17 | scarlet

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Nada de resposta.

Nada de Nea.

Scarlet bufou, bloqueando a tela do celular, debruçando os cotovelos no parapeito da janela do quarto, repousando o queixo sobre as mãos, os olhos observando o jardim do quintal da casa ao lado – da casa de Nea. Fazia mais de vinte e cinco minutos desde que enviara uma mensagem perguntando se podiam ir até Kahi juntos e, mesmo que sua casa não ficasse tão longe assim da floricultura, o rapaz não deveria ter demorado tanto. Parecia até paranoia, mas Scarlet sempre sabia quando Nea chegava; escutava o som do furin lá da entrada, de quando o via dar um oi silencioso às carpas do jardim.

Sua visão captou um movimento, o coração ansioso, e viu uma figura meio curvada na varanda de madeira, as carpas coloridas se agitando. Ah. Era Masamune. O velho parecia murmurar alguma coisa às carpas enquanto a água cristalina ondulava com a comida que jogava. Parecia alheio à ausência estranha do neto.

Todo mundo, na verdade.

Ou pelo menos ela e Misha.

Desde que voltaram do primeiro encontro após aquela pedra cair do céu, Nea parecia mais calado do que o costume, os olhos meio vagos, como se divagassem em uma floresta branca sem uma trilha exata para onde seguir. Scarlet havia percebido quando Misha tagarelava – como sempre – e o amigo não piscava para mostrar interesse. Apenas olhava a um ponto qualquer, entre ser e não estar.

O pior foi quando ela tentou se aproximar dele e o rapaz não reagiu. Não reagiu a uma investida dela – um evento tão raro quanto suas mães decidiam preparar um smokva.

Qualquer um acharia Nea estranho pelo simples fato de ser quieto, mas ela sabia que a quietude que emanava dele era estranha.

Muito estranha.

Scarlet limpou a garganta, colocando uma mecha do cabelo ruivo atrás da orelha e gritou:

Masamune-san!

As carpas agitaram as caudas translucidas na água como se assustadas, e o velho ergueu o rosto enrugado para cima. Os olhos repuxados dele sorriram ao vê-la.

— Nea já chegou em casa? – ela gritou outra vez, engolindo em seco.

Masamune negou com a cabeça.

— Talvez ainda esteja ajudando na floricultura – a voz tranquila dele chegou até ela, seguido de um suspiro.

Scarlet, pare de gritar! – replicou sua mãe lá da cozinha em russo.

Eu não estou gritando! – Scarlet formou uma careta e voltou ao velho. – Obrigada, Masamune-san.

Ele fez uma reverencia com um sorriso gentil e sentou-se na varanda, entretido com as carpas. Scarlet fez um bico, dando outra olhada no celular que vibrou – uma ligação de Kahi.

— Que?

Meu humor não está dos melhores para esperar seu namorado, Scar – o tom de Kahi era de puro desinteresse. – Misha chega daqui a cinco minutos. Não podemos demorar com isso.

Scarlet suspirou com um revirar de olhos.

— Já estou saindo, mãe III.

E desligou. Seus olhos desceram até o jardim outra vez, os ouvidos atentos ao sonido fraco do furin com a brisa que passava, oscilando a folhagem das árvores do quintal. Ela queria poder ir até a floricultura só para variar, mas ir de um ponto a outro era muito demorado – e deixar Kahi sozinha era perigoso também.

Scarlet odiava ter conversas longas com Misha, porém, todo aquele silêncio não era o silencio de Nea. 

Their war, our curse - FBTG Livro 3Onde histórias criam vida. Descubra agora