembro dele.

O silêncio que seguiu foi pesado, cheio de emoções não ditas. Dany não disse nada, apenas suspirou triste, ela sabia que isso sempre incomodou Carol, não lembrava nada do próprio pai.

— Tá, mas se você ver que não vai dar em nada, me ligue e eu vou te buscar de qualquer jeito.

— Eu sei.

Sem perceber, as duas estavam chorando novamente.

OLHOS NEGROS ( Revisando)Onde histórias criam vida. Descubra agora