A P R I LESTAVA ESCURO LÁ FORA quando eu liguei a televisão da sala. Clarões repetitivos iluminaram as paredes e preencheram o cômodo de cores. As conversas animadas afugentaram o silêncio e, de repente, eu já não me sentia mais tão sozinha em casa.
Naquela noite, eu havia conseguido me arrumar para a festa de Finch em tempo recorde. Isso impressionou Cole, que me daria uma carona, mas não a ponto de fazê-lo andar mais rápido. Nada no mundo era capaz de tirar meu irmão de seus eixos. Cole fazia tudo quando queria, da maneira que desejava, sem grandes motivações além de sua simples vontade — e que o mundo se adequasse às suas regras.
Enquanto esperava por meu irmão, capturei meu olhar distraído no espelho acima do aparador. Me aproximei da superfície, encarando meu reflexo. Não de um jeito narcisista, claro; estava apenas conferindo: um par de olhos castanhos, cílios espessos e lábios carnudos pintados de vinho. Tudo continuava igual, assim como da última vez que chequei, mas eu me sentia diferente.
Eu estava preenchida por uma sensação desconhecida. Começava no meu estômago frio e se espalhava por meu corpo aquecido, cheio de expectativa. Era como se eu estivesse nua, despida de todas as minhas mentiras. Nem minha melhor cara de blefe poderia esconder minha excitação.
Um sorriso escorregou pelos meus lábios. Sozinha na sala de estar, procurando no espelho algo invisível escondido entre minhas feições.
Onde eu estava com a cabeça?
Era fácil responder aquela pergunta.
Nas próximas horas, eu seria apenas uma refém das minhas expectativas. Ansiosa por seus toques e por seus beijos. Com fome de seu gosto e calor. Eu havia passado tanto tempo presa naquele jogo de gato e rato com Campbell que não conseguia acreditar que aquela noite era real.
Finalmente eu teria o que tanto desejava.
Só havia um empecilho. Uma pequena pedra no meu sapato que me impedia de relaxar. Era uma voz teimosa que crescia dentro de mim e insistia em me afundar cada vez mais em seus questionamentos.
Por que Hunter me fez esperar tanto? O que ele ganhava com isso?
Ele só poderia ter feito isso tudo por duas razões: prazer em me controlar ou puro capricho. Eu poderia entender se fosse por um desses motivos. Não eram ruins. Mas também não funcionavam como respostas boas o suficiente. Simplesmente não bastavam. Meu cérebro continuava com indagações.
Qual seria a consequência dessa noite?
Meu sorriso morreu um pouco.
Quando eu tinha os braços dele em torno de mim, não pensava em nenhuma dessas possibilidades. Era infinitamente mais simples — não havia nada para questionar quando meu cérebro parecia se derreter junto com minhas roupas.
Eu não queria alimentar aquela ideia patética, mas a ligação da noite anterior mexeu com a minha mente. Às vezes parecia que Hunter me mantinha por perto — sempre quente e luxuriosa — por ser a única maneira que ele conhecia de se aproximar. A possibilidade deixava minha boca seca e meu estômago frio, mas eu não era uma mulher de sentir medo.
Era só Hunter. Sorrisinhos arrogantes, sedução barata e um senso de humor altamente corrosivo — sedento por sexo.
Uma vez que eu visse o rosto dele, eu me sentiria segura. Toda aquela loucura não passava de um mal entendido.
— Certo — murmurei para mim mesma, conferindo meu reflexo uma última vez.
Cheguei tão perto quanto o móvel abaixo do espelho permitiu, apoiando minhas mãos contra a madeira maciça. Precisava me assegurar de que a minha autoconfiança ainda estava lá: firmemente atrelada ao fundo das minhas íris castanhas, irradiando de cada fio do meu cabelo.
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BULLSHIT
Ficção Adolescente[EM ANDAMENTO.] April Wright tem um problema. O problema dela tem olhos azuis, um sorriso que faz suas pernas estremecerem e, principalmente, uma personalidade nem um pouco encantadora. Com muita apatia acumulada era tarde demais para qualquer coisa...