[prólogo]

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Já é inverno em Londres.

Aperto o sobretudo alongado contra meu corpo quando sinto o vento colidir contra mim outra vez. Ando em passos rápidos enquanto acompanho Claudia em direção à London Eye. O Sol já se punha dando origem a um emaranhado de raios laranjas e dourados passando por detrás da atração turística.

— Quando foi a última vez em que veio? — Claudia me pergunta, meu olhar sai da fresta de luz e vai a ela. Suas bochechas e nariz estão vermelhos por conta do frio, o gorro que usa é preto com alguns detalhes bordados em branco.

— Acho que a uns... Cinco anos atrás? Você estava no fim da gestação — a respondo, ela concorda após contar em sua mente por alguns segundos — E o divórcio? Como está?

— Fiquei com a cobertura, algumas ações da empresa, meu carro, as coisas que comprei com meu dinheiro e minhas telas — ela sorri fraco.

Dobramos a esquina, e lá está ela. O olho de Londres, enfeitada para o Ano Novo. O caminho até a atração está cheio, com pessoas conversando entre si e crianças pequenas correndo de um lado para o outro. O chão forrado de neve branca dá a impressão de estar pisando em nuvens macias. As árvores secas e altas estão decoradas com luzes azuis em um tom escuro.

— Não sei como você e Jacob se dão tão bem, mesmo com o divórcio e ele tendo outra mulher ao seu lado — assopro o vento frio, uma nuvem de ar esbranquiçada sai da minha boca — Se fosse comigo, eu gostaria de matar a atual dele.

— Somos... melhores amigos. Mesmo depois de ter confundido esse amor com outro — ela dá de ombros, como se fosse algo simples — Quer churros? Tem uma senhora, aqui, que vende os melhores churros que já comi!

— Já que diz que são os melhores, vou aceitar.

— Me espere em algum banco vazio, depois que comprar te encontro — faço um sinal positivo com o polegar direito.

Claudia caminha em direção à massa de pessoas acumuladas, meu olhar vai até a Catedral St. Paul, também com algumas árvores decoradas em sua entrada.

Enfio as mãos envolvidas com luvas dentro dos meus bolsos. Caminho em direção ao primeiro banco de madeira antiga que acho. Não tão longe para Claudia não me encontrar, mas não tão perto para não me perder no meio das pessoas.

Havia chego a cidade pouco mais de duas horas atrás. A primeira coisa que fiz quando cheguei foi vestir outra roupa. Claudia me apresentou a minha nova "casa" onde irei morar provisoriamente com ela, e mais uma pessoa, nossa amiga Emily James. Moro na América Latina, não sou acostumada com esse frio, se bem que... eu morava na América Latina. É meu primeiro dia morando de fato em outro país, mas claro, já havia visitado a cidade antes com minha família quando mais nova, porém, nada que chegue perto a: "Vou continuar a Dinastia Hernández assumindo uma das empresas do meu pai, mesmo que eu tenha 21 anos e seja a única mulher e a mais jovem a realizar tal ato".  

A vinda da Mídia e do meu pai naquele momento era algo insuportável, que mesmo em outro continente não se perdia da minha mente.

Pendo a cabeça para trás, respirando fundo. "É só um emprego, Eleanor, já enfrentou coisas piores". Eu mesma tentava me convencer, mas era impossível. A coisa mais empolgante que fiz foi começar meu namoro escondida de meu pai, mesmo que eu seja uma adulta, mesmo que eu more sozinha, e ainda assim... isso não deu certo.

Claudia demora voltar, e enquanto a espero noto que as fotos não representam 10% do quão lindo Londres é no inverno. Várias pessoas ali tiravam fotos, a maioria, suponho eu, turistas, vejo pela forma como se vestem e as expressões maravilhadas, assim como as minhas.

É claro, não fiz diferente, peguei meu celular, limpei a câmera embaçada e mandei uma mensagem aos meus pais junto uma foto — que se consistia em mim sorrindo com o frio aparente e o rosto avermelhado —.

"Cheguei bem!"

Tinha certeza de que minha mãe daria pulinhos de alegria ao ver meu sorriso ali. Saí tão angustiada e com tanta raiva de lá, que acabei esquecendo a situação em que ela ficaria.

Perto de mim, duas garotas, que aparentam ter pouco menos de sete anos, brincam na neve jogando bolas mal feitas uma na outra. Uma tem os cachos grandes e pretos, e a outra tem o cabelo liso e traços asiáticos. Uma mulher as acompanha, ela e outros dois homens.

Noto a tatuagem em seu pescoço, parecem ser versos ou palavras, talvez um poema, mas não consigo ler o que está escrito. Ela usa roupas escuras, não tão diferente do comum em Londres. A corrente em seu pescoço é o chamativo, reflete a luz em certo modo. Quando ela se vira para falar com alguém, noto as tatuagens em seu rosto, seu cabelo liso preto pouco abaixo dos ombros e... como seu sorriso é bonito quando ela sorri.

A fila 'tava grande — a voz de Claudia me assusta quando ela se senta ao meu lado do repente — O quê está olhando?

— Nada demais — respondo. me entrega um dos churros. Eles são pouco maiores que minha mão, com uma das pontas finas e a outra redonda dando a parecer um coração. Estão dentro de uma embalagem de papelão fino oval, e já um copinho com chocolate derretido conectado à embalagem, há doi em cada. Pego um em minhas mãos, com cuidado, o assoprando antes de merdulhar a ponta no chocolate e dar uma mordida.

— É muito bom, né? — assinto, dando outra mordida — Olha... Amanhã vou passar o dia fora correndo atrás dos documentos que a chefe pediu, provavelmente Emily também vai estar no escritório.

— Então vou passar o dia sozinha?

— A noite também... — ela dá uma risada fraca — Por quê não aproveita? Você pode sair. Arruma algum cara bonitão 'pra te fazer esquecer seu ex. Sexo não mata ninguém — dou uma risada.

— É ele quem precisa me esquecer de vez, e eu não preciso de um homem. — a dou um tapa fraco no ombro, Claudia sorri e volta a morder seu precioso churros.

Deslizo meu olhar de Claudia até a mulher no banco de trás. Por um segundo, nossos olhares se cruzam e ela dá um sorriso com um dos cantos da boca. Desvio o olhar imediatamente. Meu coração parece bombear o sangue quatro vezes mais rápido, tento não engasgar quando mastigo o churros

— Você devia ser mais aberta a pessoas, no geral. Agora que mora debaixo do mesmo teto que eu, vamos ter muito tempo 'pra sair por aí e virar a noite bebendo em um bar...

— Sim, claro. Vamos nos embebedar em um bar local, e no outro dia minha cara vai estar nas manchetes dos jornais. Uma ótima idéia, Clau — ela faz uma careta concordando.

— Então vamos nos embebedar em casa! Pronto, resolvido.

𝐋𝐎𝐒𝐓 𝐈𝐍 𝐋𝐎𝐍𝐃𝐎𝐍 | ᵇ.ᵉ Onde histórias criam vida. Descubra agora