H U N T E R
NO MOMENTO EM QUE NOSSOS OLHARES se cruzaram, um arrepio desceu minha espinha. April estava no estacionamento. Ela aguardava por mim, próxima ao meu carro, tinha sobrancelhas franzidas e punhos envolvidos pelas mangas compridas de seu velho moletom. Havia algo em seus olhos castanhos que atravessava distâncias, escurecia os céus e evocava nuvens de tempestade. Eu me preparei para ouvir todo tipo de xingamento e ignorar qualquer um de seus comentários afiados sobre o treino de futebol. Tinha prometido à ela que encontraria um jeito de resolver a situação e foi o que fiz — sem arrependimentos.
Inferno. Eu esperava qualquer coisa de April, menos aquela pergunta.
Você transou com ela?
O jeito que seus olhos me encararam, tão firmes. April queria uma resposta. Depois de tudo que eu disse, de todas as vezes que venerei seu corpo, ela acreditou que eu seria capaz de traí-la. Na hora, eu tive que rir, exasperado. Tudo bem. Não tínhamos exatamente o que podia se chamar de relacionamento e, sim, eu me comportara feito um babaca nas últimas horas, mas meus sentimentos por ela não haviam mudado — eu continuava tão refém de seus caprichos quanto antes.
Eu estava tão cego pela raiva que não resisti a oportunidade de provocá-la.
April nunca baixava a guarda e eu não cederia daquela vez — era minha chance de dar as cartas, como ela sempre fizera. Mastiguei todo sentimento revoltoso que cozinhava em meu peito e cuspi de volta as suas próprias palavras como veneno.
Eu fui cruel com April, que nunca teve pena de mim.
Esperei que ela rebatesse meu comentário, pronto para tirá-la do sério, mas não foi como nas outras vezes — ao invés de uma réplica cortante, recebi silêncio. Em poucos segundos, observei seu rosto mudar: seus olhos castanhos cintilaram com mágoa e finalmente entendi.
Meu Deus, April. Como você é tola.
Por mais irritado que estivesse, não queria machucá-la. Não queria dormir com outras. Eu queria April. Eu quebrava minha cabeça noite e dia pensando em formas de me aproximar daquela garota, mas parecia impossível — tudo que ultrapassava o limite físico a assustava e a afastava de mim. April não confiava. Eu só conseguia me aproximar dela usando sexo, então foi o que fiz.
O tilintar de sinos atravessou meus ouvidos, anunciando a entrada de um novo cliente na loja. Um senhor franzino empurrou a porta acompanhado de um cachorro pequeno e latidos, barulho de buzinas e outros ruídos da rua invadiram o pet shop.
Merda.
Não importava o que eu fizesse, meus pensamentos continuavam a voltar para April.
— São vinte libras — Grace sorriu para mim atrás do balcão.
Assenti em silêncio, procurando minha carteira nos bolsos.
Depois de tudo que aconteceu, era uma coincidência de merda encontrá-la ali.
— É uma boa compra — ela continuou — O pacote econômico vem com três quilos de ração de graça.
Meu celular vibrava sem parar em meu bolso. Eu saquei a carteira de couro e aproveitei para conferir no visor. Não me surpreendi quando o nome de Zack apareceu: mais uma vez, eu estava atrasado para a reunião da banda.
Dessa vez, eu não tinha culpa.
Emergência familiar.
Minha avó havia ligado horas antes, insistindo para que eu buscasse ela e Julie depois do meu treino de futebol. Era um pedido atípico: não apenas teria que dar uma carona para elas, como também teria que acompanhá-las ao pet shop mais próximo — o único em um raio de três quilômetros.
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BULLSHIT
Teen Fiction[EM ANDAMENTO.] April Wright tem um problema. O problema dela tem olhos azuis, um sorriso que faz suas pernas estremecerem e, principalmente, uma personalidade nem um pouco encantadora. Com muita apatia acumulada era tarde demais para qualquer coisa...