Ban estava de volta na clareira, sozinho.
Alguns dragões até tentaram se aproximar, uma salamandra especificamente, porém, ninguém conseguiu tirar o semblante de tristeza de seu rosto. O longo cabelo preto, solto, era tudo que impedia os pokémons de verem algumas parcas águas em suas bochechas, pois ele deixava a cabeça pender para as seis pokébolas espalhadas na relva
Desde que chegara com Stella no início da noite, o treinador ficou sentado, sentindo o remorso ao lembrar de tempo que teve com uma garota mentirosa que aprendeu a chamar de amiga.
O desejo dele de ficar só era tão grande, que Ban até esqueceu de dizer obrigado aos dois oficiais que os deixaram ir em uma das motos, já que os outros dois, os que haviam sido derrotados, foram para Viridian.
Stella ficou ali com ele, por um tempo. O abraçara, dividiram o silêncio, mas por fim, saíra em direção a Pallet, dizendo que tinha coisas urgentes a resolver na cidade.
Ban pensou sentir um pouco de raiva. O que poderia ser mais importante? Queria ficar só, mas queria ficar só com ela, embora não tenha a dito, fazendo apenas um aceno imperceptível com a cabeça quando ela se despediu.
- Stella disse que ainda estaria se lamentando no meio da clareira quando eu chegasse. – A voz do Professor Carvalho o fez se virar em sua direção.
Ele abandonara seu avental e usava trajes mais caseiros: uma calça de moletom e uma blusa grande azulada de gola. Somando as vestes com aquelas mãos no bolso da calça e o óculos arredondado em seu rosto, o Professor Carvalho tinha se tornado mais de que nunca no Vovô Carvalho.
Vários pokémons o cumprimentaram, o recebendo com carinho e conversando com ele. No entanto, todos mantiveram a distância quando ele foi até o treinador.
- Não foi sua culpa Ban. – O Professor suspirou. – Stella me contou tudo. O irmão daquela menina já estava com o tempo contado.
Ela tinha coisas urgentes a resolver é? Stella... O menino abraçou as próprias pernas e não respondeu.
- Ban... – O Professor se sentou ao seu lado, vendo as pokébolas. – Fico feliz que tenha os recuperado.
- É...
Aquele vovô ficou pensando no que dizer, em como o confortar. Embora, mesmo ali tão próximos, aqueles dois nunca estiveram tão distantes desde a morte do pai de Ban. Era como se um muro maciço tivesse se erguido entre eles e ambos sabiam o porquê.
Mas a melhor forma de reconstruir laços e derrubar barreiras é reconhecendo o próprio erro. E dando o primeiro, e mais difícil, passo.
- Eu... - O senhor respirou fundo, sem saber como começar. – Eu disse várias coisas injustas a você Ban. Falei o que não deveria e... – O Professor apertou algo em seu bolso. – Eu tive medo. Medo de perdê-lo como perdi seu pai. E este velho aqui achou que a história estava se repetindo e ficou surdo para o seu pedido. Você nunca fez algo para que eu duvidasse daquela maneira, mas não queria te perder. Não queria e não quero. O amo demais para isso, menino. – Algumas lágrimas caíram de seus olhos. – Peço que me perdoe. Sou um velho sábio, mas até mesmo velhos sábios ainda tem muito para aprender.
O Professor esticou a mão, parando antes de o tocar, não sabendo se seria prudente. Eles tinham que recomeçar. Mesmo amigos, algumas vezes tem que recomeçar. E, por isso, completou o gesto, pegando naquele ombro que voltava a ganhar músculos.
Ban virou seu rosto para o Professor. Um rosto molhado e cheio de tristeza.
Uma tristeza que o consumia.
- Eu não consegui dizer nada a ela. Nada. Ana simplesmente se foi. – A voz do menino saia trêmula. – Eu perdi meu pai Professor e o senhor esteve aqui por mim, sempre ao meu lado. E Stella estava aqui, também. Eu sempre tive alguém. Mas ela... ela disse que só tinha o irmão. – As lágrimas desciam como se apostassem corrida. – Ela não vai ter ninguém. E eu não pude fazer nada para ajudar isto.
- Ban. – Aquele vovô respirou fundo. – Você já fez tudo. Você e Stella, pelo que ela me contou. Vocês a deram felicidade. A deram um lugar para se lembrar dos tempos felizes que tiveram.
- De que adianta uma boa lembrança, se ela é só uma lembrança?
- Ban... – O Professor passou o braço pelos ombros do garoto. – Você é gentil demais para este mundo Ban. – Ele o segurava com força. – Não posso dizer muito para ajudá-lo. Eu não a conheci direito, mas posso devolver algo a você, para o fazer ficar melhor.
De dentro do bolso, o Professor tirou um objeto vermelho. Por sorte, mesmo que no mais terrível pesar, um sorriso talvez pudesse aparecer no rosto daquele jovem, quando ele visse o que o significava ter a pokédex de volta. Ele queria dar algum conforto ao menino que passou a ver como um filho. Ele só queria fazer algo para ele parasse de sofrer um pouco.
Talvez. Só talvez...
E como errou.
Ban pegou a pokédex e arremessou no ar.
- Eu não quero esta merda. – O menino soluçou. – Não agora!
Ambos se calaram por um tempo, deixando o vento passar e ficaram apenas abraçados.
- Diga-me Professor. – Ban parou, se virando para focar nos olhos por detrás daqueles óculos. – Por quê? Por que dói tanto? Por que parece que eu falhei?
O Professor suspirou.
- Porque quando amamos alguém de verdade e os vemos sofrer... sofremos juntos.
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Pokémon - Um Conto de Ladrão
Hayran KurguNinguém sonha em ser um ladrão, você se torna um pela necessidade. Porém existe um motivo realmente plausível para nos transformar em um fora da lei ou apenas justificamos nossas ações, inventando mentiras para realizarmos desejos egoístas? A vida f...