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  05:02 PM. Acabo de acordar com Anna junto a mim e pelo horário já está bem tarde. Me levanto sem acordar ela e vou até o quarto da minha mãe, onde ela também está desmaida na cama com uma garrafa de uísque pela metade no chão. Encosto a mão no rosto de Anna e ela abre os olhos.
- Ethan...
- Oi?
- Quem é Lara?
- Hm...?
- Ouvi você sussurrar esse nome enquanto dormia. - Ainda com minha mão no seu rosto, acaricio sua bochecha.
- É o nome dela.
- "Dela"? Do tal demônio que tinha mencionado antes?
- Acho que "demônio" não é a forma da qual devo me referir a ela.
- E qual seria?
- Talvez amiga de infância?
- Por que?
- Ela sempre esteve comigo. Desde quando eu era criança.
- Você se lembra da sua infância?
- Não, mas ela me disse.
- Isso tá ficando cada vez mais preocupante.
- Eu disse para não se preocupar. É só uma coisa idiota.

  06:47 PM. Já estava começando a escurecer... O sol já está se pondo e passamos o tempo no quarto apenas conversando sobre coisas aleatórias e tomando a bebida quente que ficou aqui no quarto.
- E o seu pai? - Ela pergunta. - Não visita ele?
- Não. Não sei onde ele mora e mesmo se soubesse, eu ainda não iria.
- Por que?
- Pessoalmente, eu nunca cheguei a ver ele. O que conheço dele é só histórias que minha mãe me contou.
- Histórias... boas?
- Muito pelo contrário.
- Não parece ser uma pessoa tão agradável então. - Meu quarto já está escuro com o crepúsculo acontencendo lá fora, deixando o céu meio rosa e laranjado. - Bonito, não é?
- Isso não acontece com muita frequência.
- Pelo menos, não por esse lado da cidade.
- Vamos. Vou te levar pra casa. - Tomo o pouco que restava na garrafa.
- Temos que ir agora mesmo?
- Uhum ou vai ficar muito tarde pra você ir embora.
- Eu queria que pudéssemos... aproveitar mais.
- Eu sei, eu também queria. - Ela segura meu rosto com as duas mãos e começa a me beijar com cada vez mais vontade. Apoio minha mão na sua coxa e ela continua levando isso cada vez mais além. - Está mesmo pretendendo fazer isso agora, não é?
- Qual o problema? Sua mãe está dormindo. É só nós fazer silêncio. 
- Esse é o problema. Ela não tá mais dormindo.
- Ah, como você sabe?
- Ela tá sentada na sala.
- Droga...
- Mas não precisa ficar tão chateada. Teremos nosso próprio tempo.
- Claro. Vou ser paciente.
- Eu sei que vai.
- Por enquanto.
- Por enquanto...
  Abro a porta do quarto e seu olhar foca em mim, sentada no sofá com o cabelo bagunçado, parece estar com uma enxaqueca bem merda depois de ter bebido mais cedo....
- Anna.
- Oi, senhora.
- Já vai embora?
- Sim.
- Entendo. Espero que chegue bem em casa. - Ela sorri.
- Obrigada.
- Enfim... Vamos?
- Sim, vamos. Senhora... er...
- Elaine. Pode me chamar assim. Ele nunca te disse meu nome?
- Não, mas também nunca perguntei. Até mais, senhora Elaine.
- Até. Espero vê-la mais vezes.
  Abro a porta da sala e deixo Anna sair na frente. Coloco minhas mãos no bolso da calça e ela entrelaça o seu braço no meu.
- Pensando bem, sua camiseta ainda tá comigo.
- Você também deixou a sua aqui. Não quero voltar só pra pegar, então você leva da próxima vez que vier.
- Tá certo.
- Você pode me entregar a minha amanhã na escola.

  Passamos em frente ao parque que havia alguns garotos brincando com uma bola e alguns idosos que ficaram nos encarando, a mesma praça em que eu a encontrei pela primeira vez, sozinha e triste em baixo daquela mesma árvore que encaramos por um tempo. Dessa vez, ela faz brincadeiras e sorri pelo caminho todo... Ela é muito animada quando quer, diferente de mim que não sei controlar este tipo de humor. Ainda não entendo o que faz ela gostar de alguém como eu, mas talvez seja a mesma coisa que faz eu gostar dela...
- Chegamos.
- Você quer entrar?
- Por que?
- Conhecer minha família? Eu já conheci a sua, então acho justo você passar por isso também.
- Por mim tudo bem, mas quer mesmo fazer isso agora? Nós acabamos de beber uma garrafa e as suas mãos começaram a tremer de repente.
- Sabe, a bebida me deixou animada. Pelos próximos 30 segundos, eu tô com um pouco de coragem.
- Sei.
- Acho difícil prolongar isso, então vamos logo.
  Ela abre a porta de sua casa e vejo Sam jogando vídeo-game na sala, parecendo focado. Anna tira o seu All Star e cutuca o ombro dele, fazendo ele perder o foco. Ela passa pelo corredor, indo até a cozinha com passos acelerados, enquanto espero na entrada da sala. Sam olha pra mim, tira o fone do ouvido e parece surpreso ao me ver com Anna novamente.
- E ae, Ethan. O que faz aqui?
- Vim trazer Anna.
- Então ela estava com você.
- Uhum.
- Aí, sabe jogar?
- O que tá jogando?
- Não faço ideia. Comprei esse jogo ontem e até agora tô adorando.
- Entendi. - Ele desconecta o fone e eu me sento do seu lado.
- NAMORADO?! - Ouço uma vez feminina gritar da cozinha, enquanto eu e Sam estava jogando 1x1, apesar de já ter perdido várias vezes para ele. Acho que essa deve ser a mãe deles.
- Então... vocês estão namorando agora?
- É.
- Desde quando?
- Desde sexta.
- Entendi. Bom, se for com você, acho que tudo bem.
- Hm...
- É cara. O jeito que ela olhava pra você naquela festa na casa de Laura e em todas as vezes que saímos todos juntos, ela não olhava daquele jeito pra mais ninguém. E se você também gosta dela, então qual o problema? Contanto que não a machuque também.
- "Também"?
- Aah... Cê perdeu de novo. - Ele muda de assunto.
- Eu disse que não era muito bom.
- Você disse que sabia jogar um pouco.
- E quanto a você e Laura? Continuam ficando?
- Pra ser sincero, cara... - Ele diminui o tom. - Tem vezes que eu vou na casa dela mesmo depois daquela vez.
- Entendo.
- Ela é boa em tudo. Se é que você me entende.
- É, eu entendi. Sem informações desnecessárias.
  Ele dá uma risada e Anna aparece do corredor com sua mãe ao lado. Ela tinha quase o meu tamanho, um pouco mais baixa, cabelo liso até a cintura, castanho claro. Estava enchugando a mão molhada no avental de cozinha que estava usando. Eu me levanto e ela para na minha frente. 
- Olá. - Ela sorri, quando encaro seus olhos expressando aflição. - Me chamo Suzane, mas pode me chamar de Suzan. - Ela estica a mão para mim.
- Ethan. - Aperto sua mão e estava um pouco úmida e com gordura.
- Sinto muito, eu estava mexendo com massa, fazendo pastel para vender amanhã no parque.
- Sem problema.
- Vejo que conhece Sam.
- Estudamos na mesma sala.
- Aah, então vocês três são da mesma escola?
- Sim.
  Ela se aproxima um pouco do meu ouvido.
- Como Anna é na sala de aula? - Ela sussurra e Anna me olha sem entender nada.
- Não é tão inteligente, mas eu diria que está na média. - Ela e Sam sorri atrás de mim.
- Enfim, vai ficar para o jantar? Já está quase pronto.
- Não sei. Eu preciso falar com minha mãe antes.
- Nós adoraríamos que ficasse para o jantar. - Olho para Anna com um sorriso meio sem graça no rosto e volto a olhar para a mãe dela.
- Tá legal. Eu posso ficar.
- Ótimo. Pode se sentir a vontade. Meu marido vai chegar daqui a pouco. - Ela sorri novamente e volta para a cozinha, Anna me encara.
- Então... Vai continuar jogando?
- Depois.
- Beleza. - Ele volta a jogar solo na partida em que paramos e vou para fora da casa com Anna.
- Alô?
- Mãe?
- Fala.
- Eu vou jantar aqui na casa de Anna, depois eu vou embora.
- Tá bom. Toma cuidado na hora de voltar. Está tarde.
- Tá.
  Desligo o celular e no mesmo momento Anna vira meu rosto e me beija, ficando na ponta dos dedos para me alcançar neste pequeno relevo do quintal. Ela sorri quase deixando suas emoções escapar de seus olhos, seguro ela pela cintura e ela passa os braços ao redor do meu pescoço. Eu a beijo novamente, fazendo ela se sentir mais a vontade sem toda aquela tensão nos ombros.
- Sei que temos segredos um do outro que não é tão fácil de contar, mas podemos fazer isso dar certo. Né?
- Sim.
- O quão bêbado você ainda tá?
- Um pouco.
- Mesmo? O meu efeito já passou.
- Isso é bom.
- É?
- Uhum. - Ela morde o lábio inferior, entendendo errado o que eu disse e com isso, ela me beija ainda mais animada. Nós voltamos para sala, sentando no sofá ao lado de Sam.
- Pronto pra continuar?
- Uhum.

  07:41 PM. Nós três ficamos jogando por um tempo, esse tipo de passa-tempo realmente não faz o meu tipo. Acho que não vou conseguir mesmo vencer esses dois tão fácil. Anna fica esfregando suas unhas no meu cabelo enquanto jogo com Sam.
  Depois de um tempo, o padrasto dela chega, parece cansado quando me olha. Alto, moreno e um pouco gordo, não se parece muito com Sam também.
- E aí, pai. Quer perder para mim também?
- Agora não, Sam. E você é...?
- Então... - Anna diz não parecendo tão animada ao contar isso para ele. - Esse é... meu namorado.
- Namorado, é? - Seus olhos cinzas é a única semelhança nele que vejo em Sam. Eu revido seu olhar penetrante e sua expressão séria com uma leve desaprovação.
  Ele aperta minha mão e passa no corredor atrás de nós sem dizer mais nada e sem expressar algo positivo. Eu não me importo muito com isso, mas pela expressão de Anna, ela já esperava esse tipo de reação. Um cachorro passa entre minhas pernas e sobe no colo de Anna em cima do sofá, ele me ignora e eu nem tento mexer com ele, não gosto de cachorro e não me dou muito bem com eles por causa de Lara e Toby. Eles não se sentem a vontade comigo. O cachorro fica prestando atenção em mim por causa disso, sem olhar para outro lugar. Seu instinto apurado sente esse algo perigoso que carrego comigo. Mas de qualquer forma, é só um vira-lata pequeno e peludo.




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