A P R I LEU PODERIA CONTAR NOS DEDOS todas as vezes em que estive em concertos de música. Naquela noite, em um barzinho mal frequentado no meio do nada, eu estava prestes a presenciar o meu quinto. Zack e meu irmão não queriam admitir, mas o ensaio aberto era um grande passo para a banda. Uma vez por mês a música deles saía de garagens e porões abafados para entreter uma plateia de pelo menos cinquenta pessoas. Seria uma experiência e tanto vê-los em cima de um palco. Eu mesma já havia escutado os garotos praticarem algumas vezes e, definitivamente, eles não recebiam nem metade do reconhecimento que mereciam.
O público reunido para assistir a The F Word consistia em uma massa homogênea de jovens da minha idade: todos estudantes de St Clair, mais precisamente da Thomas. Eles tinham sorrisos descontraídos em seus rostos, vestiam jaquetas pesadas sobre os ombros e pareciam se sentir à vontade em meio ao barulho e a sujeira. Eu imaginei que frequentar locais como esse fosse mais um dos compromissos que abri mão ao escolher não fazer parte da vida social da Thomas.
Enquanto o show não começava, nós decidimos procurar por diversão na pista de dança. Uma coletânea de músicas que ia do indie rock ao pop estourava nos alto falantes, aquecendo a plateia antes da banda subir ao palco. Não demorou muito para Zoe e Jackie descobrirem que partilhavam da mesma predileção por rock dos anos 90. Quanto a mim, eu rapidamente me dei conta de que os pesados coturnos que envolviam meus pés não foram feitos para dançar. Eram novos, de solado duro e bico reluzente. Assim que a quarta música terminou, Zoe e Jackie me acompanharam de volta ao balcão de madeira.
Uma camada fina de suor cobria a minha pele e minha garganta implorava por mais uma rodada. Eu estava pronta para virar meu segundo shot da noite quando uma movimentação nos fundos do bar nos chamou a atenção.
Finch e Cole entraram no palco primeiro, dispensando qualquer anúncio. Um coro de incentivos varreu os quatro cantos do pub e eu não resisti: comecei a bater palmas cheia de orgulho. Meu irmão se sentou atrás da bateria com uma expressão compenetrada no rosto, girando as baquetas entre os dedos; muito diferente de Finch, que se acabava de rir com as palhaçadas dos amigos misturados à plateia. O garoto desviou dos cabos espalhados pelo chão e conectou a guitarra ao equipamento de som. Hunter e Zack foram os últimos a surgir de trás da cortina, empurrados por Seth. Os dois ainda conversavam quando o ruivo desceu, se misturando à multidão.
— Não consigo ver nada daqui — Zoe gritou por cima do barulho.
Ela estava certa. Além da distância, um mar de adolescentes de todas as alturas nos separava dos meninos. Teríamos que fazer bem mais do que apenas esticar o pescoço se quiséssemos enxergar alguma coisa do show. Antes que eu pudesse concordar, Jackie bateu o copo de vidro na bancada e se voltou para nós duas:
— Tudo bem, eu estou indo para lá — a morena se pôs de pé, alinhando as roupas sobre os ombros — Quem vem comigo?
Zoe não precisou ouvir mais encorajamentos. Ela desceu do banco com um pulo e aterrissou no chão como um gato. Nós duas abrimos caminho pela multidão agitada, serpenteando pelos corpos suados sem nunca perder os cachos castanhos de Jackie de vista. A morena só parou quando alcançamos um lugar na platéia com vista privilegiada para o par de all stars sujos do vocalista. Zack não nos percebeu ali. Ele continuou distraído entre os equipamentos de som e a plateia barulhenta.
Em cima do palco, Finch testava algumas notas de guitarra, provocando o público. Ele se inclinava para ouvir a reação das meninas e se exibia, habilidoso. Estávamos tão próximas dos alto falantes que eu mal conseguia ouvir a minha própria risada. Enquanto a multidão urrava com o solo de guitarra, Zack se aproximou da beirada do palco. Ele arrastou o pedestal do microfone consigo, sem se preocupar com o emaranhado de cabos reunidos aos seus pés, e repousou as mãos ao redor da base. Para o vocalista, fazer música era coisa séria. Não havia distinção entre a plateia alcoolizada do pub e um estádio lotado cheio de fãs. Aquela era a única chance que ele tinha de provar para deus e o mundo que as horas que dedicou à banda não foram em vão.
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BULLSHIT
Teen Fiction[EM ANDAMENTO.] April Wright tem um problema. O problema dela tem olhos azuis, um sorriso que faz suas pernas estremecerem e, principalmente, uma personalidade nem um pouco encantadora. Com muita apatia acumulada era tarde demais para qualquer coisa...