Capítulo XXVII [PARTE UM]

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H U N T E R


MAIS LEVE DO QUE UM BEIJO. Quase menos do que um roçar de lábios. Bastou aplicar uma pressão delicada sobre seu pescoço e April liberou um suspiro impaciente, muito parecido com um gemido. Ela procurava pela minha boca às cegas, pálpebras trêmulas e sobrancelhas franzidas. Debaixo da minha mão, seu coração estava disparado como as asas de um passarinho.

Eu sorri.

Há pouco mais de meia hora, meu corpo exausto colapsara sobre o dela. Eu teria apagado naquela posição se não fosse por sua mão gelada pressionada contra o meu abdômen. April se levantara, saltitara até o banheiro na ponta dos pés e voltara com a mesma rapidez, se aninhando ao meu peito e reclamando baixinho: "frio do caralho".

Desde então, mal havíamos nos movido sobre a cama.

Nós estávamos bem. Felizes. Exaustos.

Eu mesmo não conseguia acreditar na minha própria sorte. Apesar de ter todos os motivos para desconfiar de mim, April escolheu ficar do meu lado. Em algum momento dos últimos dias, atingimos um estranho nível de estabilidade que permitiu que isso acontecesse. Quer dizer, ela poderia ter me culpado pela situação toda envolvendo o irmão ou me punido por ter mantido-a no escuro, mas não o fez - era o primeiro voto de confiança que eu recebia em um bom tempo e a sensação era boa.

Céus.

Era boa demais.

Deslizei minha língua contra a de April em uma provocação e saboreei a resposta imediata do seu corpo. Ela arfava por mais e se agarrava a mim. Eu tomei sua boca com uma lentidão torturada, sem a intenção de apressar as coisas.

Só precisava disso.

O que quer que fosse.

April, no entanto, não estava no mesmo estado de espírito que eu. Ela escorregou uma mão sobre minha ereção e um tremor atravessou meu corpo.

- Calma. - Ri curto com surpresa, me apoiando sobre um dos cotovelos para enxergá-la melhor. - Eu quero tentar uma coisa.

Mesmo contrariada, April atendeu ao meu pedido.

Ela permitiu que eu a guiasse e meu estômago gelou com a antecipação. Eu encarava o rosto dela com devoção e a palavra certa para aquilo estava na ponta da minha língua. Eu precisava dizer. Me aproximei devagar, repousando minha testa contra a dela. A ruguinha teimosa entre suas sobrancelhas me deixava louco. Nenhuma outra me deixava louco April. Meu sorriso cedeu. Eu me sentia pesado, preso em um encantamento - April deve ter sentido aquilo também. Ela puxava o ar em um ritmo lento, não menos intenso do que antes. Era diferente. Cheguei mais perto, pronto para amá-la de todas as formas e teria feito isso se não fosse por aquele toque: uma pressão quase imperceptível sobre meu peito, que por pouco não estava lá. Assim que me inclinei para um beijo, sua mão se espalmou contra meu tórax e me segurou a uma distância confortável - um limite gentil, mas firme.

- Não - sussurrou.

Afastei meu rosto para observá-la melhor.

Por vários segundos, April permaneceu de olhos fechados. Desci meus dedos por seu cabelo e ela franziu as sobrancelhas de leve, retirando a mão que havia esquecido sobre meu peito:

- Desculpa - sua voz cortou o silêncio - É um reflexo.

A força da chuva castigava as árvores lá fora.

April tentou segurar minha mão, mas eu não deixei.

Um reflexo?

Encarei seu rosto, esperando por uma explicação, mas April tratou de desviar o olhar rapidamente.

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