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Acordo e olho pra janela vendo que já era noite e estava tudo muito quieto do lado de fora, exceto pelo barulho alto do meu lado que me faz virar o corpo rápido sentindo tudo doer.

Ao ver Maria Júlia se debatendo na cama aperto o botão ao lado da cama que chama algum médico e tento me levantar para a ajudar enquanto ela coloca a mão no peito como se pedisse socorro.

Não demorou muito e a equipe médica entra e uma enfermeira me faz deitar na minha cama e passa uma espécie de cortina entre nossas camas.

— ataque cardíaco, carrega em 200... Afastar. - ouço o barulho do seu corpo entrar em contato com o choque.

Fecho os olhos iniciando uma oração, mesmo não sendo uma pessoa muito religiosa eu acredito sim em Deus e que ele é o senhor dos milagres.

Durante toda oração eu clamava pela vida da minha esposa por termos dois filhos pequenos para criar juntos, uma vida toda pela frente. Ela é sim minha alma gêmea e eu não saberia viver sem ela.

Sabe quando você olha nos olhos da pessoa e seu mundo para? Quando você passa a viver pela e por aquela pessoa, que palavras nunca vão ser suficiente para descrever tudo que sente pois o sentimento é muito maior que algo que possa ser descrito. Você a toca e a torna sua vida, a felicidade dela é a sua, cada momento junto compartilhado é um novo motivo para a amar e os pequenos detalhes do olhar, sorriso e as brincadeiras que te fazem amar mais e mais a cada dia.
O toque
A fala
A vida
Os momentos...
São uma coleção de memórias construídas que quando você vê sente a necessidade de ficar ao lado dela o tempo todo, abraçando, beijando, se amando. Nem um espaço de tempos é suficiente para suprir a falta do carinho quando estão longes.

Respiro fundo abrindo os olhos notando que sequer tinha ouvido nada ou visto. Meu rosto estava molhado por lágrimas e a cortina aberta com a minha esposa pálida e entubada ao meu lado.

Levanto devagar e vou até ela deixando um beijo na sua bochecha e volto pra cama me deitando de lado, mesmo sendo desconfortável eu iria vigiar ela a noite toda se preciso, mas nada iria passar despercebido enquanto eu estivesse lá, do lado dela...

•••

Hoje eu finalmente ganhei alta, porém a Maria Júlia continua entubada e sedada após o ataque ela teve uma piora no quadro dela a fez regredir. Não respira sozinha, não se alimenta sozinha, sequer se meche. O meu único consolo e ver seu peito subir e descer com a indicação de que ela respira e a máquina que apita mostrando seus batimentos cardíacos a cada segundo e nesse fio de esperança que eu me agarrei nessas duas noites em que passei em claro vigiando para que não acontecesse nada sem que eu estivesse preparado.

— Renato sua família chegou pra te buscar e já avisamos do quadro da Maria Júlia e que ela vai subir para a UTI novamente sob supervisão do cardiologista chefe.

— por favor, me liga caso aconteça qualquer coisa. Ela é a minha vida e a dos nossos filhos. - peço e o médico assente e vem até mim com uma cadeira de rodas.

Levanto e vou até a cama da minha esposa segurando sua mão vendo sua aliança de casamento ali solitária.

Levo sua mão até meus lábios, deixando um beijo no dorço e me abaixo deixando um beijo na sua testa.

— volta pra nós vida. Precisamos de você aqui com a gente, eu preciso de você. Vamos viver nossa eternidade juntos, é ao seu lado que eu vou envelhecer. - sussurro no seu ouvido e me sento na cadeira de rodas sendo levado pra fora do quarto aonde meu amor estava.

— oi filho, vamos pra casa que a mamãe vai cuidar de você e te dar muito carinho e logo mais a gente volta pra buscar a Maria Júlia e vamos cuidar de vocês juntos. - minha mãe fala me abraçando me fazendo retribuir com o braço bom.

Durante o caminho para o estacionamento meu pai que empurrava a cadeira, vejo o Gui com o Jetta me esperando e vem ajudar meu pai quando vou pra entrar no carro ao seu lado.

— é bom ver você bem irmão, senti saudades. - fala me fazendo sorrir fraco.

— também senti Gui.

Durante o caminho tocava uma música baixa, já que minha cabeça ainda doía um pouco e eu ainda tomava alguns remédios para ajudar a parar essa dor.

Logo chegamos na mansão e com ajuda do meu irmão e do meu pai saio do carro e ando com ajuda do Gui, já que meus joelhos doem um pouco e também se encontram inchados.

Caminho devagar com meu irmão e meus pais ao lado conversando e subimos pra sala ouvindo conversas altas e logo que entro vejo todos batendo palmas animados, e cada um vem me abraçar falando algumas coisas tocantes.

Com ajuda do Gui que ainda me segurava, sento no sofá sentindo um certo alívio.

— vovó cadê papai? - ouço a voz do meu pequeno que é mais que esperto que qualquer criança da sua idade.

Vejo minha mãe vir no corredor com Nicolas que já se agita no colo da minha mãe pra correr até mim e assim faz sendo segurado pelo Renan antes de pular em cima de mim.

Mas um pouco da angústia que sentia se vai ao sentir seu abraço me fazendo o abraçar apertado sentindo uma vontade enorme de chorar por lembrar de vê-lo quase morto na ambulância.

— eu te amo filho, te amo, te amo, te amo. - seguro seu rosto vendo uma manchinhas roxas na sua bochecha e na testa, uma faixa enrolada no braço e um curativo na perna.

— sodadi papai. Eu machucou olha. - me mostra o braço com a faixa e eu beijo o mesmo sabendo que a Maju sempre faz isso quando eles se machucam.

— eu vi que você machucou filho. Desculpa o papai? - peço o olhando nos olhos e ele sorri inocente e me abraça denovo.

— papai, tá tudo bem já. Eu cuidou do Theozinho e até ajudei a vovó a dar teté pra ele poque ele tava chorando.

— e você ajudou a vovó e quem mais? - pergunto e ele ri.

— eu gavou com tio Gui e o tio Thiago buscou a pelola pa bincar e o tio nan buscou a amola e a tia Ana, papai o tio Léo faz cocô na calça. - fala como se fosse um segredo fazendo todos rirem.

— quem te falou isso filho?

— o tio boquinha né! - fala como se fosse óbvio me fazendo rir com a esperteza dele.

Durante a tarde, todos nós conversamos e eu contei tudo que realmente aconteceu e tudo que vi e senti, até hoje pelo menos...

Theo acordou uns minutos depois do almoço e foi outro que grudou e não quis sair de perto, ainda mais quando eles dois perguntavam da mãe de dois em dois minutos e eu engolia pra não falar.

Eu tenho que ser forte pela minha família e pela minha esposa e eu vou atrás de justiça.

Nós dois - Renato Garcia ( parte dois de "tudo acontece por um motivo" )Onde histórias criam vida. Descubra agora