H U N T E R
SE EU FOSSE ESPERTO, teria fugido. Teria acordado mais cedo e escapado pela porta dos fundos. Desceria as escadas, me esgueiraria pelos degraus como um ladrão e desapareceria na rua deserta. Em um momento de desespero, cheguei até a cogitar a janela do banheiro como uma alternativa: coloquei metade do corpo para fora e calculei a altura que separava o peitoril tijolos do chão de concreto. No último segundo, desisti. A queda não valia a pena. Uma decisão estúpida, se quer saber. Fraturar o ombro teria sido mais agradável do que me sentar à mesa de café-da-manhã dos Campbell.
Brincadeiras à parte, não adiantava me esconder. A fúria das mulheres da família Campbell me encontraria onde quer que eu fosse. Não podia fugir das reprimendas furiosas e dos olhares zangados. Eu mesmo provocara aquela situação ao construir minha fama de adolescente problemático. Elas não tinham como saber que, pela primeira vez na vida, eu havia chegado em casa no meio da madrugada sem merecer a surra que levara. Eu até tentei me comportar bem ontem, mas um dos meus colegas de banda — o irmão da April, um traficante — teve problemas com uma gangue local.
Esse olho roxo? Relaxa, mãe. Foi só um desentendimento com uma gangue. Pode me passar a manteiga?
Porra.
Seria melhor se elas pensassem que eu me meti em uma briga e levei a pior.
Recostado à cadeira, eu me sentia um zumbi de uniforme. Não havia dormido o suficiente no dia anterior e isso estava estampado em meu rosto. Era como se uma nuvem de mau humor irradiasse de dentro de mim. April me odiava, Lexie queria foder com a minha vida e Cole havia conseguido nos expulsar do pub.
A única pessoa que não tinha motivos para me odiar era minha irmã e ela sequer havia olhado na minha direção uma segunda vez desde que entramos na cozinha. Isso não se tratava de uma novidade, já que sua atenção se voltava para Seth toda vez que ele marcava presença aqui em casa. Nosso hóspede sofria de uma condição incurável que o fazia acordar sempre de bom humor. Por mais assustador que fosse, Julie não se incomodava. Ela até preferia assim: juntava-se a ele sem reclamar e fazia o dobro de bagunça em um ato de solidariedade.
No fundo, eu era grato ao meu amigo por distraí-la. Fazia um dia feio lá fora e o clima na cozinha não poderia estar pior, mas minha irmã não parecia se importar com isso. Julie explodia em gargalhadas de minutos em minutos. Seria contagiante, se eu não estivesse tão fodido.
Seth jogou um grão de cereal para cima e a comeu antes que caísse no chão.
— De novo! — ela aplaudia.
— Quer tentar?
Eu sempre podia contar com ele para dar o mau exemplo.
Apesar de agirmos como tal, não estávamos sozinhos na cozinha. Nana ocupava a cadeira na minha frente, seus olhos perdidos na toalha de mesa e seus dedos agarrados firmemente ao pingente do colar em seu pescoço. Ela não repreendeu minha irmã por brincar com a comida ou por espalhar cereal pelo chão da cozinha. Compenetrada em seus pensamentos, sequer escutava a algazarra.
Passei por ela no caminho até a bancada. Coloquei duas fatias de pão na torradeira sobre o mármore e ajustei o tempo de aquecimento ao som dos gritinhos agudos de Julie. Mesmo de costas, sabia que Nana permanecia imóvel e inalterada em seu lugar. Havia me reservado o tratamento do silêncio desde o momento em que entrara pela porta da cozinha e não dera sinal de abertura. A atitude mais esperta seria deixá-la quieta em seu canto, mas algo dentro de mim insistia em se rebelar.
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BULLSHIT
Teen Fiction[EM ANDAMENTO.] April Wright tem um problema. O problema dela tem olhos azuis, um sorriso que faz suas pernas estremecerem e, principalmente, uma personalidade nem um pouco encantadora. Com muita apatia acumulada era tarde demais para qualquer coisa...