Passado

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Nico

Estaciono o carro na frente de casa e pego meu celular no banco do carona enquanto saio. Estou caminhando pela entrada quando meu pai abre a porta com as bochechas vermelhas e a cara de quem vai matar alguém.

Quase acho que é comigo, mas ouço um grito feminino atrás que sei ser de Cecília e logo ele joga um cara coberto apenas por lençóis na entrada. Observo o coitado e vejo que ele está com o rosto quase todo inchado de machucados.

Passo por ele e abro a porta de novo, Cecília está gritando com meu pai na sala de estar, minha mãe tenta acalmar os dois. Olho para as escadas e sorrio quando Nina aparece, com um roupão de veludo vermelho e sentada nas escadas.

-Relátorio.- peço.

-Papai o pegou querendo fugir pela janela.- explica calma.- Cecília os trás para provocar ele.

-Ele cai como um patinho.- sento ao lado dela.

-Mamãe já descobriu o jogo dela.- Nina afasta uma mecha loira.- Acho que até já entendeu, mas eu não entendo.

-Por que?- pergunto.

-Porque ainda não entendi o motivo dela fazer isso com o papai.- mexe os ombros.

-Ele a trata como se tivesse cinco anos.- mexo os ombros.- Você aceita, ela não.

-É burrice ela trazer caras para cá, para dentro da nossa casa.- Nina respira fundo.- Um deles pode ser maluco.

-Acho que ela vai adorar ainda mais se for.- observo Cecília.

Ela está com um roupão branco, seus cabelos não estão penteados como os de Nina, estão soltos e bagunçados, parece que os fios loiros não vão se separar tão cedo. Nosso pai grita com ela, ela grita com o nosso pai. Sempre assim, sempre foi.

-Você não pode continuar trazendo homens para cá!- ele grita.- Você é uma menina!

-Eu tenho vinte e seis!- ela se defende.

-Uma criança, praticamente!- ele rebate.

-Mamãe se casou quando tinha vinte e cinco.- ela aponta para a nossa mãe, que fica calada.

-É diferente, Cecília.- ele fala sério.- Você não pode ficar trazendo homens aqui para dentro de casa. Pense no perigo.

-Seria bem mais fácil se você me deixasse ir embora de casa.- ela aponta para a porta.

-Eu já disse que estamos melhor juntos.- ele mexe as mãos.- Somos mais fortes juntos...

-Nico foi embora.- ela fala e ele não fala mais nada.- Por que ele pode ir e eu não?

-Querida...

-É por que ele é homem?- Cecília pergunta e olha para nossa mãe.- Concorda com isso?

-Não sabia que estava tão desesperada para deixar essa casa.- nossa mãe fala com uma calma mortal e até Nina fica tensa ao meu lado.- Se quer tanto assim, eu mesma ajudarei a arrumar algo para você.

-O que?- meu pai arregala os olhos.

-Se ela quer ir embora de casa, ela vai.- minha mãe repete e ele parece que vai explodir.

-Tem alguma pegadinha.- Nina sussurra.

-Conseguiu.- minha mãe olha para ela.- Vai poder sair de casa, mas...

-Aí está.- Nina se gaba.

-Mas vai ter que vir jantar aqui todas as noites.- ela fala.- Todas as noites deve estar aqui, sem falta.

A Obrigação - 5° GeraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora