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- Seu pescoço tá vermelho.
- Pois é.
- parece que foi picado por um inseto.
- Acontece.
- Acontece?
- É.
- Se você diz.

  10:34 PM. Tomas já aparenta estar bêbado. Sua cara de sono entrega isso, mas ele se recusa a fazer algo além de só ficar sentado ali com essa cara de idiota.
- Você vai dormir? - Ele pergunta.
- Não sei.
- Você sempre tem dificuldade pra dormir?
- Na maioria das vezes.
- Isso não te incomoda?
- Quando se acostuma, isso vira parte de você.
- Então você deve ser assim desde criança? Porque eu não consigo imaginar alguém se acostumando com isso tão fácil.
- Talvez.
- É virgem?
- Não.
- E como foi?
- O que?
- Sua primeira vez. Conta aí.
- Foi normal, eu acho.
- Gostava dela? Dele?
- Eu gostava dela. Foi a primeira vez que senti algo tão forte por alguém. Ela era chata e irritante às vezes, mas eu gostava dela.
- Entendi.
- E você?
- É, eu sou virgem. Engraçado, né?
- Por que eu acharia isso engraçado?
- Aposto que achava que eu não era.
- Eu nem cheguei a pensar nisso.
- Cê é um cara legal. Parece ser do tipo que diz a verdade, não importando os sentimentos dos outros.
- O que te faz achar isso?
- Cara, a gente vive num tempo onde as pessoas não falam a verdade e que preferem inventar uma deculpa só para não deixar os outros ou elas mesmas deprimidas. É bem retórico, mas você não precisa entender.
- Hm... Então você acha que ser falso é melhor do que ser honesto? Para não magoar a pessoa?
- Sim.
- Não concordo com isso. Na verdade, é bem idiota. Porque se fosse desse jeito, os caras não teriam te batido na festa.
- Mas-
- Ou pelo menos, alguém teria te ajudado, mas pelo visto isso não rolou. Te deixaram reprimido e você não revidou.
- Isso é porque eu... sou motivo de piada. Não sou inteligente, nem forte, nem esportivo, nem tenho popularidade nenhuma. Eles me tratam como se eu fosse um fracassado e não é como se eu os culpasse por isso.
- Você é só um idiota que tem medo de revidar, tem medo de se defender. E não importa o que você fale contra isso, sabe que é verdade.
- Talvez você tenha razão. Talvez eu só tenha medo...
  Olho para a garrafa de vodka e já tinha acabado o que restava da garrafa também. O último pouco que tinha estava no meu copo e no copo de Tomas e ainda nem são onze horas.
- Que merda. - Sussurro.
- O que foi?
- A bebida acabou. Sabe se aquele lugar ainda tá aberto?
- Lá fecha às meia noite. Geralmente.
- Acho que não tenho muita escolha. - Pego minha mochila, tiro uma nota de vinte de dentro e a jogo de volta no canto da cama. - Vem junto?
- Sim, preciso andar um pouco.
  Eu me levanto da cama e sinto uma tontura, me fazendo quase cair na cama de novo.
- Tá foda. - Ele dá umas risadas.
- Aí, me ajuda a levantar. - Ele estica a mão para mim, eu o seguro e o puxo para frente; sem ter controle da minha força, ele acaba caindo da cama batendo o rosto no chão. Preciso tomar mais cuidado com a minha força agora... Perder o controle dessa forma nunca aconteceu antes. Ele levanta com a mão na boca, agora parecendo sem sono. - Puta merda. Você puxou rápido demais. Vê se tá sangrando.
- Não tá.
- Vê logo. - Ele tira a mão da boca e não parece que algo está sangrando. - E então?
- Parece que você bateu mais o queixo, não tá sangrando. Vamos logo.
- Meu nariz tá doendo pra caralho.
- Cala a boca. Cê nem tá sentindo nada.
  Coloco de volta o All Star e saímos do quarto. O som da música que vem de fora do dormitório parece ter ficado mais alto, sendo ainda mais desconfortável. Há alunos pelo corredor do dormitório, conversando, bebendo e alguns até se pegando. Uma grande suruba infernal até a saída... Que desafio. E esses alunos desmaiados no caminho não ajudam. Passo por eles e consigo sair pouco antes de Tomas, esse lugar tá uma bagunça e é claro que aqui consegue estar pior ainda...
  Mais e mais alunos espalhados pelo campo e todos pareciam estar muito bêbados assim como o resto. Não sei o motivo dessa festa e também não me importo, mas acho que dão liberdade demais para esses alunos.
  Chegamos na cerca aberta atrás da escola e Tomas passa para o outro lado primeiro.
- Está mais aberta do que quando passamos por aqui.
- Uhum.
  Voltamos a mesma lanchonete de antes, mas agora não tinha ninguém além do cara que vendeu a bebida para nós mais cedo. Sentado em uma cadeira de plástico, assistindo um jogo de basquete com uma garrafa pequena de cerveja na mão, com a aparência mais acabada do que estava mais cedo. Nos aproximamos dele, ele me olha parecendo deprimido, mas paro de olhar em seus olhos antes que reparo mais coisas...
- Ah, são vocês. - Ele diz com a voz meio grogue e rouca. - O que querem agora?
- O mesmo de antes. Só que um energético maior. Tem de dois litros?
- Sim... Tem sim. Vocês não são fracos mesmo, hein? - Ele se levanta da cadeira. - Bom, isso é... Você, pelo menos. - Ele aponta o dedo para mim. - Você tá muito com cara de bêbado e parece que vai vomitar a noite inteira, mas parece que aguenta mais.
- É um especialista de bêbados por acaso? - Enquanto caminha para o balcão, ele dá uma risada do que eu disse.
- Mas não tenho nada a ver com isso, não é?
- Tomas, tem algum dinheiro?
- Tenho, mas é pouco.
- Pode me dar? - Ele me entrega quatro notas de um dólar e algumas moedas.
- Ficou vinte e três.
  Dou o dinheiro pro cara e ele me entrega as bebidas dentro de duas sacolas e tornamos a sair da lanchonete sem dizer mais nada.
- Esse som tá muito alto. - Diz Tomas quando chegamos na grade da escola. - O mais impressionante é em como ninguém reclamou disso até agora.
  Agora no quarto, jogo o All Star no canto do quarto e quando me sento na beira da cama, a tontura volta com tudo. Leva um tempo até minha vista se estabilizar ao menos um pouco e eu pensar no que fazer agora.
- Ei, cara? Cê tá legal? - Tiro o canivete do bolso, deixando de baixo do travesseiro. Tiro as garrafas da sacola e Tomas fecha a porta do quarto. Me sinto estranhamente bem, apesar da tontura. As coisas parecem mais simples agora que não tenho que pensar e nem sentir os meus problemas incomodando. Abro a vodka, o energético e agora já estou num ponto onde o copo tem que ter mais vodka que energético. Agora eu não estou nenhum pouco afim de fumar outro cigarro, meu pulso está ardendo um pouco, dando uma sensação de coceira e não sei se é por causa disso, mas algo está afetando o resto do meu corpo também, me deixando dormente. Pego o isqueiro e só fico com ele na mão enquanto bebo esse primeiro copo...

  12:32 AM. O tempo passa, sem falar nada, só bebendo e ouvindo essa música merda que vem do ginásio. Tomas me encara com o olhar sonolento, de novo. Termino de tomar mais um copo com mistura, o deixando sobre a mesa de cabeceira.
- O que foi? - Pergunto.
- Cê sabe o que quer ser quando for mais velho?
- Não. Não sei se vou chegar nessa idade para decidir o que quero ser.
- Entendo...
- E você?
- Bom, eu sempre admirei Biologia, mas... Também não sei se vou estar vivo para realizar isso.
- Sei. Não tá bebendo? Ainda tem bastante.
- Já tô tontasso, cara... Acho que vou deixar descer um pouco.
- É?
- É.
- Vomitar vai ser melhor. O efeito abaixar um pouco.
- Será?
- Sei lá.
- Então... - Ele vira o pouco que restava no su copo. - Arruma essa vodka no meu copo.
- Só a vodka?
- É. Isso com certeza vai me fazer vomitar.
- Vê se não suja o chão.
  Pego a garrafa e viro em seu copo, prestes a chegar na metade, ele diz pra parar.
- Acho que vou me arrepender disso.
- Anda logo. - Ele faz o que eu digo, se sentindo desafiado, mando a bebida toda pra dentro da garganta. Ele arremessa o copo no chão e sai correndo pra fora do quarto com a mão tampando a boca. Isso foi engraçado... Com a garrafa em mão, eu o sigo até o banheiro, ignorando as pessoas no corredor. Quando entro no banheiro, ouço ele botar tudo pra fora em uma privada ao lado. Bato na porta e pouco depois, ele para de se engasgar com o próprio vômito.
- Quem é?
- Abre aí.
- Ah, tá. Só um minuto... - Ele destranca a porta do banheiro e cai no chão.
- Parece que cê vomitou tudo que comeu hoje. - Ele ri.
- É o que parece. - Ofereço a garrafa para ele e ele faz careta. - Argh, não. Valeu.
- Consegue levantar?
- Não. Tô com muito sono...
- Porra, essa foi uma ideia meio merda. Acho que não tenho outra escolha então...
- Hm?







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