Preparações

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Virgínia

As festas duravam dias aqui, todas as decorações e comidas deviam ser preparadas cuidadosamente. Sempre tinham que ter cozinheiras na cozinha e bebida no bar, a diversão nunca acabava.

Hoje era o dia que meu pai iria finalmente convidar Nico para vir dar uma passada aqui, ao que parecia, meu pai sabia de algo que ninguém aqui sabia e que iria trazer Nico para cá sem nenhuma suspeita.

Paro de pensar nisso quando e a quinta vez que quase cortei meu dedo fora com a faca de cortar a pimenta. Respiro fundo e olho para gente, para o grande quintal da minha casa, decorado com tantas luzes e cores que fica difícil o olho não doer.

-Mi amor, você está distraída.- uma das empregadas mais antigas chega ao meu lado.

Foi ela quem me achou, quem me deu banho e fez um chá para previnir que qualquer gravidez nunca acontecesse. Foi ela quem cuidou de mim quando eu não parava de chorar e quando eu não queria comer mais nada.

-É tudo isso da festa.- tento sorrir.

-Seu pai e sua mãe estão querendo mesmo uma aliança forte com esse menino.- ela ri.- Nem sei o que tem de especial.

-Talvez o que ele tenha de especial seja exatameme o que meu pai quer.- murmuro.- O cara vai ter que ser inteligente para não dar a ele de mão beijada.

-O seu pai está o julgando como se fosse um idiota.- ela sussurra.

-Ele o conhece.- relembro.- Talvez ele seja.

-Você nunca o viu?- pergunta.

-Não, ele só leva a Luna para Vegas.- termino de picar a pimenta.

-Sabe do que eu ouvi falar?- pergunta e olho para ela.- Que vai casar com Mauro.

-Ah, isso.- suspiro.

-Você ficou louca, menina?- pergunta.

-Não foi escolha minha.- digo simples.

-E como está tão calma?- ela observa meu rosto.

-Eu não estou calma.- ergo os olhos e vejo meu pai andando de um lado para o outro.- Eu estou surtando. Mas por dentro.

-Ei.- ela segura meu queixo e me seguro para não fazer uma careta por causa do tapa de ontem.- O que você está pensando em fazer, Gi?

-Nada demais.- pego outra pimenta.

-Filhas.- minha mãe chega.- Vamos! Tomar banho e cama!

Largo a faca e dou um beijo na bochecha dela, limpo as mãos no pano e logo passo por minha mãe indo direto para as escadas, o vento frio da noite entra na casa e passa pelos corredores com rapidez.

Entro no meu quarto e começo a tirar o vestido, então ele forma um bolo no chão e entro no banheiro para encher a água da banheira. Ainda me sinto sortuda por ter tudo que eu tinha antes de Mauro acontecer, depois que o jogo virou...achei que ia perder tudo.

Quando meu pai chegou dizendo que eu tinha o seduzido e tramado para ele, achei que iam me enforcar como se eu fosse uma bruxa, como minhas histórias. Porém, eles só ficaram com raiva de mim, bem, não só com raiva, a raiva de um mexicano é de outro mundo.

Toda vez que passo por algum amigo de Mauro, eles fazem graça ou me batem, não sou respeitada dentro da minha própria casa. Mas pelo menos tenho uma banheira, uma cama e uma porta, isso deve ser o bastante até o fim do meu plano.

Afundo na banheira depois que ela enche e fico lá por segundos antes de voltar e puxar um fôlego. Abro meus olhos e passo a mão pela testa para afastar meus cabelos e paralisia quando vejo Mauro parado na porta do banheiro.

-Seu pai disse que aceitou o casamento e só precisou dar um tapa em você.- ele fala.

-O tapa foi quando eu ri de você.- minto.

-Bom, ele foi generoso.- sorri.- Quando eu for seu marido, não vai ser tão leve. No fim das contas, é do seu marido que está rindo.

Fico calada, tento ser forte na frente dele, tento fingir que aquilo nunca aconteceu e que não tenho pesadelos por causa dele. Mas aqui está ele, e minhas pernas estão tremendo de medo só de receber aquele olhar.

-Aquela sua amiguinha da cozinha vive em seu encalço e eu não consigo pegar você sozinha de novo.- ele fala e travo o maxilar.- Esqueci qual é a sua sensação.

-Sangue?- pergunto e ele fica vermelho.

-Logo vai ser minha esposa, espero que me respeite.- ele mexe na calça e tento não fazer uma cara de nojo ao vê-lo excitado.

-Vou respeitar você o tanto quanto me respeitou naquela noite.- aperto as bordas da banheira.

-Ah, coitada.- ele se afasta.- Você vai viver levando uma surra, Virgínia.- ele sai do quarto.

Me levanto rapidamente e me cubro, corro até a porta do quarto e passo a tranca, então encosto meu corpo na porta e fecho os olhos. Acho que hoje não vou dormir, acho que vai ser uma daquelas noites em que vou estar acordada lendo meu livro.

☼︎

Nico

-Eu não entendo.- falo com raiva.- Ele tem outras duas filhas.

-Mas você é um filho.- Eduardo fala enquanto jogamos cartas.

-Que ridículo.- puxo com raiva.- Eu falei para eles que não queria isso, que só queria a diversão.

-Achou que já conseguir sendo o filho mais velho e homem?- Eduardo ri.- Só se você fosse um bastardo.

-Você está sendo dramático.- Marco fala com raiva.- Já matou. Já roubou. Já fez de tudo. Você é um mafioso, em seu sangue, pode fazer isso.

-Eu não quero...

-Você pode matar quem quiser.- ele me encara.- Só por que você está no comando. Eles obedecem você, não precisa mover um dedo e todos fazem o que querem. Qual é a parte ruim nisso?

-A parte que eu tenho que me importar.- bufo.- Por que estamos jogando cartas enquanto podíamos estar enchendo a cara?

-Você tem que estar bem até terça...

-Faltam dois dias.- largo as cartas.

-Você vai acabar se encrencando.- Eduardo cruza os braços.

-Está dentro ou fora?- pergunto pegando meu celular e vendo que tem mensagem.

-Fora.- suspira.- Preciso fazer trabalho que bastardos fazem.

-E você não precisa enterrar os corpos por que tem gente para isso.- Marco aponta para o irmão.

-Que tal irmos para o México?- sorrio para Marco.

Ele sempre vai concordar comigo, nós dois somos as pessoas mais abertas do mundo, Eduardo é o que fica segurando nossas rédeas, e hoje ele tem coisa para fazer. Mas mesmo assim ele para de vestir o casaco para enumerar os problemas.

-Eu topo.- Marco ri se levantando.

-México? Sério?- ele bufa.

-Sim, o amigo do meu pai está com um jatinho esperando.- guardo o celular no bolso.

-Nico, você tem que começar a ser responsável.- ele informa.

-Eu vou começar.- eu e Marco entramos no elevador.- Na terça.

-Eu não vou buscar vocês.- ele nos encara.

-Não precisa.- Marco sorri.

-O que falo para seu pai?- ele pergunta.

-Que eu morri por hoje.- ele fala quando o elevador fecha.

Rio com a risada de Marco e me permito aproveitar a única festa que acho que vou ir antes de tudo virar assuntos e negócios. Passo a mão pelo rosto e me pergunto se Eduardo está certo, se eu estou sendo irresponsável.

Mas acho que tenho algo como Cecília, acho que, assim como ela, tenho que estar irritando meus pais, fazendo com que eles desistam de mim para herdar toda essa bomba relógio que eles tem. Talvez Nina seja uma boa comandante.

Eu sei que eu não seria.

A Obrigação - 5° GeraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora