secrets that i keep

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Certa vez li um livro de poemas escrito por Rupi Kaur. O pior era a sensação de todos os poemas virem de encontro com o que eu estava sentindo. Dias após, conheci Emily Dickinson.

Escondo-me na minha flor,
Para que, murchando em teu Vaso,
tu, insciente, me procures –
Quase uma solidão.

Nos versos podemos ver, mais uma vez, a união entre o amor e o sofrimento. Criando uma metáfora simples e quase infantil, o eu-lírico se compara a uma flor que murcha, perde as forças, no vaso da pessoa amada.

Associando as suas emoções aos elementos da natureza, encontra um modo de expressar a tristeza que está sentindo pelo afastamento e a indiferença. Incapaz de comunicar diretamente a sua dor, espera que o outro repare, mantém uma atitude passiva.

Totalmente entregue à paixão, aguarda a reciprocidade, quase como se renunciasse a si mesmo.

Irônico mesmo é eu ter tido a salva de me sentir exatamente como eu lírico presente na escritora quando conheci Billie.

Até nas discordâncias, brigas e alfinetadas, tudo o que eu fazia, inconscientemente, gritava seu nome quase como se eu implorasse por uma chance quando a única que não se permitia ali era eu.

Agora voltei a me sentir como Rupi.

por que os girassóis ele me pergunta
eu aponto para o campo amarelo
os girassóis adoram o sol eu digo
quando o sol sai eles se erguem
quando o sol vai embora
eles abaixam a cabeça de tristeza
é o que o sol faz com as flores
é o que você faz comigo
— o sol e suas flores

Ela traça uma relação entre essa flores - que se movimentam de acordo com sol - e o seu humor, que também se altera com a ausência do ser amado.

— Acho que ler Rupi Kaur só irá piorar a situação — diz Leo, se aproximando de mim com uma caneca — Me entrega o livro e pega esse chazinho que eu fiz com todo o meu amor e carinho... — diz ele, e como se estivesse falando com uma criança de oito anos, meu irmão pega o livro e na minha mão põe a caneca um pouco quente. — Isso mesmo.

Encaro o chá. Era de morango, o cheiro era bom, com fumacinha e tudo mais.

Com meu irmão me encarando, tomo um gole do chá por livre e espontânea pressão.

Tudo me lembra ela... que caralho

— Está mais calma? — assinto, cruzando as pernas em cima do sofá.

Quando Leo me buscou, acabei tendo uma crise de choro dentro do carro. Ele viu meu desespero e não me pressionou para o contar nada, nem disse nenhuma palavra. No caminho para o hotel em que ele estava, me abri com o meu irmão e contei tudo. Leo é bom em escutar, como havia sido coroinha assíduo boa parte da sua vida e seu sonho era ser padre, ele tem uma ótima prática com isso. Sempre escuta e nunca julga, apenas conversa e guia.

No meu caso ele nem se quer me guiou, apenas foi fazendo perguntas e mais perguntas, e quando me dei por percebida eu estava preenchendo todas as lacunas na minha mente que me deixavam completamente maluca.

Quando chegamos, Leonardo se prontificou a fazer um chá e me receber em um dos quartos. Mas acabei me sentando no sofá com um cachorrinho que ele havia adotado como tutor temporário até que alguém se prontifique a o adotar formalmente.

Descobri que seu nome é pipoca, não para quieto um segundo e me deixou minimamente melhor.

Pipoca me olhava com a cabecinha virada para o lado, ele era branquinho, com apenas algumas manchas amarronzadas leves no corpo e uma outra bem no seu focinho.

— Obrigada — digo, e o cachorro late — Acho que pipoca não gosta muito de mim.

— Ele está latindo em alegria, é claro que gosta de você — quando diz isso, o cachorrinho pula em cima do sofá e se deita ao meu lado, em forma de caracol — Eu nunca te recusaria ajuda, irmã. Fiquei feliz por ter se lembrado de mim.

— Eu me lembrei de quando éramos pequenos e você me acobertou quando eu acidentalmente tomei duas garrafas de vinho da adega do papai — digo, um sorriso cresce no seu rosto instantaneamente — Algo que definitivamente não foi uma boa ideia...

— Devo concordar com você.

Com mais um sorriso, Leo se senta ao meu lado, me puxa pelo ombro e me abraça de lado.

De nada adiantou nossa conversa, pois nada me tirava a cabeça dela.

Quando me dou conta, estou chorando nos braços do meu irmão mais velho. Leo, a alguns meses, era definitivamente uma das pessoas as quais eu achei que viria a cometer uma discriminação absurda quando descobrisse que gosto de mulheres, mas o que eu recebi foi o completo oposto.

— Eu acho que fui muito dura com ela — murmuro, me afastando um pouco do meu irmão.

— Por quê acha isso?

— Por que quando ela me contou... Eu virei as costas e não deixei ela se explicar, e depois falei umas coisas bem pesadas de se escutar — seco as lágrimas dos meus olhos, pipoca pula para o meu colo — Mas que se foda, ela mereceu... não mereceu?

— Por quê você acha que ela mereceu?

— Por que ela mentiu.

— Mas ela não te contou sobre o caso que ela teve com a assistente?

Leonardo tinha isso, o dom de me deixar sem palavras.

— Mas contou tarde.

— Assim como você fez quando estava com Madden mas queria ela? — me calo mais uma vez. Psicologia reversa dos infernos — É totalmente compreensível uma reação como a que você teve. Você se estressou, agiu com a emoção e esqueceu a razão, todos fazemos isso.

— Então o que eu faço?

— Isso é você quem dita, hermanita — Leo beija o topo da minha cabeça — Por enquanto, você deve dormir, é tarde e seu cérebro não vai funcionar muito bem depois disso tudo...

— Mas eu nem vou conseguir dormir — digo de volta.

— Vai sim, meu bem. Pipoca irá ser seu auxiliar nisso — quando o nome do cachorrinho é pronunciado, ele levanta a cabeça e me encara, fazendo um barulhinho fofo e logo depois outro latido.

(...)

Okay, eu comecei a gostar um pouco desse cachorro maluco.

Pipoca fica rodando em círculos e pulando na minha perna quando estou em pé a frente do balcão preparando sua comida. Uma porção de ração acompanhada de meio sache de carne para cachorros.

Assim que coloco a comida no chão, ele sai correndo e quase cai dentro da vasilha.

Dou uma risada com a situação.

— Acordou sorrindo, que bom — meu irmão aparece, com a roupa formal de trabalho e os cabelos úmidos jogados para trás — Preciso ir, mas a sua cópia das chaves está no chaveiro da sala. Não excite em me ligar caso necessário. — Ele vem até mim, se abaixa para fazer um carinho em pipoca, e sela minha testa antes de sair.

— É, capetinha... — começo minha frase, Pipoca olha para mim com a cabeça um pouco virada para o lado — Não vou te deixar aqui sozinho.

𝐋𝐎𝐒𝐓 𝐈𝐍 𝐋𝐎𝐍𝐃𝐎𝐍 | ᵇ.ᵉ Onde histórias criam vida. Descubra agora